DÚVIDAS

Sobre as palavras trânsito e transitar

Peço desculpa pela insistência. De facto, como recomendado, já tinha feito uma busca e encontrado a vossa resposta. Provavelmente não me expressei claramente, mas a minha dúvida não está relacionada com a grafia (utilização de s ou z) das palavras trânsito, transitar (do latim transitu, como explicado), mas sim com a sua leitura. Se atendermos à regra de que o grafema s se lê z entre duas vogais, o que não é o caso das palavras atrás referidas, como se explica que, estando neste caso entre uma consoante e uma vogal o s se leia z? Já o seu étimo se lia assim? Mantenho também a dúvida sobre palavras como pinguim e tranquilo (e outras excepções) em que, ao contrário da regra, pronunciamos o u.

Obrigada.

Resposta

Trânsito, transitar

Uma das vantagens de estar deste lado é deparar com questões interessantes como esta! Confesso que nunca tinha “tropeçado” nesta evidência!

Creio que a explicação está nas características do elemento de formação trans-, que, permitindo embora a aglutinação (se considerarmos como aglutinação a inexistência do hífen), mantém autonomia fonética. Com efeito, o fenómeno que refere acontece com todas as palavras iniciadas por vogal a que se associe trans-. Vejam-se transacção, transacto, transalpino, transeunte, transido, intransigente; e comparem-se com transariano, transiberiano, transexual.

Não tenho elementos suficientes que me permitam explicar esta característica a partir da pronúncia do latim. Na base de trânsito está o elemento de formação trans e o verbo ire. Ou, se preferirmos, trans + itu (particípio passado de ire…). Ora, na pronúncia restaurada do latim, o s lê-se como o s de pensar… Nas gramáticas de latim que consultei não encontrei qualquer referência a uma excepção que abranja trans. Embora, se virmos bem, esta pronúncia seja característica de outras línguas românicas como o francês, o que favorece a colocação da hipótese de que se reporte ao latim.
Note-se que mesmo palavras em que trans parece não estar presente, como transístor, a contêm. Na verdade, esta palavra, importada do inglês, é uma amálgama de transfer resistor…  E, uma vez mais, temos presente o elemento de ligação trans (transfer, provavelmente do latim trans + fero – «levar para além de»).

Pinguim, tranquilo

As sequências -gu- e -qu- constituem dois fonemas, ou sons, distintos em muitas palavras e constituem, ao mesmo tempo, uma convenção gráfica para representar o som da consoante respectiva junto das vogais e e i.
Temos, por isso, palavras em que o u se lê, como tranquilo, pinguim, sequência, quando, quanto, quadro, quarenta, guacho, guapo, guarda, etc. e outras em se não lê, estas sempre com a vogal e ou i: aquilo, inquilino, quente, quinze, etc.

ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de LisboaISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa