Muitos destes termos e expressões sobre a atualidade política brasileira nem são recentes. A verdade é que, todos eles, se leram e ouviram, quase sempre em forma de arremesso – e, não raro, insultuosa, mesmo... –, na semana da (mui) acalorada campanha eleitoral para as presidenciais no Brasil, marcadas para domingo, 2/10/2022. 30 deles, menos correntes do lado de cá do Atlântico, neste curto apanhado, em módulo de dicionário:
- Auxílio Brasil. Criado pelo governo de Jair Bolsonaro para substituir o programa social Bolsa Família, instituído na presidência de Luiz Inácio Lula da Silva, desde 2003. Similares, na prática, nos objetivos e destinatários (as famílias mais pobres).
- Bateu, levou. No sentido de «se apanhar, vai bater». Foi a tática empreendida pelo candidato Lula da Silva no confronto verbal com Jair Bolsonaro no último debate televisivo. Este, por sua vez, optou pelo tema da corrupção de dos costumes.
Cf. Bolsonaro vs. Lula: 12 factos verificados no último debate antes das eleições no Brasil
- Biomas. A Amazônia — que abriga cerca de 7% da superfície total do planeta e possui cerca de 50% da biodiversidade mundial – é um dos seis biomas terrestes do Brasil. O seu preocupante desmantamento, o maior nos seus últimos 15 anos, doi um dos temas mais acalorados na disputa presidencial de 2022.
Cf. Desmate da Amazônia em gestão Bolsonaro equivale à área do Estado do Rio de Janeiro + Propostas sobre o Meio Ambiente ganham importância na campanha eleitoral brasileira + Brasil. Ambientalistas receosos com apoio de Tebet a Lula
- Bolsolão. O mensalão na governação bolsonarista – i.e, o uso de bilhões do orçamento federal por deputados e senadores em gastos como obras, compra de equipamentos e procedimentos de saúde com pouca transparência, genericamente conhecido como Orçamento Secreto (ou paralelo), e que virou arma eleitoral contra Jair Bolsonaro. Cf. Mensalão + Orçamento secreto
Cf. O Bolsolão é um poço sem fundo
- Cabo eleitoral. É a pessoa que, geralmente em período eleitoral, sob a orientação de uma liderança partidária, a quem cabe conseguir mais integrantes para se filiarem no respetivo partido político e/ou convencer o maior número de votantes no(s) candidato(s) da sua chapa eleitoral. Cf. Santinho
Cf. Cabos eleitorais nas redes ganham protagonismo na corrida presidencial + Cabos eleitorais recebem a partir de R$ 40 para turbinar eventos de campanha em São Paulo + Bolsonaro e Lula viram cabos eleitorais involuntários um do outro
- Candidato da Paz e do Amor. Assim definiu o seu próprio estilo o candidato do PT à Presidência da República do Brasil, em entrevista ao Programa do Ratinho, do canal SBT: «Lulinha paz e amor [que] voltou com tudo nestas eleições.» Expressão em oposição à anterior, «sapo barbudo», criada em 1989, criada pelo então governador do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola (1922-2004), ao declarar o seu apoio ao ex-metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva na primeira campanha presidencial eleitoral em que participou. «A política é a arte de engolir sapos. Não seria fascinante fazer agora a elite brasileira engolir o Lula, este sapo barbudo?», indagou na altura Brizola
Cf. De ‘sapo barbudo’ e ‘Lulinha paz e amor’ a ‘amigo’ na Lava-Jato, os apelidos de Lula + Lula: de sapo barbudo a popstar
- De salto alto. Foi como o candidato Ciro Gomes explicou a ausência de Lula da Silva no primeiro debate televisivo: «Faltou por estar de "salto alto"; e achar que já venceu as eleições.»
Cf. De salto alto, Tarcísio de Freitas foge de debates e já nomeia secretários em São Paulo
- Ex-presidiário. Como se referem os críticos do ex-Presidente Lula da Silva, que ele qualifica de «massacre reputacional».
Cf. Justiça brasileira arquiva processo que levou à prisão de Lula da Silva
- Fake news. A disseminação de notícias falsas, vídeos, áudios e postagens de pura contra-informação é uma das marcas mais negativas desta campanha eleitoral brasileira.. Para combater este «vale tudo», o Tribunal Superior Eleitoral criou uma plataforma de denúncia de notícias falsas. descontextualizadas ou manipuladas.
Cf. Fake news + Eleições 2022: Dez momentos que marcaram campanha presidencial + As principais "fake news" sobre Jair Bolsonaro propagadas durante a campanha eleitoral no Brasil + As principais "fake news" sobre Lula da Silva propagadas durante a campanha eleitoral no Brasil + Lula pede que apoiadores ajudem no combate às fake news: «Preciso de vocês» + Cármen Lúcia manda apagar publicações com fake news de bolsonaristas contra partidos de esquerda + Alexandre de Moraes ameaça prender candidatos que divulgarem fake news + Nikolas publica nota de retratação a Lula desmentindo fake news bolsonaristas, mas provoca Moraes em seguida + General Villas Boas espalha fake news contra as forças progressistas e é duramente criticado nas redes
- Gabinete do Ódio. Nme dado a um grupo de assessores de Jair Bolsonaro que atuavam no Palácio do Planalto e foram coordenados por ele próprio w pewlo seu filho mais velho Carlos Bolsonaro. O grupo atuava na gestão das redes sociais, divulgando falsidades e calúnias contra Luís Inácio Lula da Silva e demais figuras oponentes à reeleição do então presidente. Começou a atuar durante a campanha para a Eleição presidencial no Brasil em 2018, continuando a atuar até o fim de seu mandato.
Cf. Como funciona o “Gabinete do Ódio” + O Grande Irmão
- Genocida. Em diversas publicações, anónimos e figuras públicas não hesitaram em responsabilizar o atual presidente, usando as hastags #BolsonaroCriminoso e #BolsonaroGenocida, em resultado da sua recusa na compra em número suficiente de vacinas contra a covid-19 e, em consequência disso, a altíssima mortalidade no país.
- Gordofóbico. «Ataque gordofóbico» foi assim classificado pelo painel de estatísticas Liberdade Direita LDR, de apoio ao atual presidente Jair Bolsonaro, a comparação da aparência física da atriz Thama Freitas com a fome no Brasil.
- Homo brasilis mediaevalis. Imagem demolidora sobre a governação de Jair Bolsonaro: «Mesmo com uma vitória de Lula, o Homo brasilis mediavalis acordado pelo bolsonarismo hibernará, mas sua cultura política anticívica intervirá na vida do país por muitos anos.»
- Imbroxável. «Imbrochável, imbrochável, imbrochável» Esse foi um dos gritos do presidente Jair Bolsonaro durante o seu discurso de 7 de setembro em Brasília depois de dar um beijo em Michele Bolsonaro, a sua mulher.
- Impeachment. O anglicismo usado no Brasil, em vez do termo em português impugnação [cf. Quais presidentes já passaram por processos de impeachment no Brasil?], voltou ao espaço mediático nestas eleições, com Jair Bosonaro como alvo.
Cf. Eleições no Brasil: Autor de ‘impeachment’ a Dilma declara apoio a Lula
- Lei de quotas. Estabelece uma determinada percentagem de vagas reservadas a alunos nas escolas públicas a estudantes com menores recursos financeiros e às minorias étnicas no país. Neste ponto são as chamadas cotas raciais.
- Mensalão. Assim ficou conhecido o esquema de compra de votos de parlamentares, deflagrado no primeiro mandato do governo de Lula da Silva. Cf. Bolsolão
- Orçamento secreto. Parte do orçamento federal transferido fraudulentamente para suporte eleitoral.Tudo começou em 2020, segundo ano do governo de Jair Bolsonaro: indícios de corrupção em gastos para aquisição de tratores, construção de escolas e exames médicos. Assunto recorrente dos opositores à reeleição do atual Presidente do Brasil, a quem apontam o expediente similar ao mensalão: financiamentos obscuros à sua base eleitoral de apoio. Cf. Bolsolão + «Tchutchuca do centrão»
Cf. O que é o 'Orçamento Secreto' e por que virou arma eleitoral contra Bolsonaro? + Documento assinado por Bolsonaro prova que ele mentiu e manteve orçamento secreto
- Petrolão vs. Lava Jato. Petrolão é o nome genérico dado ao esquema bilionário de corrupção na Petrobras, ocorrido durante os governos Lula da Silva e Dilma Roussef, que envolvia cobrança de comissões das empreiteiras, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e superfaturamentos de obras contratadas para abastecer os cofres de partidos, funcionários da petrolífera estatal e políticos. Um dos casos mais mediáticos foi a compra de uma refinaria de Passadena, em Houston, apelida popularmente de «ruivinha», por estar, a olho nu, toda enferrujada. Estes esquemas foram alvo de investigações da Polícia Federal por via de uma operação denominada Lava Jato *.
* Lava-jato = lugar onde se lavam carros. Passando a denominar todos os escândalos financeiros ligados à Petrobras, do nome resultou o termo lavajatista.
Cf. TCU absolve Dilma no caso da refinaria de Passadena + Petrobras conclui venda da refinaria de Pasadena para a Chevron + "Pai" da Lava Jato questiona operação e diz que país não é menos corrupto
- Pinguço. «Bêbado», «alcoolizado», no Brasil. Foi como Jair Bolsonaro insultou o seu adversário eleitoral, Lula da Silva, num tom cada vez mais agressivo, em declarações à imprensa em que, recuperando o que já dissera numa entrevista de 2016 ao The New York Times, admitiu «comer um índio cozido com banana sem problema nenhum». Cf. Xingamentos
Cf.. «Bêbedo» e «canibal». Campanha eleitoral cada vez mais agressiva + Bolsonaro comeria carne humana?
