O uso do pronome ele como realização de um sujeito expletivo não parece ser importação de outra língua, visto que costuma ser identificado como traço de conservadorismo linguístico, conforme se lê na Gramática da Língua Portuguesa, de M.ª Helena Mira Mateus et al. (Lisboa, Editorial Caminho, 2003, pág. 283, n. 5; mantém-se a ortografia original):
Exceptuam-se frases feitas como a exclamativa Ele há cada uma! e enumerações como Tudo está mais caro: ele é o leite, ele é a fruta, ele é o peixe. Em variedades dialectais mais conservadoras podem ocorrer sujeitos expletivos com verbos impessoais como em Ele choveu toda a noite.
Numa perspetiva tradicional, mas fundada no saber filológico, Augusto Epiphanio da Silva Dias, na sua Syntaxe Historica Portuguesa (2.ª edição, de 1933, pág. 21), considerava que se trata de uma construção da linguagem menos cuidada (mantém-se a ortografia original):
[...] Na conversação descurada não se extranha dar aos verbos impessoais por sujeito grammatical o pronome elle ou os pronomes: isto, isso, aquillo:
E porque isto he noite recolhamo-nos para o lugar (H[eitor) P[into], I, 406) Isto são dez horas ([António] Prestes, 125).
Não que elle ha morotos muito grandes na tropa! (Camillo [Castelo Branco], Corja, 24).
Conclui-se assim que a marcação do sujeito associada a verbos impessoais tem atestação já antiga: com os demonstrativos isto, isso e aquilo, remonta ao século XVI (note-se que os dois primeiros exemplos são de Heitor Pinto e António Prestes, autores do referido século); com ele, pelo menos, usava-se no português oitocentista de Camilo Castelo Branco.