Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Sempre ouvi dizer «pré-definições/pré-definido», em contexto informático, por exemplo, até há relativamente pouco tempo, em que passei a ver e a ouvir «predefinição/predefinido». Pesquisando a vossa página, e remetendo-me aos seguintes artigos, fica a sensação de que ambas as formas são aceites. Pensando eu que a forma «predefinido» se tratava de uma «modernice», fiquei admirado por ver a mesma constar numa edição de 1988 do Dicionário Lello Universal. A minha dúvida prende-se com a razão por que, sendo ambas as formas válidas, se está cada vez mais a adoptar a forma «pre» em detrimento da forma «pré-», visto que a segunda até é mais esclarecedora quanto ao significado da palavra.

Digamos que, para esclarecer o meu ponto de vista, esta dúvida me deixa «preocupado», e não «pré-ocupado», sendo que, neste exemplo concreto, a forma «pre» suscitaria dúvidas relativamente à interpretação do termo, ao passo que a forma «pré-» seria clara. É claro que o exemplo dado é meramente fictício, mas estou certo de que existirão termos não fictícios onde nos poderemos deparar com esta questão.

Logo, ainda que «pré-» possa retirar alguma versatilidade à língua, haveria algum problema em contrariar a tendência natural da evolução para «pre» por forma a tornar o discurso mais claro?

Segunda dúvida: com a adopção do Acordo Ortográfico, considerando a supressão do hífen em certas palavras compostas, a eliminação do H em início de palavra e a tendência para usar mais «pre» em vez de «pré-», irá «Pré-História» passar a ser escrito «preistória»?

Agradeço desde já a vossa ajuda e felicito-vos pelo extenso trabalho de pesquisa que fazem para responder a todas as nossas d...

Resposta:

1. Já temos aqui apontado as oscilações da pronúncia do prefixo pre-, as quais podem levar a articulá-lo como pré-. Sobre pre- e pré-, lê-se no Dicionário Houaiss que ambos são formas com origem no latim prae e transmitidos por via culta. Acontece, porém, que pre-, ao contrário de pré-, só ocorre em formas perfeitamente lexicalizadas, não funcionando como um prefixo disponível para a criação de novas palavras (cf. idem). Isto explica, por exemplo, que preocupado, «apreensivo, tenso» (Dicionário Houaiss) não seja exactamente o mesmo que pré-ocupado, que, não estando dicionarizado, é palavra possível em português e interpretável como «previamente ocupado». 

2. A palavra pré-história mantém a grafia, mesmo com a aplicação do Acordo Ortográfico de 1990.

Pergunta:

Gostaria de saber se estaria correto utilizar o nome da ilha de Sipadan (com n no final) em um texto todo em português. Como inclusive o nome do país (Malásia) está aportuguesado, seria correto aportuguesar o nome da ilha para "Sipadam"?

Agradeço desde já!

Resposta:

Não encontro forma portuguesa tradicional para o nome da ilha em questão, pelo que se recomenda a forma por que ela é conhecida internacionalmente: Sipadan.

Pergunta:

Qual o significado de «sossega o facho»? Qual é a origem da expressão?

Resposta:

O Dicionário Aurélio (versão electrónica 5.0) indica que a expressão «sossegar o facho» é o mesmo que «abaixar o facho», que, em português brasileiro familiar, significa «acalmar-se, aquietar-se (quem está muito agitado)». Outras expressões equivalentes são: «apagar o facho», «assentar o facho», «sossegar o pito».

Pergunta:

Como sou morador de Natal-RN, e vejo a construção na varias mídias locais «A prefeitura do Natal...». Daí pergunto se está correto a inserção da contração do, ficando assim «A prefeitura do Natal», ou deverá ser de.

Grato.

Resposta:

O nome da capital do estado brasileiro do Rio Grande do Norte usa-se sem artigo no português normativo, conforme se confirma pela consulta dos dicionários Houaiss e Aurélio, nos quais natalense é sempre definido como«relativo a Natal» (e não «ao Natal»). O topónimo em causa deve, portanto, usar-se com preposição, sem contracção: «A prefeitura de Natal». 

 

Pergunta:

Na oração:

«A ação jurídica saiu-lhe favorável.»

— A ação jurídica é o sujeito;

— «saiu» é o verbo transitivo indireto;

— «lhe» tem função de objeto indireto, pois é o complemento verbal do verbo sair;

— «favorável» é considerado como complemento nominal por completar o nome ação, ou desempenha papel de predicativo do sujeito vendo que a palavra também pode exprimir a ideia de característica do sujeito «A ação jurídica»?

Gostaria de saber se o verbo ser é intransitivo quando acompanhado de adjunto adverbial de tempo ou lugar, ou se é verbo transitivo indireto, pois exige preposição. Estudando em casa, percebi que nos livros apresentam a característica de que verbos intransitivos não precisam de complemento e que transitivos precisam, porém, na frase «O jogo será às dezesseis horas», o verbo tem sentido incompleto e consequentemente seria transitivo indireto, mas o livro pontua que o verbo ser neste caso é intransitivo quando significar realizar-se, ocorrer. Portanto, gostaria de saber se a ideia a seguir pode ser levada como verdade para provas de vestibular ou não: O verbo ser intransitivo não movimenta a ação do sujeito para o complemento, o complemento não recebe a ação até porque o verbo é impessoal e o sujeito também não o realiza, pois ser apresenta como sendo um estado do sujeito; no verbo transitivo há o movimento do sujeito para o verbo, a exemplo: «O Brasil exporta produtos agrícolas», há quem realiza a ação («O Brasil») e quem sofre a ação («produtos agrícolas») (Não utilizei o verbo ser porque ele não pode ser transitivo, some...

Resposta:

O uso sintáctico de sair não se limita às suas ocorrências como verbo intransitivo («Já saiu») ou transitivo indirecto («Saiu de casa»). Sair também pode ser empregado como verbo de ligação, como é o caso: «A decisão dos tribunais saiu-lhe favorável.» Nesta frase, «favorável» faz parte do predicado «saiu favorável», correspondendo ao tradicionalmente chamado predicativo do sujeito. Quanto ao pronome lhe, este marca o beneficiário pelo estado de coisa descrito pela frase; não sendo a rigor um complemento indirecto, as gramáticas classificam-no geralmente como um dativo ético ou de interesse.