É de origem segura a expressão «trabalhar como um galego», significando «escravo de trabalho» (Dicionário de Expressões Populares Portuguesas, de Guilherme Augusto Simões) ou «trabalhar muito mais do que o habitual» (Dicionário de Expressões Correntes, de Orlando Neves).
O atributo galego ocorre simultaneamente com valor positivo, para significar o trabalho árduo, estrénuo, incansável, daquele que se esforça, mas também negativo, o trabalho baseado apenas na força física, equiparável ao do animal de tração. Expressões como «anda, galego», de incitamento ao trabalho, «filho d’um galego», «parece que pariu a galega», utilizada como fórmula de espanto ou de admiração em ajuntamentos de pessoas, ou simplesmente «à galega», ou seja, à bruta ou de qualquer maneira, são exemplos dessa forte carga negativa.
Registem-se ainda as expressões «galegada» ou «galeguice», significando «grosseria», «incivilidade» ou algo de difícil compreensão por ser dito muito depressa, ou o facto de o vocábulo «labrego», no sentido de rude ou grosseiro, significar originalmente o camponês galego. Tudo expressões ou vocábulos de forte conotação pejorativa resultantes de uma antiga tradição de cariz negativo em relação aos galegos, com raízes na História.
Devido ao facto de a Galiza ser uma região rural e pobre ou como modo de fugir ao serviço militar, aliado à proximidade fronteiriça e às afinidades linguísticas, fizeram de Portugal um destino de emigração galega. Desde a Reconquista Cristã e dos primórdios da nacionalidade que há registo da presença de galegos no território português. De forma mais expressiva, porém, a partir do século XVII, favorecido pela dominação filipina, recrudescendo no início do séc. XVIII, para os meios rurais, sobretudo em ocupações sazonais ligadas à agricultura, e de forma mais permanente para as cidades, sobretudo Lisboa e Porto, que chegaram a ter significativas comunidades galegas.
Dedicavam-se às mais variadas profissões e ofícios, mas sobretudo aos trabalhos mais pesados e humildes, tais como taberneiros, carvoeiros, moços de fretes, amoladores, proprietários de casas de pasto e de hospedarias. É, no entanto, a profissão de aguadeiro aquela que, até ao início do séc. XX e à introdução da água canalizada, mais se associa aos galegos. Os aguadeiros eram licenciados pelo município e estavam organizados em companhias. Percorriam as cidades de Lisboa e Porto vendendo, de forma «avulsa» ou «por assinatura», a água que carregavam em barris e de que se abasteciam nos chafarizes e fontanários públicos em bicas que lhes estavam destinadas. Em Lisboa, os panos brancos nas janelas sinalizavam a necessidade de água, que eles transportavam até às cozinhas das casas, vazando-a nos potes de barro colocados nos poiais. Cabia-lhes também, por inerência, o combate aos incêndios. Nos séc. XVIII e XIX, os aguadeiros galegos eram olhados pela população de Lisboa como cobrando excessivamente pela água, havendo mesmo legislação a estabelecer limites de preço, e pelo facto de acorrerem aos incêndios recebendo por isso, sendo vistos como gente que lucrava com os infortúnios.
A própria informalidade do mercado de mão de obra galega em muitas daquelas profissões, em que as transações eram feitas no momento, de forma arbitrária e muitas vezes de acordo com a cara e a necessidade do cliente, podem ter criado a ideia do galego como pessoa pouco confiável. Mas desde pelo menos o séc. XIV que há registo, em documentação escrita, de referências pejorativas em relação aos galegos, estereótipos que a literatura, a literatura de cordel e depois a caricatura consagraram e amplificaram. Eram vistos como aforradores que, lucrando em Portugal, levavam o que amealhavam para a Galiza. E criticava-se-lhes a forma rústica de vestir, de falar e a rudeza dos modos.
Apesar de o português provir do galego, com a diferenciação linguística, a língua e a modo de falar galegos vão sendo, sobretudo a partir do séc. XVI, percecionados e julgados pelos portugueses como arcaicos e provincianos. É possível que esteja em todo este constructo de séculos, ligado a estes estereótipos, a origem da expressão que refere – «És mesmo um galego» – no sentido de «pessoa pouco confiável» e também de pessoa grosseira ou rude. Há ainda residualmente, e «a contrario sensu», a expressão galego associada à indolência e à paciência, o que se radica na venda, em grande parte a cargo dos galegos, dos fósforos, inicialmente feitos de enxofre e que tinham de ser mergulhados em ácido sulfúrico. A demora do processo fez com que os fósforos de enxofre ficassem conhecidos por «fósforos de espera-galego» ou simplesmente «espera-galegos».
De salientar, por último, que, por antonomásia, o uso depreciativo de «galego» se generalizou no sul de Portugal aos naturais do Norte e mesmo das Beiras, e no Brasil aos portugueses, e, entre 1835 e 1845, no Rio Grande do Sul, na chamada Guerra dos Farrapos ou Revolução Farroupilha, aos partidários do imperador, cujo partido os republicanos apodaram de Galegada.