A propósito desta controvérsia [sobre a função sintática da palavra tirania na frase de Gil Vicente «Não se embarca tirania neste batel»] mantenho-me firme na minha convicção de que estamos perante um caso de ambiguidade entre a função de sujeito e a de complemento direto, dependendo da interpretação do se.
Os argumentos aduzidos por Maria Regina Rocha têm muita validade e eu não discordo de nenhum deles. Mas…
Se os analisarmos com atenção, todos os exemplos dados estão no plural:
a) «Leram-se histórias.»
b) «Vendem-se casas.»
c) «Alugam-se barcos.»
d) «Dão-se explicações.»
Estou totalmente de acordo em que nestes casos estamos perante um se passivo, pois o SN (sintagma nominal) encontra-se no plural, logo, desencadeia a concordância com o verbo.
Agora…
Existe ambiguidade quando estamos perante um SN que se encontra no singular.
Não esquecer que a frase original é: «embarca-se tirania».
Se a frase fosse «embarcam-se tiranias», inequivocamente teríamos uma estrutura passiva.
Agora, existindo um SN no singular e um verbo transitivo direto (e neste contexto embarcar é transitivo direto), não podemos excluir a interpretação de que o se é que é o sujeito da frase (logo, se indefinido ou nominativo), sendo tirania o complemento direto do verbo: «Alguém embarca tirania/injustiça/malvadez.»
Embarca-se o quê? Tirania, injustiça…
Em suma, os meus argumentos são os mesmos que os aduzidos nesta resposta: Ainda «Veja(m)-se as seguintes...».
Cf. O se só pode ser sujeito em orações reduzidas + Tirania = sujeito