- Planeta fome. «De que planeta você veio? Planeta fome», pergunta e responde o padre Renato Júlio Lancellotti, de origem italiana mas nascido em São Paulo, citado no jornal digital português Sete Margens. Vestindo uma bata branca, um avental com a imagem de Santa Dulce dos Pobres ele sai com três voluntários, todas as manhãs, para servir o pequeno-almoço aos sem-abrigo da capital paulista. «Este é o Brasil real», diz para a repórter que o abordou. Uma realidade que inclui 700 pessoas só numa manhã para comer uma banana e um pão. Ao todo, mais de 40 mil na capital paulista; e com o país sinalizado, de novo, no mapa da fome das Nações Unidas, com mais de 180 mil pessoas morando permanentemente na rua.
Cf. Júlio Lancellotti: o padre ameaçado de morte no Brasil, mas protegido pelo Papa + A fome, todos os dias
- Rachadinha. Um dos filhos de Jair Bolsonaro, Flávio Bolsonaro foi denunciado em novembro de 2020 pelos crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro, apropriação indébita e peculato (uso de dinheiro público para fins pessoais). Em causa a transferência de salários para outros cúmplices do aparelho de Estado. Prática popularmente conhecida no Brasil como rachadinha, i.e., «parte do valor em comissão que volta para a conta dos parlamentares».
Cf. Tudo sobre a rachadinha + Em debate na Globo [no 2.º turno], o presidenciável do PT citou os 51 imóveis e as rachadinhas envolvendo a família Bolsonaro
- Santinho. Em formato de selo, começou a ser vendido nas ruas brasileiras, primeiro nas eleições presidenciais de 1945, por apoiantes do candidato, para a receita dessas vendas ser utilizada no financiamento da campanha do candidato. Evoluiu para o formato de um pequeno panfleto distribuído com o nome e número do candidato propagandeado. Cf. Cabo eleitoral
Cf. Os santinhos do PT da campanha para as eleições estaduais + PDT pretende apurar origem de santinho com candidata da sigla ao lado de Lula
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«Tchutchuca do centrão». Na gíria, no Brasil, tchutchuca é um adjetivo dado a uma menina para chamá-la de «bonita» ou «gata» – uma forma de dizer que ela é atraente. Criada e utilizada principalmente no Rio de Janeiro, onde ficou conhecida através do funk carioca, no início dos anos 2000, a expressão «tchutchuca do centrão», usada há muito no léxico político brasileiro, entrou na presente campanha eleitoral em finais de agosto, quando um apoiante desiludido de Jair Bolsonaro assim o chamou depois de ele ter permitido um «orçamento secreto» que garantiu, pelo menos, 16 mil milhões de reais aos deputados mais oportunistas do parlamento, de forma a proteger-se de eventual destituição e poder governar. E passou a ser recorrente, tanto nos media tradicionais, como nas redes sociais. Cf. Orçamento secreto
Cf. Bolsonaro pergunta a jornalistas: «Quem é tchutchuca do centrão?»
- Turno. É como no português do Brasil se denomina a 1.º e 2.ª voltas de quaisquer eleições. Cf. Voto enrustido
Cf. Brasil, 2 de outubro de 2022: a votação no primeiro turno
- Vaza Jato. Foi o vazamento de conversas realizadas através do aplicativo Telegram entre o então juiz Sergio Moro, o então promotor Deltan Dallagnol e outros integrantes da Operação Lava Jato. A divulgação das conversas foi feita pelo jornalista estadunidense Glenn Greenwald, do jornal digital The Intercept, a partir de 9 de junho de 2019.
Cf. O jornalista Leandro Demori, que foi do Intercept e participou da Vaza Jato, série de denúncias contra o ex-juiz suspeito Sérgio Moro, obrigado a sair do Brasil para proteger a sua integridade física e da sua família + Em família, decidimos sair do Brasil. O motivo
- Voto de cabresto. Refere-se ao voto em que o eleitor escolhe um candidato por determinação de um chefe político ou cabo eleitoral, popularizado no tempo do chamado coronelismo. Muitas vezes, o cidadão nem sabia exatamente em quem votava. Por isso, é denominado «eleitor de cabresto».
- Voto enrustido. O mesmo que voto envergonhado ou mentiroso: «modalidade que acomete aqueles que não declaram a sua preferência nem mesmo para o instituto de pesquisa, mas crava nas urnas na hora agá». Com a polarização extremada bolsonarismo versus lulismo, é considerado decisivo na eleição presidencial, juntamente com o chamado voto útil [no segundo turno, dia 30 de outubro de 2022]. Cf. Turno
- Xingamentos. Proverbial nele, os insultos de Jair Bolsonaro subiram de tom no último troço desta campanha eleitoral, contra Lula da Silva e outros seus oponentes políticos. Como correspondentes ricochetes. Cf. Pinguço
- Cf. As maiores ofensas entre Bolsonaro e Lula em vésperas da 2.ª volta + «Depravado criminoso», diz Gleisi Hoffmann, após fala pedófila de Jair Bolsonaro + Fala pedófila de Bolsonaro gera indignação nas redes sociais
Cf. Glossário Eleitoral + Entenda o significado de termos usados em época de eleição + Dicionário para um Brasil em dia de eleições + 216 palavras para a imprensa definir com precisão Bolsonaro e seu governo + O que é ser bolsonarista? + O que é ser petista ou lulista? + O que é ser conservador? + O que é ser progressista? + O que é ser de direita, esquerda ou centro na política?