Eunice Marta - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Eunice Marta
Eunice Marta
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Licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre (Mestrado Interdisciplinar em Estudos Portugueses) pela Universidade Aberta. Professora de Português e de Francês. Coautora do Programa de Literaturas de Língua Portuguesa, para o 12.º ano de escolaridade em Portugal. Ex-consultora do Ciberdúvidas e, atualmente, docente do Instituto Piaget de Benguela, em Angola.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Há dias um treinador conhecido, em entrevista, disse: «... ambos os dois estavam fora de jogo.»

Esta construção é correcta?

Resposta:

Citando Cunha e Cintra, «quando nada acrescenta à força de expressão, quando resulta apenas da ignorância do sentido exato dos termos empregados, ou de negligência, é uma falta grosseira» (Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Sá da Costa, 2002, p. 618).

Esse caso é, como tantos que temos vindo a observar, um caso de redundância desagradável, um vício de linguagem que se tem dificuldade em aceitar.

Pergunta:

Gostaria que me esclarecessem se está igualmente correto escrever «em minha opinião» ou «na minha opinião» em posição inicial na frase.

Resposta:

As duas formas estão corretas, porque não é obrigatório o uso do determinante/artigo definido a preceder os determinantes [e pronomes] possessivos: «Em minha opinião» e «na minha opinião».

Repare-se que há vários casos, tal como o indicado pela consulente, em que é comum dizer-se das duas maneiras: «Em minha casa» e «na minha casa»; «Em tua casa» e «na tua casa».

Pergunta:

Qual o correto: «Quero informá-la que a partir de...», ou «Quero informá-la de que a partir de...»?

Resposta:

«Quero informá-la de que, a partir de...» é a forma correta.

O verbo informar, como transitivo direto e indireto, ou seja, com o sentido de comunicar algo a alguém, implica o uso das preposições de ou sobre — «GN (grupo nominal) [Suj.] V (verbo) GN [complemento direto] GP (de, sobre) [compl. preposicional]» (Dicionário Gramatical dos Verbos Portugueses, da Texto Editores). Exemplos:

«Um telegrama informara a família da morte do soldado.»

«A escola informará regularmente o encarregado de educação sobre o/do aproveitamento escolar do seu educando.»

No entanto, a preposição de é a exigida, quando o verbo declarativo informar (transitivo direto e indireto) seleciona uma oração completiva finita [introduzida por que] — «GN [Suj.] V GN [compl. dir.] GP [de + F(finita)]» (idem), razão pela qual a frase apresentada pela consulente obriga ao uso da preposição de

«Quero informá-la de que, a partir desta data, pode usufruir deste serviço.»

 

«A secretaria informa o requerente de que o pedido foi indeferido.»

Pergunta:

Gostaria de saber se se diz «para irem lá» ou «para lá irem».

Resposta:

Estão corretas as duas formas: «para irem lá» e «para lá irem».

, como advérbio locativo ou de lugar, é «selecionado pelo verbo, ocupando uma posição de complemento» (Mira Mateus, Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa, Caminho, 2003, p. 425) e, por se tratar de um argumento do verbo ir, «em termos sintáticos, é um constituinte imediato do SV [sintagma verbal]» (idem).

Por isso, «pode colocar-se antes ou depois do verbo [tal como todos os advérbios de lugar e de tempo]» (Cunha e Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Sá da Costa, 2002, p. 542).

Pergunta:

Na frase «Meninos, não sujem as mesas», qual a diferença entre usar o verbo na terceira pessoa do plural e na segunda? Porque não uso «Meninos, não sujeis as mesas»?

Resposta:

«Meninos, não sujem as mesas» e «Meninos, não sujeis as mesas» são duas frases imperativas com o mesmo valor: o de ordem, de conselho ou de pedido.

De facto, o uso tem vindo a preferir (e a consagrar) a primeira forma — «não sujem» —, associando a segunda («não sujeis») a um nível de língua erudito praticamente em desuso, pois as formas da segunda pessoa do plural têm vindo a decair no discurso do quotidiano. Algumas ocorrências de tais formas figuram nos discursos religiosos, marcados pelo rigor e pela formalidade linguística.

Na realidade, o uso de formas que impliquem o pronome vós parece criar distanciamento entre o emissor e a(s) pessoa(s) a quem se dirige(m). Deve ser essa a razão pela qual «o pronome de segunda pessoa do plural — aplicável quer a uma entidade plural quer a uma entidade singular para com a qual se pretende patentear um sentimento de respeito — é, em grande parte de Portugal, substituído pelas formas de tratamento você, vocês. Embora estas formas de tratamento tenham como destinatário o interlocutor do falante, e por isso sejam semanticamente equivalentes a uma segunda pessoa, gramaticalmente são de terceira pessoa do singular (você) e do plural (vocês). Nestes casos, o conjuntivo presente na terceira pessoa do singular e do plural surge como supletivo do imperativo» (Mira Mateus et al., Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa, Caminho, 2003, pp. 451-452).

Portanto, se a consulente não usa a construção «Meninos, não sujeis as mesas», é porque não quer criar (nem impor) o distanciamento entre si e os «meninos».