A análise sintáctica que faz da frase está de acordo com o que se prevê na nova terminologia linguística em aplicação em Portugal. Com efeito, aí adopta-se para o predicado um comportamento que era já comum relativamente ao sujeito, ou seja, incluem-se no predicado todos os elementos, essenciais ou acessórios, que se liguem ao verbo, da mesma forma que sempre se ligaram ao sujeito os elementos associados ao nome que lhe serve de núcleo.
Quanto ao valor semântico dos modificadores, poderá ser introduzido, se isso facilitar a compreensão dos alunos. Mas importa clarificar, muito bem, que estamos a trabalhar em níveis de análise distintos. Do ponto de vista sintáctico trata-se, tão-somente, de modificadores. Se lhes atribuímos valores, ou sentidos, estamos a associar dois níveis de análise e poderemos correr o risco de os nossos alunos não interiorizarem a existência desses dois níveis distintos. Assim, proponho-lhe que, quando associar os dois tipos de classificação, o refira expressamente, dizendo, por exemplo, que se trata de um modificador com valor semântico de tempo, etc.
Nota da consultora (3/12/2016) – A resposta em apreço mostra algo que será relevante no dia em que alguém se propuser estudar o impacto dos primeiros tempos da TLEBS (Terminologia Linguística para os Ensinos Básico e Secundário), publicada pela Portaria 1488/2004, de 24 de dezembro.
Durante o ano de 2005 e grande parte do ano de 2006, até à conferência que ocorreu na Fundação Calouste Gulbenkian (Lisboa) no final de setembro de 2006, a, então, TLEBS, não mereceu uma linha de detratores ou defensores.
O Ciberdúvidas era, tínhamos consciência disso, um dos poucos espaços a que os professores podiam recorrer para tirar dúvidas.
Recordo a preocupação de então, julgando que a língua portuguesa estava muito doente, pois um documento da natureza da TLEBS não desencadeava reações…
Só após a conferência de setembro de 2006 começaram a surgir artigos contra ou a favor. Só em abril de 2007, pela Portaria 476/2007, de 18 de abril, a tutela decide que importa alterar a Terminologia, ou investigar mais sobre ela. Só em 2008 a TLEBS se transforma em Dicionário Terminológico, sem que tal facto dê origem a documento legal de suporte. Deu, todavia, lugar à disponibilização, em linha, do Dicionário Terminológico, só muito depois passado, mais ou menos discretamente, a outro suporte…
Centrando-nos na resposta dada, reitero que «ontem» independentemente do espaço visível que ocupa na frase, é um modificador do grupo verbal. Os modificadores de frase têm características sintático-semânticas muito específicas. Do ponto de vista semântico, têm um valor avaliativo, ou modalizador, como em:
1. Provavelmente, o João deu-lhe o livro no café.
O modificador do grupo verbal pode ser interrogado:
2. Foi ontem que o João lhe deu o livro no café?
O modificador de frase não:
3. *Foi provavelmente que o João lhe deu o livro no café?
Este e outros testes são referidos Gramática da Língua Portuguesa, de Mira Mateus e outras, p.431.
Tanto o modificador de frase como o modificador do grupo verbal podem deslocar-se na frase:
4. a. Ontem, o João deu-lhe o livro no café.
b. O João, ontem, deu-lhe o livro no café.
5. a. Provavelmente, o João deu-lhe o livro no café.
b. O João, provavelmente, deu-lhe o livro no café.