«Nós queremos que os Pesos da Régua dos nossos interiores sejam tão importantes quanto as Lisboas, os Portos, os Setubais, as Coimbras, os Aveiros, as Vianas de Castelo, os Faros deste nosso Continente. E, claro, os Funchais, os Portos Santos, as Pontas Delgadas, as Angras do Heroísmo, as Hortas, os São Jorges, as Madalenas, as Santas Marias, as Graciosas, as Flores e os Corvos para só falar nos mais próximos dos nossos mares.»
(do discurso de Marcelo Rebelo de Sousa, aquando da comemorações do 10 de Junho em 2023)
Os nomes próprios (antropónimos) designam entidades individuais e, por isso, geralmente, ocorrem no singular: «a Maria é boa moça». Contudo, podem ser usados no plural quando se referem a um grupo de indivíduos que partilha o mesmo nome, funcionando, neste aspeto, como nomes comuns. Assim, ao afirmar-se que «as Marias são boas moças», aquilo que está implícito é que as pessoas que têm em comum o nome Maria são, de facto, boas moças.
Já no que toca à pluralização dos nomes próprios que designam localidades (topónimos), podemos considerar que, salvo raras exceções em que denominação toma obrigatoriamente a forma plural, como é o caso de Caldas da Rainha, não causa estranheza a pluralização de Vila Nova – «em Portugal, há muitas Vilas Novas» –, em alusão a várias vilas com este nome, ou de Charneca («as Charnecas deste país»), ou mesmo Sobral («de norte a sul, há mais de 20 Sobrais em Portugal». Não tão comum é, no entanto, a pluralização também se aplicar aos topónimos que designam uma só cidade ou vila, como é o caso de Lisboa, Coimbra, Peso da Régua, etc., como fez o presidente da República Portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa, no 10 de Junho de 2023. Qual foi, então, a intenção do presidente da República?
Pela pluralização, o presidente referiu-se às localidades que partilham características: os «Pesos da Régua» representam todas as cidades e vilas do interior, mais esquecidas; «Lisboas» e «Portos» aludem às grandes cidades do litoral, menos esquecidas; os «Funchais», as «Pontas Delgadas», as «Angras do Heroísmo» remetem para as cidades e vilas dos arquipélagos portugueses, as quais, quer no contexto de Portugal quer no da Europa, são regiões periféricas.
Foi este o modo que Marcelo Rebelo de Sousa encontrou para não excluir nenhuma cidade ou vila, tendo todas ficado representadas através desta pluralização. Prova-se, assim, que a língua permite estes jogos, mesmo com uma subclasse de palavras que, em princípio, se prestaria pouco ou nada à flexão do plural. Não é, portanto, obrigatório uma regra estar escrita nas gramáticas de uso corrente para considerar casos como estes, que estão corretos.
Nota: para informação completa acerca da variação em número dos nomes próprios, consultar a Gramática do Português, da Fundação Calouste Gulbenkian, volume I, páginas 1012 e 1013 .