Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Qual seria o gentílico de Osroena, ou Osroene, antigo reino e antiga província do Império Romano? Caso exista, poderíeis dizer-me se funciona como adjetivo e substantivo?

Dizei, por favor, qual a forma melhor para o topônimo, pois, como podeis ver, há duas.

Obrigado.

Resposta:

Comecemos pela forma do topónimo: José Pedro Machado, no Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, regista a forma Osdroena, que diz ter origem no grego Osdroēnē, por via do latim Osdrŏēna. O mesmo filólogo assinala a variante Osdroene, que Rebelo Gonçalves inclui no Vocabulário da Língua Portuguesa. Observe-se, contudo, que, segundo o Dictionnaire Gaffiot, de latim-francês, a forma grega é Osroēnē, ocorrendo o d apenas na forma latina.

Quanto ao gentílico, Gaffiot consigna o latim Osdrŏēni, -ōrum, «habitantes de Osdoena», da qual se deduz a forma Osdroenos, que, com efeito, Machado e Rebelo Gonçalves acolhem nas respectivas obras, aqui em referência.

Pergunta:

Gostaria que me elucidassem sobre a classificação das palavras rio, tio e família quanto à acentuação e número de sílabas, dado que, em contexto de formação sobre o DT, foi-nos dito que família> é uma falsa esdrúxula, porque a palavra, na verdade, tem 3 sílabas, dado que _lia é uma só sílaba, sendo _ia um ditongo crescente, logo, uma só sílaba; além disso, e aqui é que reside a minha maior estranheza, disseram também que rio, frio, tio, pio, mio... são monossílabos, dado que as vogais que contêm io constituem um ditongo crescente, pelo que fazem parte da mesma sílaba, facto que, a confirmar-se, muda também a classificação destes vocábulos, que assim deixarão de ser palavras paroxítonas (com sílaba tónica na penúltima sílaba), mas oxítonas, dado que a sílaba tónica passa a ser considerada a última, embora saibamos que neste ditongo crescente (io) é na semivogal i que recai a tonicidade.

Estou deveras confusa, pelo que agradeço o vosso esclarecimento e apoio.

Resposta:

Sobre palavras que apresentem um encontro de vogais depois de sílaba tónica, como família, notário, ânsia ou pátio, encontra a consulente várias respostas no Ciberdúvidas. Há de facto alguma ambivalência na análise do acento deste tipo de palavras, porque, já na época em que se começou a aplicar o Acordo Ortográfico de 1945 em Portugal, Rebelo Gonçalves, no Tratado de Ortografia da Língua Portuguesa (Coimbra, Atlântida, 1947, págs. 152/153), não classificava claramente estas palavras como esdrúxulas, porque os encontros vocálicos representados pela grafia podiam formar ditongos crescentes:

«OBS. — Levam acento agudo, tal como os proparoxítonos integrados na norma anterior, as palavras que, tendo na sílaba tónica a, e ou o abertos, i ou u, ou então ditongo oral iniciado por vogal aberta, apresentam encontros vocálicos postónicos que pràticamente se consideram como ditongos crescentes (ea, eo, ia, io, ie, io, oa, oe, ua, ue, uo, etc.), embora em muitos casos possam formar teòricamente duas sílabas [...]»

Como exemplos desta...

Pergunta:

Qual é a divisão silábica de colégio?

Resposta:

Em princípio, no contexto escolar, tem-se considerado que palavras como sumário, Suméria e história terminam em hiato, isto é, as duas vogais finais pertencem a sílabas diferentes. Nessa conformidade, a palavra colégio, que também termina em -io como sumário, é analisada deste modo:

colégio = co.lé.gi.o

No entanto, no Ciberdúvidas tem-se explicado que as palavras terminadas em -io ou -ia em posição postónica (isto é, quando tais sequências ocorrem depois de sílaba tónica) podem ser analisadas de duas maneiras, dependentes de dois modos de elocução:

pronúncia pausada: trata-se duas vogais em hiato (sério = sé.ri.o; história = his.tó.ri.a)

pronúncia rápida: as vogais formam um ditongo crescente (sério = sé.rio; história = his.tó.ria)

Pela mesma linha de raciocínio, conclui-se que colégio pode não só dividir-se como se apresentou atrás mas também como co.lé.gio. Esta é também a forma de dividir graficamente a palavra em caso de translineação:

Pergunta:

Tenho lido «continente africano» com as iniciais tanto em maiúsculas quanto em minúsculas. O mesmo se refere à expressão «celebração eucarística».

Quando se poderá escrevê-las com as iniciais em maiúsculas e minúsculas?

Resposta:

Não encontro normas que se apliquem diretamente sobre as expressões em apreço. Podem, no entanto, usar-se maiúsculas iniciais, se, entre os responsáveis de uma publicação, se considerar que tais expressões devem ter maiúsculas iniciais para assinalar a importância das realidades designadas em dado contexto.

 

N.E. [24/04/2014] – São estas as regras do uso das minúsculas e das maiúsculas, estipuladas no Acordo Ortográfico de 1990 (Base XIX): 

 

DAS MINÚSCULAS E MAIÚSCULAS

1 A letra minúscula inicial é usada:

a) Ordinariamente, em todos os vocábulos da língua nos usos correntes.

b) Nos nomes dos dias, meses, estações do ano: segunda-feira; outubro; primavera.

c) Nos bibliónimos (após o primeiro elemento, que é com maiúscula, os demais vocábulos podem ser escritos com minúscula, salvo nos nomes próprios nele contidos, tudo em grifo): O Senhor do Paço de Ninães, O Senhor do paço de Ninães, Menino de Engenho, Menino de engenho, Árvore e Tambor ou Árvore e tambor.

d) Nos usos de fulano, sicrano, beltrano.

e) Nos pontos cardeais (mas não nas suas abreviaturas): norte, sul (mas: SW sudoeste).

Pergunta:

Quando se escrevem numerais ordinais ou abreviaturas, a forma correta obriga à introdução de dois carateres: o ponto (.) e um dos símbolos º ou ª (por exemplo, «art.º 1.º» ou «ref.ª»).

 

No entanto, a fonte Calibri (disponível em ferramentas Microsoft Office) disponibiliza um caráter que apresenta ambos os símbolos em simultâneo. É correta a "duplicação" que ocorre quando se introduz o ponto e o tal "caráter combinado"?

A presente caixa de texto não me permite ilustrar esta situação (está formatada como texto simples), mas chamo a atenção para a vossa pergunta número 16 331, em que tal situação é evidente.

Resposta:

Se houver duplicação — p. ex., 1..º — é claro que a forma não está correta, porque o que se espera é 1.º, com apenas um ponto de abreviatura e vogal em expoente. Mas parece-me que a consulente quer antes referir-se ao traço por baixo do º sobrescrito. Se assim for, note que este uso é tradicional em português e está correto, mas, pelo facto de certas fontes informáticas não o assinalarem, tem caído em desuso.