A primeira dificuldade que sinto é em delimitar a sua questão. Com efeito, a assumir como certa a sua transcrição do poema, as duas últimas estrofes são
o dístico:
Que haverá de comum entre nós?»
e o monóstico (ou verso isolado):
Em outras representações a situação não melhora, pois o dístico transforma-se em dois monósticos…
Que haverá de comum entre nós?»
A segunda dificuldade advém da característica do texto. Como posso indicar o significado, que se pretende único, de um texto poético que é, por natureza, plural? Analisemos, ainda assim, o excerto:
Que haverá de comum entre nós?
Um ponto, no infinito.»
Ele é composto por uma pergunta e uma resposta.
Na pergunta, interroga-se o poeta acerca do que haverá de comum entre ele (e, por ele, em cada homem, em todos os homens) e o seu antípoda, ou seja, aquele que vive exactamente num lugar diametralmente oposto.
Como resposta, é-nos dito que o que une todos os homens (tal como a ele poeta e ao seu antípoda) é um ponto que pode ser interpretado como a própria Terra, que, numa perspectiva cósmica, será isso mesmo: um ponto, um pontinho só, no infinito.
Há ainda a hipótese de se referir ao excerto que segue, composto por uma sextilha e pelos restantes versos:
E as naturezas.
A cor da pele, a altura, a envergadura,
As mãos, os pés, as bocas, os narizes,
A maneira de olhar, o modo de sorrir,
Os tiques, as manias, as línguas, as certezas.
Tudo.
Afinal
Que haverá de comum entre nós?
Um ponto, no infinito.»
Se a sua dúvida recai sobre este excerto, poderemos dizer que no primeiro verso da sextilha se faz uma afirmação, que é explanada, pormenorizada, no resto da estrofe, para ser confirmada no monóstico «Tudo». E a este tudo que separa os homens opõe-se, tão-somente, um elemento comum, o ponto no universo, que, na sua pequenez (real à escala cósmica, mas não sentida como tal à escala humana), se contrapõe ao grande número de diferenças.
E, dessa forma, o poeta retira toda a força ao valor centrífugo, ou separador, das diferenças entre os homens, para valorizar, pela {#parcimónia|parcimônia} da escrita, o que os une.