A. Tavares Louro - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
A. Tavares Louro
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Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas — Estudos Portugueses e Franceses pela Faculdade de Letras de Lisboa. Professor de Português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Gostaria de saber o significado dos seguintes provérbios:

«Cão que ladra não morde»; «O peixe morre pela boca»; «Homem prevenido vale por dois»; «Para bom entendedor, meia palavra basta».

Obrigada.

Resposta:

Eis algumas interpretações comuns dos provérbios apresentados.

1 — «Cão que ladra não morde» é equivalente a «aquele que tem muita bazófia não faz aquilo que apregoa» ou «devemos ter cuidado com aqueles que mordem pela calada».

2 — «O peixe morre pela boca» significa «devemos ter cuidado com aquilo que dizemos porque podemos estar a engolir um anzol que nos lançaram».

3 — «Homem prevenido vale por dois» é equivalente a «devemos tomar especial cuidado quando partimos para um lugar ou uma situação onde poderá haver perigo».

4 — «Para bom entendedor, meia palavra basta» significa «não vale a pena falar em demasia quando o interlocutor já compreendeu a mensagem» ou «devemos estar atentos áquilo que não foi dito, mas podemos subentender».

Pergunta:

Gostaria de saber o aumentativo das palavras: planta, flor e festa.

Grata.

Resposta:

A palavra planta corresponde a um conceito muito amplo que usamos para nomear os seres vivos vegetais, cujas dimensões no estado adulto são definidas para cada espécie. Por isso, o aumentativo sintético (em teoria, plantão ou plantona) não tem justificação. Poderemos formar aumentativos analíticos de acordo com outros elementos distintivos: planta esplendorosa, frutífera, acolhedora, etc.

A palavra flor tem, em princípio, os aumentativos florão e florona. Contudo, florão é normalmente um ornato em forma de flor (cf. Dicionário Houaiss); e o uso de florona limita-se a casos pontuais, como sejam os do registo infantil. Deste modo, como flor se aplica também a uma diversidade de órgãos reprodutores das plantas, cujas dimensões estão limitadas em cada espécie, o aumentativo só pode ser usado por via analítica com a ajuda dos adjectivos adequados: flor delicada, flor persistente, flor encantadora, etc.

O aumentativo sintético de festa pode ser festança ou festanço.

Pergunta:

Escreve-se "intergeracional", ou "inter-geracional"?

Resposta:

A forma intergeracional não implica nenhuma dificuldade de leitura nem ortográfica como sucede com a palavra super-realista, em que a letra r tem valores diferentes, ou com a palavra super-homem, que não pode ter outra grafia, visto que, nas sílabas intermédias, só os dígrafos "ch", "lh" e "nh" têm h. O hífen deve ser usado sobretudo para facilitar a leitura. Deste modo, o prefixo inter- só é seguido de hífen quando se junta a elemento começado por h ou r: inter-helénico e inter-racial.1

1 Nota: A aplicação do novo Acordo Ortográfico assim o prevê. Em Portugal, o Acordo de 1945 também estipulava o uso de hífen antes de elemento começado por vogal.

Pergunta:

Gostaria de saber como classificar morfologicamente os seguintes termos: e-learning; Fenprof; EVT.

Resposta:

Todas estas palavras funcionam como substantivos. Possuem, no entanto, denominações especiais.

A palavra e-learning é um estrangeirismo e um neologismo porque surgiu recentemente no domínio da informática e do ensino.

A palavra Fenprof, que é a designação de um dos sindicatos de professores em Portugal, é um acrónimo, porque é constituída pelas letras iniciais de várias palavras e é lida sílaba a sílaba, ou seja, de forma corrente.

A palavra EVT é uma sigla porque corresponde à denominação da disciplina Educação Visual e Tecnológica (no currículo escolar português), e ainda porque nós a lemos letra a letra.

Pergunta:

Fazer a análise morfológica de uma palavra é o mesmo que fazer a sua classificação morfológica? E é o mesmo que incluí-la numa classe de palavras?

Para melhor entender, pergunto: quando faço uma análise morfológica, por exemplo, da palavra astrografia? Quando digo que é um substantivo feminino, ou quando digo que provém do elemento astro-, mais o elemento -grafi-, + -ia? Se é que alguma constitui uma análise morfológica.

Grato.

Resposta:

Tradicionalmente, a análise morfológica é feita normalmente em relação a um texto, porque as palavras podem ter várias classificações morfológicas, ou melhor, podem pertencer a diferentes classes morfossintácticas de palavras (por exemplo, substantivo, adjectivo, verbo, advérbio, preposição, pronome, etc.).

Exemplos

1 – «Eu como pouco.» Nesta frase, «como» funciona como verbo.

2 – «Como chegaste aqui?» Neste caso «como» é um advérbio.

3 – «Tu estás tão bom como eu.» Nesta frase, «como» é uma conjunção comparativa.

Depois da análise de cada palavra no seu contexto, atribuímos a respectiva classificação morfológica porque a consideramos pertencente a uma classe de palavras.

Fazemos classificação morfológica quando dizemos que astrografia é um substantivo feminino.

Também na perspectiva tradicional, quando dizemos que esta palavra é formada por astro- e -grafia, estamos no domínio da história da língua, pois explicamos como foi formada esta palavra.

No entanto, com o desenvolvimento dos estudos linguísticos, em geral, e da morfologia, em particular, também se entende por análise morfológica a descrição da formação e constituição de palavras. Por conseguinte, considera-se que astrografia é um composto erudito (tem elementos de origem grega), ou, em propostas mais recentes, um composto morfológico.