Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Subitamente é um advérbio que se integra na subclasse de tempo, ou modo?

Resposta:

Morfologicamente, é construído como um advérbio de modo, mas, na realidade, tem valor temporal, pelo que é um advérbio de tempo.

Pergunta:

É possível alguém me dar um ou mais exemplos de palavras portuguesas em que o seu género se tenha alterado com a evolução da língua?

Muito obrigada.

Resposta:

Sobre esta questão, Evanildo Bechara (Moderna Gramática Portuguesa, Rio de Janeiro, Editora Lucerna, pág. 134) refere o seguinte:

«Já foram femininos fim, planeta, cometa, mapa, tigre, fantasma, entre muitos outros; já foram usados como masculinos: árvore, tribo, catástrofe, hipérbole, linguagem, linhagem [...].»

Pergunta:

Podemos considerar as palavras Montemor e Alentejo derivadas por justaposição?

Resposta:

Os topónimos em apreço não são derivados, são compostos. De acordo com a terminologia gramatical tradicional, trata-se de compostos por aglutinação, uma vez que os seus elementos constituintes se fundem na formação de uma única palavra. Deste modo, Montemor é a aglutinação de monte e mor, forma antiga de maior; e Alentejo, a de além e Tejo.

Pergunta:

Um dia destes vi esta expressão num site que me suscitou curiosidade:

«Exmo. Sr.,
 
responder-lhe-ia se o artigo supra submetido ao escrutínio dos users fosse da sua autoria.
Não o sendo, resta-me a impressão de um solidário "sentimento de vara" entre o senhor e os seus colegas.

Cordiais saudações.»

A expressão é «sentimento de vara». Que queria dizer a pessoa que a escreveu? Já vi a definição de vara no dicionário, mas ainda não consegui entender tal expressão.

As aspas na expressão são da autora.

Obrigado.

Resposta:

A expressão não está dicionarizada como locução autónoma e é extremamente ambígua, porque vara pode significar, segundo o Dicionário Houaiss:

«ramo de árvore, fino e flexível»; «ramo direito e comprido us. para derrubar ou apanhar frutos de ramos altos»; «peça de madeira, bambu, metal, delgada, roliça e longa», compreendendo «peça de madeira roliça us. como arrimo; cajado, bordão», «a peça de madeira us. no salto em altura, ou a percha us. como acessório de equilibrista ou ginasta», «m. q. bisnaga ("pão") [na Bahia]»; «haste de ferro ou madeira provida de gancho, us. para suspender mercadorias»; «peça de madeira us. nos matadouros para suspender o animal após o abate»; «ramo fino us. como açoite», acepção donde deriva a  noção do o próprio castigo, «surra dada com vara»; «haste fina ger. de metal que faz parte da estrutura de armação do guarda-chuva e objetos semelhantes (pálio, barraca de praia etc.); vareta»; como termo antigo, «antiga insígnia representando o poder e autoridade dos juízes e vereadores», donde deriva as acepções de «poder e autoridade conferidos a alguém», «cada uma das circunscrições judiciais que compõem o foro de uma comarca onde há mais de um juiz de direito», «o cargo de juiz»;  «medida antiga de comprimento equivalente a 5 pés portugueses»; termo antigo significando «unidade de comprimento do antigo sistema metrológico brasileiro, que equivalia a 1,10 m»;, donde derivam «pedaço de tecido com essa medida», «grandeza reguladora de medição; medida, bitola»; «o tubo móvel do trombone que serve para criar diferentes grupos ou notas, mais agudas ou mais graves»; «m. q. vareta» , em música; «haste de bambu ou de material sintético ao qual se prende a linha com o anzol para a pesca»; «peça da manobra que serve para pendurar refletores ou outros elementos do cenário»; «qualquer coisa que impede, atrapalha; obstáculo, óbice, empecilho»; «manada de ...

Pergunta:

Apesar de a questão já estar respondida neste artigo, deparo-me com a grande dificuldade de encontrar sinónimos que me permitam dispensar o uso de enquanto com esse fim.

Uma vez que «na qualidade de» é uma expressão extensa, cuja repetição se torna evidente, é importante encontrar um equivalente que, de preferência, não ceda ao galicismo evitável. Podem sugerir soluções?

Aliás, a palavra nessa acepção não se encontra sequer em todos os dicionários. Convido-vos, entretanto, a espreitar a entrada enquanto no dicionário Infopédia, que, para além de ilustrar o que digo, ainda legitima a fórmula «enquanto que».

Quer-se evitar os erros, mas eles por vezes são tão confortáveis...

Sempre grata pela atenção.

Resposta:

A resposta que refere já é bastante antiga, reflectindo a posição da tradição normativa mais purista. Mas os dois casos apresentados são diferentes:

enquanto = como, na qualidade de: dicionários recentes, como o da Academia das Ciências de Lisboa e o Houaiss, registam-no, sem qualquer indicação que o desaconselhe.

enquanto que: a tradição reprova a junção do que; esta conjunção, segundo alguns gramáticos, terá surgido por influência do francês tandis que (= «enquanto») ou, segundo outros, por analogia com outras locuções subordinativas como logo que, posto que e, sobretudo, ao passo que, que também exprime conformidade.