Pergunta:
Em Abertura de 3/2/2010, há uma chamada sob título «As relações difíceis entre a escrita e a fala», cuja frase inicial é «A grafia não imita a fala». Discorre sobre a eterna querela da ortografia ser fonética ou etimológica, quando, de fato, ela tem de ser um mero conjunto de signos, convencionado, para que todos es crevam de uma determinada maneira "correta", e todos que a falam ou leiam consigam entendimento. Ao contrário da fala, que os linguistas consideram que não há certa nem errada, a escrita é diferente; a lei obriga a escrever "certo". E é por isto que não entendo porque existe a necessidade de se escrever falámos em Portugal e falamos no Brasil.
Que cada qual pronuncie como quiser (ou puder), mas não há razão para acentuar a escrita, ainda mais em palavras paroxítonas. Precisamos urgente de um Acordo Ortográfico unificador, de fato, da nossa escrita. Acabei de reler A Velhice do Padre Eterno, do imortal Guerra Junqueiro, em sua primeira edição, onde praticamente não há acentuação, mesmo em palavras proparoxítonas; os acentos não fizeram a menor falta ao entendimento ou à pronúncia mental que realizei enquanto lia. A pletora de acentos está fazendo com que a escrita digitalizada (praticamente não há mais escrita "manuscrita") leve os preguiçosos da Internet a escrever "nahum" apenas para não ter que digitar o til.
E viva a língua portuguesa, que consegue ser compreendida em um país de dimensões continentais como o Brasil, sem a preocupação dialetal.
Resposta:
Em nome do Ciberdúvidas, agradeço ao consulente a vontade de partilhar as suas reflexões por nosso intermédio. Pela minha parte, deixo aqui uns breves comentários a certas passagens do texto enviado.
1. «... a escrita é diferente; a lei obriga a escrever "certo". E é por isto que não entendo porque existe a necessidade de se escrever falámos em Portugal e falamos no Brasil.»
Penso que a diferença que é focada decorre exactamente de "leis" diferentes. Durante mais de 60 anos, distinguiu-se a terminação -amos (1.ª pessoa do presente do indicativo) da terminação -ámos (1.ª pessoa do pretérito perfeito do indicativo) em Portugal na observância do estipulado no Acordo Ortográfico de 1945 (AO45). No Brasil, não havia tal distinção, porque ela não estava prevista no Formulário Ortográfico 1943 (FO43). Recordo que a distinção no AO45 -amos/-ámos não era apresentada como reflexo dos factos de pronúncia de uma variedade em especial; no entanto, o que parece muitas vezes é: a distinção é feita na pronúncia-padrão do português europeu, e muitos consideram que deve ser conservada na tradição ortográfica respectiva. O Acordo Ortográfico de 1990 (AO90) recorre às facultatividades, para aceitar quer a distinção das terminações quer a sua indistinção, como se pode ler na Base IX:
«4 É facultativo assinalar com acento agudo as formas verbais de pretérito perfeito do indicativo, do tipo amámos, louvámos