A influência da cultura em língua portuguesa se dá, como muito tenho falado em minhas crônicas, a partir de variados modos de expressão das sociedades lusófonas, e as festas juninas são um exemplo de nossa diversidade e riqueza cultural, especialmente em Portugal e no Brasil. De grande tradição e popularidade na Península Ibérica, essas festas foram trazidas para o Brasil no século XVI, pelos portugueses, e foram assumindo um caráter local, em diferentes partes do país, de norte a sul. Mas foi no Nordeste brasileiro onde essa tradição criou raízes profundas e se transformou na manifestação mais importante e de maior valorização popular.
Devido à pandemia de COVID-19, pelo segundo ano consecutivo foram proibidas as festas juninas, causando tristeza e comoção na maior parte da população do Nordeste, que espera ansiosa por essa ocasião. Santo Antônio, São João, São Pedro estão sem fogueiras e sem os sons da sanfona, do triângulo e da zabumba. Aqueles que respeitam as medidas sanitárias de contenção da pandemia fazem as suas comemorações em casa, sem a sonhada viagem para as cidades do interior, onde as ruas e casas são pura festa e alegria, recheadas de muitas comidas típicas e do som do forró.
As comidas das festas juninas no Brasil valorizam os alimentos que são desta época do ano, como o amendoim, o milho, a laranja, além do aipim e da mandioca. Como não se deliciar com uma mesa típica de São João? Quentão, canjica, milho cozido e assado, bolos de aipim, de carimã ou puba, de milho. Pamonhas de milho e de carimã, amendoim cozido e torrado e licores tradicionais, como o de jenipapo, o mais famoso, mas também de cajá, uvas passas, tamarindo, maracujá. Além da mesa farta de tradição e de sabores, há todo o universo cultural das vestimentas típicas dessas festas, que imitam a gente simples das zonas rurais, além de, é claro, o gênero musical que anima esse período de festas, o forró! Luiz Gonzaga, foi um dos maiores expoentes desse gênero, e influenciou a sua popularização no Brasil e no exterior. Além dele, muitos outros artistas e bandas musicais contribuem atualmente para fomentar a forte indústria musical do forró, que embala o arrasta-pé e a dança de mesmo nome, com os corpos coladinhos, rodopiando no salão. Por todo esse rico universo, as festas e tradições juninas têm sido no Brasil um forte atrativo cultural para quem aprende o português como língua não materna, além de ser um produto cultural de grande exportação.
Nesses tempos de recolhimento, o forró foi dentro de casa, servindo-nos de consolo os versos do velho Gonzagão:
Ai que saudades que eu sinto
Das noites de São João
Das noites tão brasileiras nas fogueiras
Sob o luar do sertão.
[AUDIO: festa junina]
Crónica da linguista brasileira Edleise Mendes, lida no programa Páginas de Português de 27 de junho de 2021, na Antena 2.