O uso em questão não parece reunir consenso, porque o verbo distar, significando genericamente «ficar a (certa distância) de (algo), espacial ou temporalmente» (cf. Dicionário Houaiss), está sobretudo abonado com um complemento1 correspondente à dimensão da distância (que pode ser omitido, ocorrendo apenas um advérbio de quantidade) e um complemento introduzido por preposição (oblíquo), como se pode verificar nos seguintes exemplos:
1. «A entrada do António dista um longo período do momento atual.»
2. «A entrada do António dista muito.»
A frase 1 apresenta um complemento direto («um longo período», que refere a dimensão da distância) e um complemento oblíquo («do momento atual», o ponto em relação ao qual se mede a distância). Em 2, o verbo ocorre intransitivamente, sendo modificado por um advérbio de quantidade (muito).
Regista-se também a possibilidade de uma estrutura de coordenação associar as duas entidades que distam uma da outra, como se exemplifica em 3:
3. «A entrada do António e o momento atual distam entre si um longo período.»
Francisco da Silva Borba, no Dicionário Gramatical de Verbos do Português Contemporâneo do Brasil (São Paulo, Editora UNESP, 1991), dá conta deste comportamento do verbo distar: (confirmado pelo Dicionário Gramatical de Verbos Portugueses, dirigido por J. Malaca Casteleiro, Lisboa, Texto Editora, 2007):
«Constrói-se com sujeito inativo e com complemento da forma de + nome indicativo de lugar e com quantificação ou intensificação da distância. Significa ser ou estar distante ou a certa distância, estar apartado: A casa distava três quarteirões da praia [...]; A jovem é vistosa, mas dista muito da Miss Brasil. // O complemento pode coordenar-se ao sujeito e, então, condensarem-se ambos numa forma de plural: Esta jovem e Miss Brasil distam muito uma da outra; As duas jovens distam muito uma da outra [...].»
Ou seja, geralmente, o verbo distar tem por sujeito a pessoa ou coisa que dista de outra, e não a dimensão dessa distância («um longo período»).
No entanto, Francisco Fernandes (Dicionário de Verbos e Regimes, São Paulo, Editora Globo, 2001, s. v. distar) recolhe uma abonação que mostra que o sujeito de distar pode ser realizado pela quantificação da distância: «Quanto dista de um plebeu a um duque – isto é, "quanto vai" (Morais)».
Em suma, as fontes consultadas sugerem que é marginal o uso da expressão referente a distância como sujeito de distar.
1 A Gramática do Português, da Fundação Calouste Gulbenkian (2013, p. 1181), classifica como oblíquo o complemento não preposicionado que é selecionado por verbos de medida – entre os quais se afigura legítimo colocar o verbo distar. Trata-se de um oblíquo não preposicionado porque é um constituinte não substituível pelo pronome átono de acusativo nem ao qual se possa atribuir a função de sujeito de uma frase passivao: «A casa dista 2 km da vila»/*«a casa dista-os»/ *«2 km são distados pela casa». Esta parece ser também a posição de Celso Pedro Luft no Dicionário Prático de Regência Verbal (São Paulo, Editora Ática, s. v. distar, quando fala em «complemento adverbial direto»: «[...] A quantificação da distância ou divergência se expressa como complemento sem preposição – um complemento adverbial direto, o que leva à classificação de "transitivo direto": "transitivo" no sentido de "necessitado de complementação" (cf. O Rio dista de São Paulo, *O Rio dista; *Os últimos alunos distam dos primeiros, *Eles distam).