Carla Viana - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carla Viana
Carla Viana
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Carla Viana é licenciada em Linguística e mestranda em Linguística Computacional pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

 

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Na frase «Não quero ter de limpar outra vez o lixo que aqui está», a expressão «outra vez» deve considerar-se uma locução adverbial?

Resposta:

A expressão «outra vez» é uma locução adverbial sinónima da expressão «mais uma vez», que significa «de novo» ou «novamente».

As locuções adverbiais são sequências de duas ou mais palavras invariáveis que apresentam a distribuição e o comportamento de um advérbio.

Estas locuções formam-se, tipicamente, mediante a associação de uma preposição com um nome, conforme «com certeza», de uma preposição com um adjectivo, conforme «de novo», e de uma preposição com um advérbio— « em cima». No entanto, no caso da expressão «outra vez», temos um demonstrativo com um substantivo. 

Pergunta:

Minha nora me enviou uma mensagem desta maneira:

«Ahh não esquece que no sábado tem a festa da Carol.»

Como estávamos marcando algo para o final de semana, entendi como uma negativa, tipo para esquecer tudo, pois havia a festa da Carol, só que na verdade ela estava só colocando para que eu não esquecesse da festa no sábado, eu disse então que ficaria mais claro se colocasse desta forma («Ahh, não esquece que no sábado, tem a festa da Carol.») Eu acho até que esteja faltando mais alguma coisa na primeira frase para que fique bem compreendida.

O que você acha?

Resposta:

A frase em análise não tem pontuação, convidando a várias interpretações. Em primeiro lugar, de acordo com a Nova Gramática do Português Contemporâneo, de Celso Cunha e Lindley Cintra, as «interjeições vêm de regra acompanhadas do ponto de exclamação», logo a seguir à interjeição Ah, que pode expressar alegria, espanto ou surpresa, temos o ponto de exclamação. Relativamente a toda a frase, o problema está em poder realmente haver várias interpretações; por exemplo: 

Interpretação a)

«Ah! Não esquece que no sábado tem a festa da Carol.»

Nesta expressão, o interveniente 1 lembra ao interveniente 2 que existe um acontecimento a ocorrer no sábado, que é a festa da Carol.

Interpretação b)

b) «Ah! Não, esquece que no sábado tem a festa da Carol.»  

Nesta expressão, o interveniente 1 indica ao interveniente 2 que deve esquecer o combinado anteriormente entre eles, uma vez que nessa data já tem outro compromisso.

Interpretação c)

«Ah! Não, esquece! No sábado há a festa da Carol.»

Pergunta:

Gostaria de saber se a palavra preso pertence à mesma família das palavras prisioneiro e prisão e qual delas é a palavra primitiva.

Obrigada.

Resposta:

A família de palavras designa o conjunto de palavras que partilham um radical comum. Estas palavras podem ser formadas pelos processos de derivação ou de composição e estão relacionadas etimológica e morfologicamente com o seu radical.

Segundo o Dicionário Houaiss e o Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa, a palavra preso provém do latim prehensus, particípio passado de prehendere, «prender»; a palavra prisão tem origem no latim prehensio,ōnis, cuja base é o radical de prehensum, supino de prehendere; e a palavra prisioneiro é derivada do francês prisionier, que tem origem as palavras latinas já referidas. Comparando as respectivas etimologias, podemos então concluir que, historicamente, preso tem exatamente o mesmo radical que prisioneiro ou prisão, ou seja, trata-se da mesma família de palavras.

Pergunta:

A palavra árvore de Natal é da família de árvore?

Resposta:

No caso do composto árvore de Natal, pode dizer-se que o próprio vocábulo árvore já define a família de palavras em causa, uma vez que a palavra Natal lhe está subordinada quanto à significação. A família de palavras designa o conjunto de palavras que partilham o mesmo radical e estão relacionadas etimológica e morfologicamente, podendo ser formadas pelos processos de derivação ou de composição.

Pergunta:

Gostaria de saber por que coragem se escreve com g, e corajoso, com j. Existe algum dicionário etimológico para consulta na Internet?

Obrigada.

Resposta:

O substantivo feminino coragem provém do francês courage, derivado de coeur, «coração», + sufixo –age, com o significado de «disposição nobre do coração, qualidade espiritual de bravura e tenacidade».

O adjectivo corajoso provém do substantivo coragem, sob a forma coraj- + sufixo -oso, adaptação do francês courageux.

O som [Ʒ] palatal pode ser representado na escrita pela letra j antes de qualquer vogal, e por g antes de e ou i. A grafia de j ou g antes de e ou i justifica-se muitas vezes pela origem da palavra, por exemplo (cf. Dicionário Houaiss):

 

jibóia  < yï'mboya (tupi)

gerar < generāre (latim)

Escrevem-se com g os sufixos -agem e –ugem, quer tenham origem no próprio latim, como imagem, quer apareçam numa fase posterior, mediante empréstimos do provençal e do francês, como é o caso de courage > coragem.

O g etimol...