F. V. Peixoto da Fonseca (1922-2010) - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
F. V. Peixoto da Fonseca (1922-2010)
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Fernando Venâncio Peixoto da Fonseca (Lisboa, 1922 – Lisboa, 2010) Dicionarista, foi colaborador da Enciclopédia Portuguesa e Brasileira e da atualização do Dicionário de Morais, membro do Comité International Permanent des Linguistes e da Secção de História e Estudos Luso-Árabes da Sociedade de Geografia de Lisboa, sócio de Honra da Sociedade da Língua Portuguesa e da Academia Brasileira de Filologia. Antigo decano dos professores do Colégio Militar, era licenciado, com tese, em Filologia Românica, distinguido com a Ordre des Palmes Académiques. Autor de várias obras de referência sobre a língua portuguesa, entre as quais O Português entre as Línguas do Mundo, Noções de História da Língua Portuguesa, Glossário etimológico sobre o português arcaico, Cantigas de Escárnio e Maldizer dos Trovadores Galego-Portugueses, O Português Fundamental e O Ensino das Línguas pelos Métodos Audiovisuais e o Problema do Português Fundamental. Outros trabalhos: aqui.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Por que razão não há reflexividade nas línguas naturais?

Resposta:

As línguas naturais são específicas de toda a espécie humana e assentam em propriedades universais próprias de toda a linguagem humana, ao passo que as artificiais são construções particulares fabricadas pelo homem, utilizando certas particularidades das línguas (são códigos como o morse, ou linguagem como as matemáticas). A reflexividade é a propriedade da igualdade do conjunto que se considera como igual a si próprio; ela escreve-se A = A como a igualdade de dois conjuntos se escreve A = B. Não se deve confundir reflexividade com reflexivização, que é a transformação que faz substituir um pronome reflexo ao sintagma nominal complemento quando este último é idêntico ao sintagma nominal sujeito na frase de base.

Pergunta:

O plural de uma palavra considera-se da mesma família?

Obrigada.

Resposta:

O plural de uma palavra é apenas a sua variação em número. Em português, como é sabido, há o singular e o plural, mas há (ou houve) línguas, como o sânscrito ou o grego clássico, que também possuem o dual, forma específica para dois ou duas. Em português, há palavras como ambos, que na realidade é um dual, pois não se emprega para um nem para mais de dois.

Pergunta:

A expressão «borrar a opa» utiliza-se muito, pelo menos aqui no Algarve, e significa que alguém fez asneira.

A minha dúvida prende-se com a sua origem.

Obrigado.

Resposta:

Recorremos a F.V.P. da Fonseca, que diz o seguinte:

«Não conhecia a expressão, mas calculo que se empregue no mesmo sentido de "borrar a pintura", isto é, estragar, no todo ou parcialmente, algo que está mais ou menos bem. Como se sabe, a opa é uma espécie de capa sem mangas, mas com aberturas para os braços. Trata-se, portanto, de um emprego de uma expressão em sentido figurado.»

Note-se que não conseguimos encontrar uma fonte que explicasse claramente as circunstâncias históricas da criação da expressão em apreço. Contudo, o facto de uma opa ser uma das peças de vestuário usadas pelos membros de confrarias e irmandades religiosas (cf. dicionário da Academia das Ciências de Lisboa) torna plausível a hipótese de haver aqui uma origem metafórica: assim como sujar a opa afecta a solenidade da situação em essa peça é usada, assim também os erros, que comprometem o êxito das nossas acções.

Pergunta:

Gostaria de saber se no dicionário português existe a palavra "aziento", no sentido de «azia».

«... gostou daquela comida azienta.»

«... assisti a um programa aziento.»

A não existir, qual a palavra que substitui o contexto e o sentido?

Resposta:

Julgo que não há, a não ser que se empregue ácido, já que azedo é mais usado no sentido de estragado por demasiada acidez.

Pergunta:

Li, há alguns meses, um livro escrito por um português, cuja acção decorre, em grande parte, durante a Primeira Guerra Mundial. Nessa obra, é frequente os soldados portugueses destacados na Flandres empregarem caraças com o sentido com que hoje diriam, talvez, «Bolas!», «Gaita!» ou qualquer outro termo menos apropriado para constar aqui. Não creio que tal fosse possível naquela época. Suponho-o um termo recente. Tenho tentado confirmar esta minha suspeita, mas, até à data, não o tenho conseguido. Daí o ter decidido usar este contacto para vos pedir ajuda no sentido de satisfazer a minha curiosidade.

Grata pela atenção dispensada à minha questão, desejo longa vida a este sítio da Net.

Resposta:

Julgo que tem razão a prezada colega, também acho que o termo é muito moderno e, por outro lado, parece-me tratar-se de um eufemismo.