Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Gostaria de confirmar se a palavra álbum é um nome comum ou um nome comum coletivo. Segundo alguns dicionários, define-se como:

1. Livro em branco para colecionar fotografias, postais, selos, recortes, etc. 2. Livro em branco em que se coleccionam notas, pequenas composições literárias, autógrafos, etc. 3. Livro com muitas ilustrações, geralmente acompanhadas de pequenos textos (ex.: álbum de banda desenhada). 4. Obra musical de longa duração, gravada em suporte físico (CD, vinil, etc.) ou digital.

Entendo que será um nome comum. Está correto?

Obrigada.

Resposta:

Não há uma resposta taxativa para esta pergunta, mas, se se pensar num álbum como um conjunto de composições (musicais, retratos, autógrafos, etc.), a palavra é efetivamente um substantivo comum coletivo (atenção, que a categoria de substantivo comum não é incompatível com a de substantivo coletivo).

Pergunta:

Redil é um nome comum ou um nome comum coletivo. Ex: «Juntou as cabras no redil.»

Resposta:

Trata-se de um nome comum coletivo, quando significa «rebanho de ovelhas» (ou «de caprinos»). Já não é quando significa «abrigo para ovinos e caprinos» (cf. Dicionário Houaiss).

É de lembrar que os nomes ou substantivos comuns podem ser também coletivos – é o caso.

Pergunta:

Na frase «associamos aquela época a um mundo de barbárie», qual é a função sintática de «a um mundo de barbárie»?

Se atentarmos na definição de complemento indireto apresentada na vossa página por Edite Prada:

«[...] o complemento indireto tem, segundo a Moderna Gramática Portuguesa de Bechara, pág. 42, as seguintes características:

a) «É introduzido pela preposição a ou mais raramente para»;

b) a palavra que o expressa «designa um ser animado ou concebido como tal»;

c) «expressa o significado gramatical de ‘beneficiário’ ou destinatário»;

d) «é comutável pelo pronome pessoal objetivo lhe/lhes» (= a ele/a eles).

Pela descrição de Bechara, podemos concluir que o complemento indireto é um nome antecedido de uma preposição que pode ser a ou para.»

Se procedermos à substituição de «a um mundo de barbárie» por lhe, obtemos a frase: «Associamos-lhe aquela época.». Esta frase suscita-me duas questões. Por um lado parece-me que a sua aceitabilidade é discutível, por outro acho que não preenche a característica enunciada em c). Em síntese, «a um mundo de barbárie» é ou não um complemento indireto?

Agradeço o vosso trabalho.

Resposta:

O caso apresentado situa-se, como bem observa a consulente, nos limites do que pode ser construído como complemento indireto. Mas a sequência «associamos-lhe aquela época» está correta.

O grupo preposicional «a um mundo de barbárie» é corretamente substituível pelo pronome átono lhe (também chamada, em estudos mais especializados, forma de dativo do pronome átono) e desempenha a função de complemento indireto, mas, do ponto de vista semântico, não tem os valores típicos dos constituintes com essa função [ver as alíneas a) a d) da citação feita na pergunta]. Ora, na definição de uma categoria, não se julgue que as entidades e os comportamentos que estas evidenciam têm de satisfazer todos os critérios de tal definição; pelo contrário, muitas vezes detetam-se exceções, e um critério ou dois podem não ter correspondência na forma linguística examinada. No caso vertente, o grupo preposicional pode ser substituído por lhe, não porque marque destinatário ou beneficiário, mas mais por marcar um valor próximo do chamado dativo de interesse ou ético ou até de posse («associar a» como equivalente a «ser sócio de»).

Pergunta:

Como escrever corretamente o vocábulo que antes do Acordo Ortográfico de 1990 se grafava mão-de-obra? Uma consulta às fontes que tenho à disposição revela divergência. O Dicionário Priberam e o Ciberdúvidas acolhem apenas mão-de-obra. O dicionário Aulete, o Vocabulário Ortográfico Português e o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa acolhem apenas «mão de obra». Como proceder?

Resposta:

Trata-se de uma interpretação quer do artigo em causa* quer do Dicionário Priberam que é aceitável. No entanto, se usar a forma sem hífen não incorre em erro – pelo contrário, emprega até o que se recomenda, porque os vocabulários ortográficos existentes fixam a forma «mão de obra», sem hífen.

*Trata-se do artigo intitulado "O uso do hífen segundo o Acordo Ortográfico" de Roberto Sarmento Lima, no qual este autor mantém o hífen em formas como pé-de-moleque, pão-de-ló, mão-de-obra., as quais podem ser grafadas assim, mesmo no contexto do Acordo Ortográfico de 1990 (AO), se se considerar que são «exceções já consagradas pelo uso» (n.º 6, Base XV). Mas, sobre os compostos que contenham elementos de ligação (isto é, preposições), refira-se que os vocabulários ortográficos existentes registam pé de moleque, pão de ló e mão de obra sem hífen, generalizando o preceito aplicado a cão de guarda, fim de semana e sala de jantar, também conforme o mesmo n.º 6 da  Base XV do AO. Consulte-se o Vocabulário Ortográfico do Português do Portal da Língua, o vocabulário ortográfico da Porto Editora, o

Pergunta:

Leio (in  "A Google e a economia da atenção"  ) «graças a um algoritmo que ocupa o lugar de Deus, a Google é um titã da economia da atenção». No entanto, noutros registos (por exemplo, na Wikipédia: https://pt.wikipedia.org/wiki/Google), o género usado é o masculino: «O Google hospeda e desenvolve uma série de serviços e produtos baseados na Internet e gera lucro principalmente através da publicidade pelo AdWords.»

Pergunto: "a" ou "o" Google?

Resposta:

Reitera-se uma resposta dada em 2010: quando se tem em mente o motor de busca ou o motor de pesquisa* (ou, ainda, o buscador ou o pesquisador), diz-se «o Google», uma vez que se pressupõe a palavra motor, pesquisador ou buscador; quando se subentende a empresa, o nome usa-se no feminino: «a Google».

Há, no entanto, situações em que é difícil destrinçar a duas entidades que, ainda por cima, são indissociáveis, uma vez que o Google é, digamos, a face mais popular da Google. Observe-se igualmente que, além do motor de busca, a empresa Google disponibiliza outros serviços e produtos, e é subentendendo as palavras serviço e produto que se possibilita e reforça também a atribuição do género masculino, como acontece no segundo exemplo apresentado pelo consulente.

*De acordo com o glossário da Associação para a Promoção e Desenvolvimento da Sociedade da Informação (APSDI), «motor de busca» e «motor de pesquisa» são expressões sinónimas que significam «programa que permite ao utilizador fazer pesquisas de informação na Internet por palavras-chave» (exemplo da mesma fonte: «O motor de pesquisa da empresa Google, que para Portugal tem o seguinte endereço URL: https://www.google.pt/webhp?hl=pt-PT&tab=ww»).