O novo acordo ortográfico (AO) procura dar alguma uniformização à ortografia; não unifica a língua, pois aceita semântica e sintaxe diferentes nas diversas comunidades linguísticas. Até mesmo na ortografia, torna, no universo da língua, legais grafias diferentes, com o mesmo significado e função.
Quanto ao gerúndio, o Brasil não vai ser obrigado a mudar os seus hábitos linguísticos. Não há nada no novo AO que o prescreva. Nem isso fazia sentido, pois esses hábitos de uso do gerúndio são até dialectais em Portugal.
No que se refere aos termos: recepção, decepção, aspecto, óptica, o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, português do Brasil (VOLP PB), publicado pela Academia Brasileira de Letras (ABL), regista efectivamente todas estas grafias, mas só com dupla em aspecto/aspeto. Distingue óptica, ciência da visão, de ótica, ciência da audição. Isto é, não tem “receção” nem “deceção”, que provavelmente serão adoptadas em Portugal. Creio que quanto a óptica, prevalecerá o bom senso em Portugal, de manter também o p, mudo na ciência da visão.
Enquanto o novo AO não estiver em vigor em Portugal, a grafia oficial é a de 1945 e suplementos posteriores. "Quem escrever agora com os termos diferentes do novo AO" está oficialmente a grafar com erros ortográficos, se não prevenir que o faz intencionalmente.
Mesmo quando o novo AO estiver em vigor, durante o período da moratória continua a ser válida também a grafia de 1945. Acabada a moratória (foi de seis anos), será conveniente usarem-se em Portugal as grafias do Acordo de 1990 que forem recomendadas para o nosso país, até haver um dicionário comum para toda a lusofonia. Logo que haja este dicionário, até os saudosistas poderão legalmente voltar a escrever, por exemplo, recepção, decepção, concepção (embora nestas palavras a consoante p desapareça para Portugal). E eu poderei usar algumas das soluções brasileiras, que considero preferíveis (ex., que tenho citado: toalete, hifens, estresse, Iugoslávia, etc.). Vice-versa para os brasileiros.
Mas antes de podermos sonhar com essa uniformização na língua, é pelo menos indispensável que, ao menos, tenhamos urgentemente um VOLP PE (português europeu), para que não corramos o risco de o vocabulário comum da lusofonia passar a ser o VOLP PB.
A esta impressionante 5.ª edição da ABL em 2009, só temos entre nós, a contrapor, como lei na língua, um vocabulário resumido em 1970, pois o mais completo data de 1940. Temos de reconhecer que tem havido (desde essa década...) uma indiferença revoltante dos nossos governantes também pela língua, um dos valores nacionais.