Pergunta:
A dúvida que se segue refere-se ao Acordo Ortográfico. Concordo em certas partes com o mesmo e discordo noutras. Contudo, há um certo aspecto que me tem vindo a incomodar.
Compreendo, e até concordo, que se façam mudanças que aproximam a escrita da oralidade, como em «acto», que passa a «ato», ou «actual», que passa a «atual». Compreendo também, embora discorde, que se afaste a escrita da oralidade em casos muito consagrados pelo uso, nomeadamente a desaparição do trema. Contudo, não consigo compreender mudanças que afastam a oralidade da escrita quando não são consagradas pelo uso. Parecem-me mudanças negativas.
Por exemplo, a palavra heroico (sem acento ortográfico no «o») não teria a pronúncia esperada de /eˈrojku/ em vez de /eˈrɔj.ku/? Idem para jibóia, bóia, et cætera. Não seria expectável, visto que as duplas grafias pululam no novo Acordo (e muito bem, do meu ponto de vista), que se mantivesse a saudável e indolor dupla grafia também nestes casos? Ou haverá, porventura, alguma regra que permita distinguir quando se pronuncia a vogal na sua versão aberta e quando se pronuncia na sua versão fechada?
(O que me traz, como aparte, uma nova dúvida: qual é a pronúncia expectável das vogais ‹o, e› quando tónicas, não acentuadas e regulares? Será /o,e/ ou /ɔ, ɛ/? Ou será a diferença puramente aleatória?)
Outro ponto em que o Acordo Ortográfico falha, aparentemente, em melhorar a aproximação entre a oralidade e a ortografia, dá-se na questão da tão comentada supressão das consoantes mudas. Ora, aplaudo-a quando se dá em palavras como acto e actual, em que se trata, de facto, de uma redundância totalmente desnecessária. Mas e quanto a casos como acção, ...
Resposta:
Separo as suas objecções:
1 — Tónica em ói nas palavras graves.
As normas esclarecem que a supressão do acento derivou de não haver uniformidade na pronúncia de algumas palavras (ex.: apoio ¦ô¦ em Portugal, apóio no Brasil). À semelhança do que se fez com cor ¦ô¦ / ¦ó¦, deixou de se distinguir o timbre da vogal com o acento. Terá de ser o hábito da comunidade linguística a determinar qual a prosódia escolhida.
2 — Supressão das consoantes mudas e a abertura da vogal anterior.
Muitas vezes a consoante muda não serve para nada, veja-se o caso de didactismo. Outras vezes, pode mesmo induzir em erro, como no caso do seu exemplo accionar (segundo o Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa aceita-se que a palavra já tenha evoluído para ¦âcionar¦, mesmo mantendo até hoje a consoante muda…). Outro argumento que já tenho citado é o de que não são precisas consoantes mudas para a abrir a vogal em pegada ou em avozinha.
3 — Trema.
O assunto do trema já está há muito fora de discussão em Portugal. O Brasil também no século passado o suprimiu em muitas palavras. Estava só autorizado nas palavras derivadas de nomes próprios estrangeiros, siglas, unidades de medida. Assim continuará em Portugal e no Brasil. Especificamente para o Brasil, deixará de ser usado nos grupos qu ou gu seguidos de e ou de i quando o u se pronuncia (como já acontece em Portugal).
4 — ...