Nas consultas efetuadas, não encontrámos uma tipologia que trate a diferença entre «história de encantar» e «conto de fadas». Aliás em diversos textos, o conto de fadas é descrito como um género que pode incluir elementos de encantamento, tanto no sentido de produzir maravilha como no de incluir elementos mágicos.
Não obstante, Michelle Simonsen, na sua obra Le conte populaire (Paris: PUF, 1984) propõe a seguinte tipologia:
i. Contos maravilhosos: agrupa os contos de fadas e os seus antinómicos, as bruxas, as feiticeiras, os ogres.
ii. Contos de animais: colocam em cena animais como únicos protagonistas, ou como protagonistas principais.
iii. Contos etiológicos: dão explicações sobre a origem ou causa de determinados fenómenos ligados à natureza, sem preocupação de veracidade («A lua e o sol», «Os três rios»).
iv. Contos faceciosos: contos para rir, em que a paleta do riso se pode alimentar de várias fontes – denúncia, vingança, troça, um piscar de olhos, sorriso.
v. Contos morais ou filosóficos: pretendem que se extraia deles uma lição ou uma reflexão sobre o homem e o mundo.
vi. Contos acumulativos ou de repetição: histórias de encadeamento, como «A formiga e a neve».
vii. Contos de mentira: podem assumir duas variantes – a história ser em si uma mentira ou a mentira constituir um recurso actancial importante.
A autora alerta ainda para o facto de diferentes contos poderem pertencente a diferentes categorias ou a mais do que uma em simultâneo.
Posição muito divulgada parece ser a de que os contos de fadas são, portanto, um tipo de contos do maravilhoso, categoria que pode incluir também alguns contos populares ou as fábulas, por exemplo.
Carlos Ceia, no E-Dicionário de Termos Literários, define deste modo «conto de fadas»: «o termo engloba uma variedade de narrativas, sobretudo histórias que por regra possuem elementos "atemporais" e que normalmente recorrem a heróis (ou heroínas) quase sempre jovens, corajosos e habilidosos que passam por aventuras estranhas, por vezes mágicas, que lhes servem de teste para um eventual destino feliz, e madrastas malévolas (ou padrastos) cuja função é dificultar‑lhes a vida ao longo da narrativa. Toda a história se desenrola no sentido de demonstrar um princípio moral que ou aparece em apêndice (como no caso dos contos de Perrault) ou é construído ao longo do texto (como no caso dos contos de Grimm). Exemplos de histórias como estas encontram‑se em muitos países. Apesar das suas características ditas "universais", o conto de fadas tem sofrido alterações ao longo do tempo, de acordo com os gostos conscientes ou inconscientes de cada geração. Tal como o mito, também o conto de fadas apresenta seres e acontecimentos extraordinários, mas, em contrapartida e tal como a fábula, tende a desenrolar‑se num cenário temporal e geograficamente vago, iniciando‑se e terminando quase sempre da mesma forma: "Era uma vez…" e "Viveram felizes para sempre." Entre os muitos exemplos destacam‑se; "A Cinderela"; "A Branca de Neve e os Sete Anões"; "A Bela Adormecida"; "O Capuchinho Vermelho"; "João e o Feijoeiro Gigante", etc.»
Como se pode observar, o autor, para além dos contos de fadas, considera géneros como o mito ou as fábulas, mas não faz referência a «contos de encantar»1 como género literário.
Uma vez que o verbo encantar remete para sentidos relacionados com a magia, o feitiço, com o “ficar sob o efeito do maravilhoso, do mágico” (cf. Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea), poderemos aventar a hipótese de que a expressão «contos de encantar» seja utilizada com um sentido próximo do de «contos maravilhosos».
Em nome do Ciberdúvidas, agradeço e retribuo os votos de bom verão.
1. Preferimos aqui usar a designação «contos de encantar» em vez de «histórias de encantar» porque, a ser considerado, tratar-se-ia de um subgénero de conto.