Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Tenho dúvidas se os nomes idéia e preparativos são nomes comuns abstractos ou se algum deles pode ser considerado concreto.

Resposta:

Já temos muitas vezes assinalado a frequente dificuldade em distinguir substantivos concretos e substantivos abstractos, sobretudo pelo facto de haver diferentes graus de concretude e de abstracção. As palavras preparativo e ideia são, em princípio, substantivos abstractos, porque não nomeiam seres ou objectos tangíveis.

Pegando em duas gramáticas de referência, verificamos que na conceptualização de um substantivo concreto está, sobretudo, subjacente a ideia de esse nome referir uma entidade perfeitamente individualizada no mundo físico, seja ela animada ou não-animada. Assim:

— Celso Cunha e Lindley Cintra, na Nova Gramática do Português Contemporâneo (pág. 177), definem os substantivos concretos como os que «[...] designam os seres propriamente ditos, isto é, os nomes de pessoas, de lugares, de instituições, de um género, de uma espécie ou de um dos seus representantes», dando como exemplos: homem, Pedro, Maria, cidade, Lisboa, Brasil, Senado, Fórum, clero, árvore, cedro, Acaica, cão, cavalo, Rocinante. Os substantivos abstractos são os que «[...] designam noções, acções, estados e qualidades, considerados como seres» (idem); por exemplo (ibidem): justiça, verdade, glória, colheita, viagem, opinião, velhice, doença, limpeza, largura, optimismo, caridade, bondade, doçura, ira.

— Ev...

Pergunta:

Tenho dúvidas em relação à grafia correcta das enzimas, visto a literatura consultada também não reunir consenso. Assim, "lacticodesidrogenase" surge no Dicionário Médico da Climepsi Editores, mas noutros locais surge a designação "lactatodesidrogenase" (no sítio Médicos de Portugal: "lactato-desidrogenase").1 O mesmo acontece com outras enzimas usadas ora com hífen, ora sem ele. Exs.: "citrato-sintase"/"citrato sintase"; "succinato-desidrogenase"/"succinato desidrogenase"; "ATP-sintetase"/"ATP sintetase", etc.

Grata pela ajuda.

1 N. E.: Consultámos o referido sítio, para apenas encontrar "lactatodesidrogenase".

Resposta:

Consultámos F. V. P. da Fonseca, que observa o seguinte:

«Dado que os termos apontados indicam um todo, não se devem escrever separados, mas num só vocábulo com hífen. E é sucinato, só com um c

Resta-nos acrescentar que no glossário do referido Médicos de Portugal se indica que lactatodesidrogenase tem como sinónimos lacticodesidrogenase e desidrogenase láctica.

Pergunta:

Quando se faz uma enumeração de substantivos sem a terminar com um e, deve-se colocar também uma vírgula antes do verbo?

Por exemplo: «A luminosidade, a frescura tépida, as cores súbitas, a suavidade(,?) pareciam indicar a chegada definitiva da Primavera.»

Obrigada!

Resposta:

A vírgula marca uma pausa de pequena duração e emprega-se não só para separar elementos de uma oração, mas também orações num mesmo período. No interior de uma oração, a vírgula permite separar elementos que desempenham a mesma função sintáctica (no exemplo indicado pela consulente, esses elementos constituem um sujeito composto), quando não ocorrem as conjunções e, ou ou nem. No entanto, numa enumeração que constitua um sujeito composto, não é de recomendar o uso de vírgula entre o último membro dessa enumeração e o predicado, seguindo-se assim o preceito de nunca separar o sujeito do predicado pelo referido sinal de pausa. Diz Evanildo Bechara (Moderna Gramática Portuguesa, Rio de Janeiro, Editora Lucerna, pág. 609):

«[Emprega-se a vírgula] para separar termos coordenados, ainda quando ligados por conjunção (no caso de haver pausa):

[...]

