Diz-se (bem) que a preposição de se combina com os artigos definidos e com pronomes e advérbios começados por vogal. É o que acontece com da em «avenida da Liberdade», dela em «a casa dela» e daqui em «o barulho vem daqui», casos em que seria incorreto escrever ou pronunciar «de a Liberdade», «de ela» e «de aqui», respetivamente.
Contudo, antes de orações de infinitivo, a separação entre a preposição de (por vezes incluída em locuções como «apesar de») e as referidas subclasses de palavras é recomendada, para não dizer obrigatória. É por isso que, normalmente, se escreve «reconhecemos a importância de a liberdade perdurar», frase que apresenta «de a liberdade», e não «da liberdade». Porque se faz isto? Porque, neste caso, o artigo definido a se encontra dentro de uma oração: «reconhecemos a importância de [a liberdade perdurar].
No Ciberdúvidas, tem-se insistido na separação da preposição de, por um lado, e dos artigos definidos (o, a), certos pronomes (ele, ela e respetivos plurais) e determinados advérbios (aqui, aí), por outro (ver Textos Relacionados). São exemplos (o * indica incorreção ou forma de aceitação muito discutível): «ficou com a impressão de a casa ser pequena» (e não *da casa) ; «retirei-me a fim de eles ficarem à vontade» (e não *deles); «perdemos a alegria de aqui morar» (e não *daqui).
Não obstante, igualmente no Ciberdúvidas, a propósito de uma questão do passatempo A Dúvida da Semana, houve quem contestasse – com bons argumentos – a obrigatoriedade de tal procedimento. E, na verdade, consultando a Nova Gramática do Português Contemporâneo, que Celso Cunha e Lindley Cintra publicaram em 1984 (Edições João Sá da Costa, p. 211), acaba por se afigurar legítimo aglutinar a preposição de com as palavras atrás indicadas. Haveria, portanto, duas soluções corretas, e, na verdade, terá sido assim durante décadas no Brasil – mas não em Portugal e noutros territórios onde o idioma se fixou e oficializou.
Com efeito, no domínio ortográfico, existe há algum tempo uma regra que, não se aplicando historicamente a todo o mundo de língua portuguesa, parece hoje abrangê-lo inteiramente. Cabe, então, assinalar que, em Portugal, a regra da separação da preposição antes de oração de infinitivo é antiga e até estava consignada nas Bases Analíticas da Convenção de 1945, na Base XXXIV:
«Quando a preposição de se combina com as formas articulares ou pronominais o, a, os e as, ou com quaisquer pronomes ou advérbios começados por vogal, mas acontece estarem essas palavras integradas em construções de infinitivo, não se emprega o apóstrofo, nem se funde a preposição com a forma imediata, escrevendo-se estas duas separadamente: "a fim de ele compreender"; "apesar de o não ter visto"; "em virtude de os nossos pais serem bondosos"; "por causa de aqui estares".»
No Brasil, a situação era diferente, porque o Formulário Ortográfico de 1943, adotado na sequência da não ratificação do AO 45 por este país, nada dizia sobre a questão. Sendo assim, a junção ou a separação da preposição antes de oração infinitivo era tema discutido nas gramáticas, que geralmente toleravam a junção.
Entretanto, passaram os anos, e entrou em vigor o Acordo Ortográfico de 1990. Não deixa de ser curioso notar que o texto da referida base do AO 45 – a Base XXXIV, a que determina a impossibilidade da junção de de com artigos definidos e outras partículas – apareça transposto praticamente sem alterações numa observação final à Base XVIII do acordo ortográfico atualmente em vigor (AO 90). Parece, portanto, que atualmente se espera que, antes de oração de infinitivo, também se opere no Brasil a separação preposicional nos casos já descritos. Ou não? Talvez seja caso para a Academia Brasileira de Letras se pronunciar, porque as notas associadas à edição de 2009 do seu Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa não parecem esclarecedoras.
Resta acrescentar que a recente Gramática do Português (Fundação Calouste Gulbenkian, 2013-2020, 1508), que centra a sua descrição no português europeu, não faz referência à formulação do preceito na norma gráfica. Contudo, em nota, observa-se que está estigmatizado pela norma-padrão o uso de contrações de de com artigos, pronomes e certos advérbios no começo de orações de infinitivo, ainda que essas contrações se realizem (inevitavelmente) na oralidade e mesmo na escrita menos conscienciosa.