Antes da reforma ortográfica de 1990, o hífen colocava-se apenas nas formas monossilábicas do presente do indicativo do verbo haver empregado como auxiliar da conjugação perifrástica: hei-de vs. havemos de + infinitivo. Segundo Rebelo Gonçalves (1947: 238/239), no Tratado da Ortografia Portuguesa, a colocação do hífen deve-se a diferentes motivos, dos quais se salientam três: a preposição de não tem acento tónico, ou seja, é átona e, por esta razão, subordina-se à palavra antecedente; «os agregados obtidos com a preposição de e as formas verbais referidas constituem união vocabular [...] estreita», sendo disto prova as formas populares "hades" e "hadem"; as formas hei-de e hás-de podem ocorrer com o infinitivo subentendido — «Deixe-me; hei-de dizer-lhas, hei-de» (Garrett, A Sobrinha do Marquês, acto II, c. XIV).
Com o Acordo Ortográfico de 1990, e conforme a sua Base XVII, o hífen desaparece nas formas monossilábicas de haver auxiliar: hei de, hás de, há de, hão de. De acordo com a Nota Explicativa do Acordo Ortográfico de 1990, a eliminação do hífen nestas formas verbais é feita em razão de a preposição de funcionar apenas como um «mero elemento de ligação ao infinitivo com que se forma a perífrase verbal (...), na qual de é mais proclítica do que apoclítica». Por outras palavras, considera-se que a preposição se liga à palavra seguinte (o verbo no infinitivo) para formar uma unidade acentual.
Note-se, que haver como sinónimo de ter, em tempos compostos («tinha/havia feito») ou como verbo principal (transitivo directo: «hei medo», num registo arcaizante), não tem regência, não se confundindo, portanto, com haver auxiliar.
Observe-se ainda que o verbo haver seguido da preposição de serve para construir a forma composta ou perifrástica de futuro, mas não tem necessariamente o valor estrito de «ir». Observe-se os seguintes exemplos (já com a nova ortografia):
a) «Hei de ir ao Porto.»
b) «Hei de comprar um carro.»
Ambas as frases veiculam a noção de futuro, mas a) evidencia a intenção futura de uma ida ao Porto, enquanto b) patenteia a intenção futura de adquirir um carro. Esta estrutura distingue-se da construção de futuro ir +verbo no infinitivo, na medida em que esta transmite a noção de futuro próximo. Note-se os seguintes exemplos:
c) «Hei de comprar um carro.»
d) «Vou comprar um carro.»
Em d) o valor dado pela construção perifrástica ir + verbo comprar no infinitivo é a de futuro próximo.
Finalmente, recorde-se que a estrutura haver + de se distingue da construção ter + de, porque esta tem outro valor, o de obrigação:
c) «Temos de ir ao Porto.»