— Ah! brejeiro!Contanto que te não te deixes ficar aí inútil, obscuro, e triste" [Memórias Póstumas de Brás Cubas, 93]

Observação: Na série de sujeitos seguidos imediatamente de verbo, o último sujeito da série não é separado do verbo por vírgula:

Carlos Gomes, Vítor Meireles, Pedro Américo, José de Alencar tinham-nas começado [Carlos de Laet, Obras Completas].»

Deverá, pois, escrever-se:

«A luminosidade, a frescura tépida, as cores súbitas, a suavidade pareciam indicar a chegada definitiva da Primavera.»

 

Contudo, é de assinalar que Celso Cunha e Lindley Cintra parecem indicar o contrário do que se acaba de recomendar ( Nova Gramática do Português Contemporâneo, pág. 640):

 

«1. No ...

Pergunta:

Na empresa onde trabalho, estamos a desenvolver as placas indentificativas das instalações e surgiu a dúvida sobre a aplicação de de ou do.

Faralhão é uma localidade, devemos dizer «Reservatório do Faralhão», ou devemos aplicar o de?

Para o reservatório que existe no Bairro dos Pinheirinhos, podemos aplicar «Reservatório Elevado dos Pinheirinhos»?

E «Reservatório do Creiro», é correcto?

Qual a regra que devemos aplicar?

Obrigada.

Resposta:

Consultámos F. V. P. da Fonseca, que diz o seguinte:

«Quando a localidade se usa com o artigo, como o Porto, aplicar-se-á do, da, etc. Se não levar artigo, como é o caso de Lisboa, por exemplo, apenas se emprega a preposição (de ou outras).»

O uso de artigo com nomes de lugar (topónimos) depende muitas vezes de tais nomes derivarem ou não de substantivos comuns, que são nomes apelativos: exemplo disto é «o Porto»/«o porto», mas diz-se apenas «Lisboa», sem artigo, uma vez que não existe um substantivo comum com esta forma. No entanto, pode também suceder que o topónimo se use com artigo, apesar de não se conhecer o substantivo comum correspondente: «o Luso», «o Alfeite».

Nos casos vertentes, todos localizados na região de Setúbal (Portugal), parece que o uso do artigo ou é de esperar, porque derivam de nomes apelativos, ou é tradicional. Diga-se então: «o Faralhão», «o Bairro dos Pinheirinhos» (ou simplesmente «os Pinheirinhos») e «Creiro» (nome de uma praia).

Pergunta:

Uma colega, a propósito de "elo de ligação", "certeza absoluta", "8, 9 e 10 inclusive", "exceder em muito", "quantia exacta", "expressamente proibido", disse-me que eram expressões que se deviam evitar por se tratar de tautologias.

Gostaria de saber se será exactamente assim.

Obrigada e parabéns pelo trabalho excelente que têm vindo a realizar.

Resposta:

Nem todos são casos de tautologiaredundância ou pleonasmo, termos que para esta pergunta vêm dar ao mesmo. É verdade que um elo liga e, por isso, basta-lhe ser elo, dispensando a especificação «de ligação». E inclusive é útil para clarificar o emprego de até (p. ex., «encontra-se a pagamento até 10 de Fevereiro inclusive»), mas não o é numa série como «8, 9 e 10 de Fevereiro» na frase «encontra-se a pagamento nos dias 8, 9 e 10 de Fevereiro». É já tradicional a locução «expressamente proibido»; contudo, quem declara que é proibido é porque o expressa.

Mas «exceder em muito» pode fazer sentido, porque «em muito» pode querer dizer «em muito grande medida». É aceitável usar «quantia exacta», tal como é corrente dizer «quantia precisa» (cf. Dicionário Houaiss) e «quantia aproximada» (quando se fala em estimativas).

 

N.E 1 –   Tautologia é o termo usado para definir um dos vícios, e erros, mais comuns de linguagem. Consiste na repetição de uma ideia, de maneira viciada, com palavras diferentes, mas com o mesmo sentido. O exemplo clássico é o famoso ' subir para cima ' ou o ' descer para baixo ' . Mas há outros, como se  pode ver na lista a seguir:

 

  •  elo de ligação
  • acabam...