DÚVIDAS

Ter que e ter de 1

«Dir-se-á» que o infinitivo impessoal das frases de que vos servistes, para defender a vossa tese, exerce as funções de um nome e, nunca, as de «predicado» da oração.
   Será correcto escrever «tenho muito para contar», «elas tinham muitas coisas para dizer» e «não tens mais nada para fazer?».
   De qualquer modo, o vosso argumento não colhe; talvez não tenhais reparado que, se utilizásseis o velho método de perguntar ao verbo «quem?», «que coisa?», concluiríeis que as respostas seriam «contar muito», «dizer muitas coisas» e «fazer mais nada».
   Se aqueles verbos fossem o predicado de uma oração, o complemento directo continuaria a não ser o «que».
   Julgo ter compreendido a vossa dúvida ao ler a frase «Quando se estuda ter que, costuma-se estudar também ter de...»; o objecto de estudo deveria ser o infinitivo impessoal incluído na oração, que, obviamente, estará ligado aos outros elementos da mesma por uma preposição. «Ter que» e «ter de» são questões complementares, invocadas quando não se consegue ter uma visão global do objecto de estudo.
   Se persistir alguma dúvida sobre este assunto não hesitem: consultem-me!
   O meu galicismo «face a» fere-me menos os ouvidos e a vista que o "mail" utilizado nos endereços de correio electrónico; eu escrevi palavras portuguesas, sem desvirtuar a sua semântica.

Resposta

Digo o seguinte, respondendo à vossa consulta:

a) Quanto à presente questão, não defendi nenhuma tese minha. Apenas expliquei o que está estabelecido sobre este assunto.

b) Não se percebe por que razão, segundo as minhas palavras, a forma verbal de infinito é um nome, pois deixei bem claro que o pronome relativo é complemento directo desse infinito. Vejamos a frase: «Tenho muito que contar.» «Contar» o quê? Contar muito (=muitas coisas), representado a seguir pelo pronome relativo que, complemento directo de contar.

Não utilizei o velho processo de perguntar ao verbo «quem?», «que coisa?» Pois não! E para quê, se o caso é claro como água? E tanto o é, que o nosso caro consulente o compreendeu muito bem.

c) Ter de é diferente de ter que. Empregam-se em situações diferentes: ter de indica «obrigatoriedade, estar na obrigação, no dever de»; ter que (em latim, habere quod ou habere quid) apenas se refere à existência de qualquer coisa que há para fazer, de coisa que ainda não foi feita.

 

Eis aqui a razão por que, quando se estuda ter que, é indispensável estudar ter de. Só assim, compreendendo-se, se poderá ter a consciência do certo e do errado e da diferença entre eles.

(Cont.)

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