Sucedem-se as tentativas de encontrar factos e denominações supostamente bizarros da Terminologia Linguística (como se a anterior, de 1967, fosse toda ela clara como água e como se muita desta terminologia não fosse já usada nas escolas). Helena Matos, por exemplo, não conseguiu encontrar lá a distinção de género. Sem muito trabalho – é só ler a definição –, a entrada para "adjectivo" em Classes de Palavras, diz: "classe aberta de palavras, que permite variação em género, número e grau". Também se pode simplesmente ir à entrada "género" e ler a definição. Helena Matos não conseguiu encontrar isto, mas encontrou os "nomes uniformes", que quanto ao género podem ser "epicenos, sobrecomuns e comuns de dois", e que, "para melhor ilustração dos leitores", a autora decide explicar a que correspondem. Mas nem precisava: as mesmas designações e os mesmos exemplos já figuram na página 196 da Nova Gramática da Língua Portuguesa, de 1984 – suponho que quando lidos nesse manual sejam claríssimos, mas não na TLESB.
A TLEBS é um dicionário que qualquer pessoa pode ter no seu computador e resulta de um trabalho de 9 anos que envolveu 15 000 professores de Português – muitos, portanto. A terminologia em causa "não reivindica nenhum paradigma teórico, estruturando-se sobre conceitos operatórios que se entende traduzirem zonas significativas de consenso". O consenso é visível: lá estão, em esmagadora maioria, velhos conhecidos como os adjectivos, advérbios, pronomes, proposições, etc.; os predicativos do complemento directo e do sujeito, as subordinadas e subordinantes, etc. Também há alguns conceitos mais recentes, como o de grupo, núcleo e modificador (adjectivais, nominais, adverbiais, etc.), que são familiares para quem se formou depois de 1984 e que, provavelmente por isso, são consensuais entre os professores.
O debate sério e informado sobre qualquer tema é importante porque é produtivo. Mas, com escassíssimas excepções, quando se fala da língua, imperam opiniões categóricas, desinformadas, para não dizer de má-fé e demagógicas. Os adolescentes de hoje expressam-se com mais dificuldade do que os pais e avós que apenas fizeram a escola primária? Que estudos há sobre como eles se expressavam quando eram adolescentes? Quando ouvimos esses avós hoje em qualquer café de bairro, ou lemos seja o que for que seja escrito pelo proprietário, nada nos leva a concluir que sejam grandes conhecedores do português. Não há paciência para a maravilha que era a 4ª classe salazarista. Não se exige que um comentador seja um especialista, mas tem a responsabilidade de perceber a área de conhecimento para poder reflectir sobre ela e questioná-la. Senão é só isto: um vazio inútil para todos nós.
Texto publicado no jornal Público de 17 de Novembro de 2006.