DÚVIDAS

«Declinar os motivos» (termo jurídidco brasileiro)

Estou estudando para concursos públicos e, ao estudar Direito Administrativo, a respeito do assunto Teoria dos Motivos Determinantes, deparei-me com a seguinte oração em uma questão de simulado enviada por colegas:

«Ocorre a aplicação da teoria dos motivos determinantes, quando o administrador declina os motivos que levaram à prática do ato administrativo, vinculando, dessa forma, os motivos à efetiva existência fática dos mesmos.»

Busquei no meu Aurélio de bolso a definição do verbo declinar e encontrei:

«Recusar, baixar, desviar-se do rumo, descer, descair, enunciar as flexões (de nomes e pronomes)» e surgiu a dúvida: Será que o uso nesta frase está correto?

Não, seguramente, como sinônimo de «declarar, mencionar, expressar», que é como se encaixaria na oração.

Possuo um livro que usa o verbo declarar em frase muito semelhante:

«Segundo a Teoria dos Motivos Determinantes, quando a Administração declara o motivo que determinou a prática de um ato discricionário que, em princípio, prescindiria de motivação expressa, fica vinculada à existência do motivo por ela, Administração, declarado.»

(Direito Administrativo Descomplicado).

Esta oração com o verbo declinar é muito comum na web — Achei várias entradas no Google, por isso surgiu a dúvida. Será que estou enganada, ou é possível que um erro de digitação ou ortografia tenha se espalhado mesmo na Internet?

Antecipadamente agradeço pelo esclarecimento.

Resposta

Na linguagem jurídica brasileira, a expressão «declinar os motivos» significa «enunciar os motivos». Tal acepção está registada no Dicionário Novo Aurélio Século XXI: 15. e 23. enunciar ou revelar, nomear. Esta palavra também é usada em contexto gramatical com o significado de «enunciar as flexões de nomes, pronomes ou adjectivos»: repare-se que a palavra declinar é da mesma família de declinações (em latim, em grego ou em alemão, por exemplo), ou seja, a enunciação de todos os casos de uma palavra.

Assim, na frase apresentada, o termo declinar significa, sim, «enunciar, declarar».

A finalizar, transcrevem-se excertos de dois textos sobre o assunto em causa, para uma melhor compreensão do mesmo.

1. Aqui, pode ler-se a passagem que se segue, da autoria do prof. Alírio de Oliveira Ramos, do Curso de Administração da Faculdade Unicerto:

«A motivação dos atos administrativos vem se impondo dia a dia, como uma exigência do Direito Público e da legalidade governamental. Pela motivação, o administrador público justifica sua ação administrativa, indicando os fatos (pressupostos de fato) que ensejam o ato e os preceitos jurídicos (pressupostos de direito) que autorizam sua prática. A Teoria dos Motivos Determinantes funda-se na consideração de que os atos administrativos, quando tiverem sua prática motivada, ficam vinculados aos motivos expostos, para todos os efeitos jurídicos.»

2. Na edição n.º 2 de 2003 – Ano XXI, da Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, num artigo de Emerson Garcia intitulado «A moralidade administrativa e sua densificação», capítulo 6.4., pode ler-se a seguinte passagem:

«Afigura-se induvidoso que os atos administrativos devem apresentar plena adequação ao sistema normativo que os disciplina e ter sua finalidade sempre voltada à consecução do interesse público. A partir da presença de determinada situação fática, deve o agente público, nos limites de sua competência, praticar o ato administrativo que se ajuste à hipótese. Este ajustamento, por sua vez, deve ser por ele demonstrado com a exteriorização dos motivos que o levaram a praticar o ato,  o qual deve necessariamente visar a uma finalidade pública.

Não obstante presentes os elementos do acto (competência, finalidade, forma, motivo e objeto) e a plena compatibilidade entre eles e a lei, em muitos casos será vislumbrada a inadequação dos motivos declinados e da finalidade almejada com a realidade fática e o verdadeiro elemento volitivo do agente.

Para que o ato praticado em consonância com a lei esteja em conformidade com a moralidade administrativa, é imprescindível que haja uma relação harmônica entre a situação fática, a intenção do agente e o ato praticado, sendo analisadas no contexto deste a motivação declinada e a finalidade almejada.»

ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de LisboaISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa