Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Em Guimarães a Colina Sagrada é também conhecida por Monte Latito.

Qual a origem ou significado da palavra Latito?

Resposta:

Não se sabe ao certo a origem do nome Latito, a cuja entrada a Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira dedica breves linhas: «Latito. Antiga denominação do monte Largo, próximo de Guimarães. Deste monte trata o livro de Numadona [sic], da antiga colegiada daquela cidade.»1

Também se regista no Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, de José Pedro Machado: «top. ant. Monte perto de Guimarães, Lattito em 959 (Dipl. p. 48; ver também p. 226), Latito em 961 (id. p. 51), Lattido em 1059 (id. p. 260), Latido em 1258 (Inq. p. 298).» A forma medieval Latido, em confronto com Latito, apresenta sonorização de -t- intervocálico, indicando que o elemento -ito esteve em variação com -ido. Acontece que -ido é um sufixo que ocorre em vários topónimos portugueses e galegos como Carvalhido (Porto), Pampelido (Porto), Teixido (Corunha, Galiza); é uma variante de -edo, sufixo que forma nomes colectivos, sobretudo no domínio botânico (arvoredo) e que está também na origem de alguns topónimos portugueses: Macedo, Moledo. Se a variante Latido designa um antigo colectivo, então poderíamos relacioná-lo com Latedo e Lata (ou Latas), este, por sua vez, conversão em topónimo do substantivo feminino lata, «talvez na acepção nortenha, de "courela, leira, belga" (Machado, op. cit.).2

Além disso, se o radical de Latito for o mesmo de lata, ficamos a saber que esta palavra tem origem controversa, segundo o Dicionário Houaiss:

Pergunta:

Qual é a origem e o significado do provérbio popular «Boas palavras custam pouco e valem muito»?

Resposta:

Sobre a origem do provérbio em questão, não me foi possível encontrar fontes. Como já temos explicado, em relação à maioria dos provérbios, raramente se conseguem identificar o autor, as circunstâncias que rodearam a sua formulação ou reconstituir o contexto em que foi proferido e transmitido. Sobre o significado, parece-me quase literal: «Uma simples observação ou um simples conselho feitos com oportunidade e adequação são mais eficazes do que outras estratégias para ajudar ou persuadir.» Resta dizer que o provérbio se encontra registado no Grande Livro dos Provérbios, de José Pedro Machado (Lisboa, Editorial Notícias, 2005).

Pergunta:

Gostaria de saber se, segundo a norma culta, a raça canina se escreve "perdigueiro-português" ou "perdigueiro português". Li a resposta sobre pastor-alemão, mas este é um caso especial, pois trata-se de nome criado e registrado por associação privada. Se possível, peço-lhes ainda que expliquem por que se deve escrever dessa ou daquela forma.

Obrigado.

Resposta:

Recomendo perdigueiro-português, pelas razões que adiante exponho.

Antes da adopção do novo Acordo Ortográfico (AO 1990), a situação era esta:

— em Portugal, recomendava-se pastor-alemão, com hífen, seguindo o Vocabulário da Língua Portuguesa, de Rebelo Gonçalves, pelo que a tendência era hifenizar nomes de espécies, subespécies e raças animais (lobo-marinho, lobo-d´alsácia, gato-bravo);

— no Brasil, os dicionários registavam pastor alemão, sem hífen (Aurélio XXI, publicado em 1999, e Dicionário Houaiss, versão brasileira, de 2001).

A respeito do nome em questão, não encontro registos lexicográficos, mas suponho que as tendências atrás indicadas também eram aplicáveis: perdigueiro-português, em Portugal, e perdigueiro português no Brasil.

O AO 1990 unifica estes casos, porque determina que em compostos que designam espécies botânicas e zoológicas se use sempre o hífen (Base XV, 3.º): donde, perdigueiro-português.

Pergunta:

A palavra farinha-de-pau é aguda? As palavras justapostas mantêm uma acentuação independente, mas não posso dizer que farinha-de-pau é grave e aguda, se tivesse de classificar esta palavra quanto à sua acentuação, certo?

Muito obrigada.

Resposta:

A palavra farinha-de-pau é aguda, pelo menos, na transcrição fonética disponível no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa, a qual apresenta acento tónico na última sílaba: [fɐɾiɲɐdɨpáw]. Existe um acento secundário em farinha, na sílaba -ri-, mas este aspecto não costuma ser considerado no contexto dos ensinos básico e secundário.

Pergunta:

Cidades como Chicago, São Francisco, Atlanta, Sacramento, Colúmbia, Honolulu teriam gentílico na nossa língua?

Muito obrigado.

Resposta:

Nem sempre, porque, como já temos dito, há muitas regiões e cidades, quer no mundo de língua portuguesa quer fora dele, que não têm gentílico generalizado. Mesmo assim, apresento algumas breves sugestões:

Chicago: chicagoano (como criação de Luiz Autuori e Oswaldo Proença Gomes, Nos Garimpos da Linguagem, Rio de Janeiro, Livraria S. José)1

São Francisco: sanfranciscano (idem; criação dos autores citados)

Atlanta: não existe forma generalizada

Sacramento: não existe forma generalizada.

Colúmbia: não existe forma generalizada.

Honolulu: honoluluense (cf. chicagoano e sanfranciscano; criação dos autores).

1 Os autores da obra em referência assinalam os gentílicos que são sua criação («Os gentílicos com asteriscos são dos AA»).