1. Em português, as locuções iniciadas por à são abundantes. Tome-se como exemplo «à pressa», «à medida que», «à vista». A natureza da palavra à é, todavia, geradora de discórdia. Há gramáticos que defendem que se trata de uma contração da preposição a com o artigo definido a, que é assinalada pelo acento grave. Porém, outros gramáticos há que sustentam uma interpretação distinta: o acento de à não sinaliza crase, mas apenas a abertura da vogal. A explicação desenvolvida destas posições pode ser acompanhada na resposta que se encontra na nova atualização do Consultório. No plano das classes de palavras, há situações em que o particípio verbal se converte em adjetivo. Este processo dificulta, em certos usos, a identificação da classe de pertença da palavra na frase. Nesta resposta, apontamos alguns critérios de classificação que poderão auxiliar na distinção. No plano da organização frásica, a construção de frases longas exige uma atenção particular ao plano da coesão, pois o nexo que os constituintes vão estabelecendo na sequência frásica poderá criar tensão entre o plano sintático e o plano semântico-pragmático, o que fica claro na análise desta questão. Por fim, as designações não científicas atribuídas às flores resultam, por vezes, de processo orais que são suscetíveis de operarem alterações às palavras. Será esse o caso de cravo-púnico e cravo-túnico?
2. A dinâmica linguística, consequência da situação pandémica, é um facto constatado em inúmeras línguas, que tem, inclusive, desencadeado o interesse do cidadão comum por questões de lexicografia. Renovam-se os processos de formação de palavras, acrescentam-se sentidos e formam-se novas locuções e expressões. No glossário A covid-19 na língua, acompanhamos, desde março, a evolução do fenómeno e vamos dando conta do que vai ocorrendo na língua portuguesa nas suas diferentes variantes. Do Brasil, chega-nos uma curiosidade: os termos "cloroquiners" e "quarenteners", que são formados através da junção ao radical do sufixo inglês -er, que significa "adepto" ou "apoiante". Para além destas inovações lexicais, o glossário passa a integrar palavras ou expressões como covidiota, desconfinamento assimétrico vs. desconfinamento contido, estado de alarme, pangolim, «(não) voltar à rua», entre outras. O processo de transformação da língua e a relação dos falantes com os novos termos e sentidos é também objeto de reflexão no Brasil, num artigo do jornalista Victor Stock, intitulado «Pandemia do coronavírus traz à tona novas palavras e termos» (artigo publicado no jornal brasileiro Diário da Região – de São José do Rio Preto, aqui reproduzido com a devida vénia).
3. A Associação Brasileira de Linguística (Abralin) tem vindo a promover o evento Abralin ao vivo: Linguists Online, que conta com uma agenda diária de conferências e mesas-redondas com importantes nomes do cenário nacional e internacional da Linguística, transmitido em linha numa plataforma aberta e interativa. Das comunicações já realizadas destacamos aqui a do linguística português Ivo Castro, intitulada «Portugal visto do céu — demografia, dialetologia e história da língua». Nele, o autor passa em revista aspetos da evolução do português, centrando-se em mapas dialetológicos elaborados por Leite de Vasconcelos, Paiva Boléo e Lindley Cintra e defendendo que os mapas necessitam de uma atualização, atendendo à influência da escola e dos meios que comunicação social, que apagaram diferenças no domínio escrito a suavizaram marcas regionais da pronúncia.
4. A questão da proximidade entre o galego e o português, que Ivo Castro também aborda na sua conferência, tem estado associada a avanços e recuos nas opções políticas espanholas relativamente ao galego. O que é certo é que o galego perde atualmente falantes face ao poder de hegemonia do castelhano, ao mesmo tempo que se desenvolvem iniciativas que visam cativar a atenção dos galegos para a língua e para o estreitamento de relações com a língua portuguesa, como nos dá conta o jornalista português Ruben Martins, num artigo divulgado o suplemento P2 do jornal Público, onde questiona «O galego vai salvar-se no português?». É também sobre o galego e sobre as ameaças de desaparecimento que a língua enfrenta que reflete o professor universitário Marco Neves num apontamento divulgado no seu blogue Certas Palavras.
5. O bilinguismo constitui a realidade dominante em muito países do mundo. A evolução histórica, a união de povos diferentes num mesmo país, a mobilidade de populações... inúmeros foram os fatores que contribuíram para diferentes situações de multilinguismo. O Brasil não é exceção a esta realidade. Embora, ao longo da sua história, tenha sido testemunha de tentativas de impor o português como língua única, o que é certo é que o país mantém o seu multilinguismo, que tem raízes profundas relacionadas com as populações indígenas do território. É o que explicam os linguistas brasileiros Paulo Henrique de Felipe e Wilmar da Rocha D'Angelis no artigo transcrito na rubrica Diversidades.
6. Reabrem nesta data os museus em Portugal. Cincidente com o Dia Internacional dos Museus, o combate ao surto pandémico impôs regras novas de higienização, na exigência de distanciamento físico e no uso de máscara.
Esta é uma oportunidade para recordar alguns textos relacionadas com a temática, disponíveis no arquivo do Ciberdúvidas. Por exemplo: Museu de marinha vs. Museu da Marinha + O diminutivo de museu + «Museu Reina Sofia»... porquê? + São Paulo reconstrói o Museu da Língua Portuguesa
6. Este dia 18 de maio coincide, em Portugal, com a 2.ª fase do plano de desconfinamento, que prevê, entre outras medidas, o regresso às aulas presenciais dos alunos do 11.º e 12.º anos. Embora esteja circunscrito apenas às aulas das disciplinas sujeitas a exame nacional, mantendo-se o regime de ensino à distância às restantes disciplinas, este plano tem merecido muito críticas oriundas de diversos quadrantes, que consideram que se trata de uma decisão precipitada que pode pôr em causa a saúde pública e que está apenas subjugada ao peso que os exames nacionais assumem no país. É esta a posição que a professora Lúcia Vaz Pedro assume no artigo de opinião que divulga no jornal Público. O tema do regresso às aulas motivou também o programa A Cena do Ódio, de David Ferreira, na Antena 1, onde se recordou ainda a canção Cheiro dos Livros, dos Cabeças No Ar. Uma homenagem aos professores de Português, que se apresenta também aqui: