«1º-ministro distribui retrato pelas embaixadas depois de demitido». «2ª-feira [Santana Lopes] inaugura o tribunal de Sintra, 3ª vai a três concelhos de Coimbra (...)». «(...) Ainda que, pelo menos, se tenha queimado o nº 2 de um partido?»
As citações são do semanário "Expresso", mas bem podiam ter sido de qualquer outro jornal português, tal a generalizada negligência no cumprimento do obrigatório ponto na grafia dos ordinais. Qualquer abreviatura, como é o caso, obriga a levar o sinal respectivo, o ponto: «1.ª, 2.ª e 3.ª conjugações» [Nova Gramática do Português Contemporâneo, edições João Sá da Costa, pág. 402]; «1.ª oração, 2.ª oração (...)» [Moderna Gramática Brasileira, de Celso Pedro Luft, Editora Globo, São Paulo, pág. 92]; «Emprega-se o acento agudo na 3.ª pessoa do singular [os derivados de ter e vir: contém, retém, intervém, advém» [Manual Prático de Ortografia, de José M. Castro Pinto, Plátano Editora, Lisboa, pág. 119].
Como D´Silvas Filho lembrou em várias respostas anteriores, só não se usa o ponto nos símbolos (ex.: elementos químicos: ouro = Au; bário = B; etc.) e nas unidades de medida (que também são símbolos: metro = m; quilómetro = km; etc.).
«Mas – como lembra este consultor do Ciberdúvidas – o ponto é indispensável nas palavras abreviadas, significando que alguma coisa foi retirada. Por exemplo, na abreviatura Eng., o ponto significa que foram retiradas as letras 'enheiro'; e, numa possível abreviatura Eng.º, que foram retiradas as letras intermédias 'enheir'. Logo, não faz sentido inscrever o ponto depois do índice superior, pois que a supressão de letras é anterior.»
É esta a regra que se aplica ao caso dos ordinais. Citando, de novo, D´Silvas Filho:
«Por exemplo, em 2.º, o ponto significa que o cardinal se deve ler 'segundo', com a terminação da palavra em índice superior (que podia ser a, de segunda). Esta é a lógica.»
É essa a lógica que segue Guilherme de Almeida na obra de referência, Sistema Internacional de Unidades (SI). No capítulo "1 Indicações Gerais", estão ao longo do texto grafados os exemplos: 9.ª, 11.ª, 1.º, 4.º 2.º, sempre com ponto antes do índice elevado.
Também no texto da norma ortográfica que nos rege (de 1945, cópia em Rebelo Gonçalves), as alíneas da Base V estão numeradas: 1.º, 2.º, 3.º, 4.º, 5.º e 6.º, sempre com ponto antes do índice.
Não pôr ponto nestes casos – como cada vez mais é prática negligente nos jornais portugueses –, para além do desrespeito às normas inerentes a qualquer língua minimamente prezada 1, dá lugar a todas as ambiguidades. Por exemplo, 2º não é a mesma coisa que 2.º, pois 2º pode ser interpretado como dois levantado a zero, isto é, um.
1 Vide o que vai por aí, também, de desregramento na grafia da maiúsculas e minúsculas. Ou, noutra imprecisão muito comum, agora, a abreviação do São de São Tomé e Príncipe ("S. Tomé…"). Nos nomes de terras e países a grafia indistinta do São e do S. (ou do Sant'), como acontece com os nomes de santos, não é aceitável. Por isso, se escreve São Sebastião da Pedreira (e não "S." Sebastião da Pedreira), São Domingos de Rana (e não "S." Domingos de Rana), São Luís do Maranhão (e não "S." Luís do Maranhão), São Marinho (e não "S." Marinho), etc., etc.
Cf. Símbolos de unidades + A grafia (diferente) de abreviaturas e dos símbolos + Sobre a escrita dos números, das horas e de outras representações + Sigla ACA - Reduções diversas
P. S. - Reconhecendo o erro em que laborava, depois do apontamento acima escrito, o "Expresso" passou a grafar correctamente a abreviação da numeração ordinal. «Ex-1.º-ministro poderá viver em Monsanto», «...Portugal está a meio da tabela, com a 12.ª taxa de desemprego da UE» - são alguns (bons) exemplos colhidos na edição de 5 de Março de 2005. Louve-se, pois, o regresso à matriz de qualidade e rigor do mais influente jornal português. Só falta mesmo que os restantes jornais portugueses afinem pelo mesmo diapasão. Ah!, e, já agora, senhoras e senhores professores, especialmente de Português, há livros escolares que bem precisavam de uma revisão mais cuidada nesse pormenor da sistemática falta do ponto na abreviatura do ordinal...
[Obrigatório é, tão-só, o ponto a seguir ao algarismo (1., 12., etc.). Se, eventualmente, por razões estéticas, se quiser sublinhar o º em índice elevado, proceda-se então da seguinte forma para a devida inserção, no programa de texto Word: 1) Vai-se ao menu Formatar/Format; 2) Na opção Fonte/Font (ou, noutros sistemas operativos, no Tipo de Letra) escolha-se a fonte Microsoft Sans Serif e seleccione-se o símbolo º. Fica, então, sublinhado oº em índice elevado.]
Quanto à grafia dos símbolos: como recomenda D' Silvas Filho nesta resposta, além de não levarem ponto, devem ser escritos com um espaço de intervalo a seguir ao algarismo que representa a grandeza (exs.: 2 º ou 60 min).