D´Silvas Filho - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
D´Silvas Filho
D´Silvas Filho
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D´Silvas Filho, pseudónimo literário de um docente aposentado do ensino superior, com prolongada actividade pedagógica, cargos em órgãos de gestão e categoria final de professor coordenador deste mesmo ensino. Autor, entre outros livros, do Prontuário Universal — Erros Corrigidos de Português. Consultor do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Tenho ouvido/lido nos meios de comunicação, por exemplo, "0,6 pontos percentuais". O correto não seria 0,6 ponto percentual?

Obrigado.

Resposta:

O singular de `tantos por cento´ refere-se à unidade: um ponto `percentual´ (em Portugal, `percentual´ é um neologismo, mas já frequente também). Para outros valores, penso que se deve usar a designação no plural: 0,6 pontos `percentuais´, como se diz 0,6 amperes (em rigor: 0,6 A). Por outro lado, digo: seis décimas de ponto `percentual´.

Ao seu dispor,

Pergunta:

Gostava de poder usar uma alternativa mais "laica" no uso das datas, sem recurso ao "a.C. e ao d.C".

Em inglês usa-se "CE" (Common Era) para substituir o "d.C.".

Há, em português, expressões equivalentes? Se não há, podem sugerir possíveis expressões?

Obrigado.

Resposta:

A.C. - d.C.

As abreviaturas recomendadas, pela Academia das Ciências de Lisboa e pelo dicionário "Universal" da Texto Editora, para o fim que indica, são: a.C. (antes de Cristo), d.C. (depois de Cristo). Com pontos e a, d em minúsculas, C em maiúsculas. José Pedro Machado e a Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira recomendam A.C. (tudo maiúsculas. Repare que a abreviatura indicada por si ( CE ), adaptada à língua portuguesa em, por exemplo E.C., pretendendo ignorá-la, sugeriria sempre a era cristã, não só na referência ao início, como na própria letra C (que poderia ser interpretada como de Cristo).

Recomendo que, por agora, continue a usar a notação prescrita pela Academia das Ciências de Lisboa.

Jesus Cristo

Na realidade, parece que Jesus nasceu cerca de seis a quatro anos antes do início da actual contagem, mas a era em que se baseia o nosso calendário designa-se por era cristã; e não o podemos ignorar.

Cristo também pode ser encarado só laicamente, se é essa a sua preocupação: Jesus Cristo é uma figura comprovadamente histórica (existiu de facto, segundo registos isentos de religiosidade, como, por exemplo, o relatório de Plínio ao imperador Trajano - fonte: Enciclopédia Larousse).

E é preciso reconhecer que, independentemente de algumas das Suas ideias serem efectivamente extraordinárias (tanto, que ainda hoje nos deixam o sonho duma utopia espiritualmente superior às leis mosaicas, que afinal continuam em parte a reger-nos), o facto de ter existido o bondoso Jehoxuá influenciou decisivamente esta nossa civilização. Reconhecimento que se espera, naturalmente, de quem nela está inserido, seja ou não cristão. Claro que uma pessoa tolerante aceita, igualmente como legítimos, calendários centralizados em figura...

Pergunta:

Existe versão electrônica do prontuário D' Silvas? Já tenho em livro mas só dou certo com matéria no computador. Como trata variantes, me disseram que é a melhor obra para brasileira em Lisboa se adaptar à norma de cá.

Resposta:

Por enquanto, não existe versão electrónica do meu prontuário.

E, para evitar de iludir quem nos lê, devo esclarecer que a parte das variantes brasileiras são só 10 páginas, num livro de 320. O melhor trabalho que conheço para o fim que pretende é o "Dicionário Contrastivo Luso-Brasileiro", de Mauro Villar, publicado pela Editora Guanabara.

Quanto à grafia, não tenha muitos receios, irmã brasileira. As diferenças não são assim tantas, pois, em leitura corrida, nem se notam as diferenças na mensagem (ou porque as consoantes que os brasileiros tiram não fazem falta aos portugueses por serem mudas, ou porque o que acrescentam em acentos é supérfluo para Portugal). Com um bom corrector ortográfico em português de Portugal corrige tudo.

Quanto à semântica, é mais difícil. Os grupos humanos tendem a construir símbolos de comunicação diferenciados de outros grupos, vizinhos até às vezes. Isso Justifica que exista no planeta um número impressionante de muitos milhares de línguas (crê-se que umas 6 000 desaparecerão em breve, com a globalização...). Não admira que no Brasil se usem significantes diferentes dos usados em Portugal para conceitos idênticos, embora a língua seja estruturalmente a mesma. O que se dá é a circunstância de muitos regionalismos brasileiros serem, afinal, bom português, vernáculo, dos nossos comuns antepassados, e, por isso, perfeitamente entendidos.

Seja rigorosa na sua norma e não tenha complexos.

Pergunta:

Os nomes próprios seguem regras de acentuação normais?

Resposta:

Os nomes próprios da língua portuguesa, oficializados no léxico, seguem as regras ortográficas estabelecidas para as palavras portuguesas, com as variantes em vigor. Por exemplo, deve-se acentuar o nome António porque é uma palavra proparoxítona, com a variante Antônio para o Brasil (no acordo de 1990 as grafias António ou Antônio serão válidas em toda a lusofonia).

É preciso, porém, ter cuidado com os nomes estrangeiros. As normas exigem que sejam escritos com os acentos peculiares nos países de origem. Por exemplo, deve escrever `Müller´. As comas são minhas, processo pelo qual eu sublinho que o nome não é português.

NOTA - A propósito deste assunto dos nomes estrangeiros, não deve esquecer que é necessário também respeitar a grafia estrangeira nos vocábulos derivados eruditamente de nomes próprios estrangeiros. Por exemplo, deve escrever `mülleriano´. E aqui as comas (também minhas) são a forma como, embora obedecendo à norma, eu exprimo que considero esta grafia estranha à índole da nossa língua. Tanto mais que a norma cai na incoerência de me obrigar ao trema, que, por outro lado, me foi proibido como português. Isto é, custa-me a aceitar que não possa escrever simplesmente muleriano.

Ao seu dispor,

Pergunta:

Sobre alguém que já foi vice-diretor, como escrever corretamente (refiro-me à colocação de hífens) a palavra "ex vice diretor"?

Sou professor da Universidade Federal Fluminense / UFF (Niterói - RJ)

Resposta:

Quer a norma portuguesa quer a brasileira indicam que o prefixo ex- (com o sentido de estado anterior ou cessamento) e o prefixo vice- obrigam a hífen nas palavras compostas, para os separar do segundo elemento. Portanto, eu escrevo: ex-vice-director, considerando como segundo elemento director para vice- e vice-director para ex-.

Esta é a lógica da obediência às normas. Note que Rebelo Gonçalves regista: ex-director-geral