Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Como se escreve a palavra que designa um afiador de facas metálico pontiagudo: "fusil", ou "fuzil"?

Resposta:

Escreve-se fuzil o «instrumento em forma de estoque, com punho e ger[almente] sem fio de corte, que serve para amolar facas e facões», conforme uma das acepções atribuídas a esta palavra pelo Dicionário Houaiss (edição brasileira de 2001). A fonte deixaria supor que o vocábulo é brasileiro, mas, ao que sei, não é isso que acontece (comunicação pessoal de Luciano Eduardo de Oliveira). O certo é que o termo tem uso em Portugal, como se verifica em páginas da Internet, relativas a empresas portuguesas que fabricam ou comercializam tal apetrecho.

Pergunta:

Há o plural do substantivo adjetivado quando ele não indica cor? Exemplos: "homens-máquinas", "eventos-monstros", "laranjas-limas".

Resposta:

Tudo depende do tipo de relação que se define entre o segundo substantivo e o primeiro. Se o primeiro substantivo for especificado pelo segundo, este não deve ser pluralizado. Se os dois substantivos estabelecerem uma relação de coordenação entre as realidades que nomeiam, então, vão os dois para o plural.

Em relação aos três casos apresentados, temos:

a) homens-máquina, se a intenção for referir um tipo de homens, ou homens-máquinas, se se pretender referir seres que conjugam qualidades humanas e mecânicas (cf. homem-pássaro, com os plurias homens-pássaro e homens-pássaros, no Dicionário Houaiss);

b) eventos-monstro, porque é de esperar que monstro seja utilizado adjectivalmente, no sentido de «enorme» — logo o segundo substantivo fica invariável;

c) laranja-lima é um caso semelhante a a), podendo ter como plurais laranjas-lima e laranjas-limas.1

1 O Dicionário Houaiss consigna apenas laranjas-lima, composto formado por dois substantivos, mas, em relação à entrada laranja-cravo, também constituída por substantivo + substantivo, regista dois plurais

Pergunta:

Na frase «De muitos destes bonecos sobram certos bocadinhos...», estarei certa se identificar as seguintes classes (antiga terminologia)?

muitos e certos — determinantes indefinidos?

Resposta:

Tendo em conta que muitos e certos se associam a substantivos, muitos é o plural de muito, quantificador existencial, enquanto certos é o plural de certo, determinante indefinido, de acordo com o Dicionário Terminológico (DT). Se muitos ocorrer como núcleo de um grupo nominal, então é um pronome indefinido (idem).

Pergunta:

Qual seria, porventura, o gentílico da Samogícia, antiga região do Leste Europeu, hoje integrada ao território da Lituânia? Caso exista, por favor, dizei-me se ele funciona como adjetivo e substantivo.

Muito obrigado.

Resposta:

Como se trata de um nome com escasso uso em português, não se tem imposto a necessidade de um gentílico. Parece-me disto elucidativo o facto de Samogícia não constar no Vocabulário da Língua Portuguesa (1966) de Rebelo Gonçalves. Mesmo assim, considerando outros casos, como o de voliniano, pode propor-se a criação de samogiciano, forma adjectival e substantiva. Poderá também sugerir-se a formação de samogício (cf. Dácia-dácio) e até de samogita, seguindo o modelo facultado pelo par Croácia-croata, no qual o c de Croácia é, como em Samogícia, etimologicamente um t, tendo em conta as formas latinas Croatia, Samogitia.

Pergunta:

Qual seria, porventura, o gentílico da Podólia, região da Ucrânia? Caso exista, por favor, dizei-me se ele funciona como adjetivo e substantivo.

Muito obrigado.

Resposta:

O nome Podólia tem escasso uso em português, dada a sua pouca projecção no horizonte informativo dos países de língua portuguesa. Não admira, pois, que não esteja fixado um gentílico correspondente ao nome da região assim chamada. Mas, tendo em consideração que de Ucrânia se forma ucraniano, não é descabido propor a criação de podoliano, usado como adjectivo e substantivo. Também não é de excluir a forma podólio, tendo em conta o modelo do par Etólia-etólio.