[Na semana que o Brasil completou 198 anos da sua Independência], rememorando as cenas históricas e os personagens que, de diferentes modos, contribuíram para esse fato. Dom Pedro I, ou D. Pedro IV para os portugueses, é figura central nos livros didáticos de História, e seu grito nas margens do Rio Ipiranga, «Independência ou morte», selou a data de 7 de setembro de 1822 como um dos marcos do orgulho e da soberania do povo brasileiro.
Mas também conta a história que a Independência se fez de muitas outras maneiras, narrada pelas batalhas e confrontos ocorridos em várias partes do Brasil, sobretudo na Bahia, a partir de 25 de junho de 1822, na primeira batalha de Cachoeira, cidade do Recôncavo da Bahia. Por causa desta data, a capital do Estado é transferida para esta cidade todo 25 de junho, apenas por um dia, em honra à sua heroica participação nas lutas pela independência. Muitas outras batalhas se seguiram, culminando na Independência da Bahia, a 2 de julho de 1823. Por essas lutas e resistências, foram imortalizadas heroínas como Maria Quitéria e Joana Angélica, sem nos esquecermos dos heróis anônimos, índios, negros alforriados, mulheres, pequenos produtores rurais, um bando de gente comum, movida pelos anseios de liberdade.
Mas no 7 de setembro de 2020, o que temos a comemorar? Não se ouviram o rufar dos tambores e a estridência das cornetas, muitos menos a pompa dos desfiles que levam tantos espectadores às ruas, saudando os nossos heróis e mitos. Não apenas a pandemia nos impediu de comemorar e de proclamar o orgulho de ser brasileiro, mas o fato de que, hoje, somos uma nação em choque. Neste 7 de setembro de 2020, temos quase 130 000 mortos pela Covid19. Pais, mães, filhos, irmãos, amigos, gente comum, a maioria pobres e pretos. O que temos a comemorar? Os heróis do 7 de setembro de 2020 são outros, são os inumeráveis profissionais da saúde que trabalham sem descanso, sem direito a chorar as suas próprias dores; são os povos indígenas que resistem a todo tipo de abandono; são os que se dedicam a proteger as florestas do fogo que as consome. Se D. Pedro I hoje aqui estivesse, bem mais apropriado seria gritar: Independência e morte!
(Áudio disponível aqui.)
Texto da professora universitária brasileira Edleise Mendes, para o programa Páginas de Português, na Antena 2, do dia 13 de setembro de 2020.