DÚVIDAS

Complemento oblíquo: «envolver-se numa guerra com alguém»

Como analisariam sintacticamente a frase «Ela envolveu-se numa guerra com a mãe»?

Ela — sujeito

envolveu-se — predicado verbal

numa guerra — complemento directo

Com a mãe — ????????

Supostamente seria complemento circunstancial de companhia, mas neste caso não possui lógica tê-lo, pois, se se envolveu numa guerra com a mãe, a mãe não seria "boa companhia".

Como resolveriam esta situação?

Agradeço a atenção dispensada.

Resposta

1. Comparemos as construções do grupo A com as do grupo B:

Grupo A

dar beijos = beijar
dar ajuda = ajudar
fazer a apresentação de = apresentar
fazer a síntese = sintetizar
fazer a barba = barbear-se
pôr em risco = arriscar
pôr em evidência = evidenciar
ter em consideração = considerar
tirar fotografias = fotografar

Grupo B

entrar em guerra contra = guerrear
fazer guerra a = idem
envolver-se em guerra com = idem

Desta confrontação é possível afirmar que o verbo envolver-se funciona como verbo-suporte, tal como dar, fazer, pôr, ter, tirar, nos exemplos acima.

O verbo-suporte caracteriza-se por apresentar um conteúdo semântico t{#é|ê}nue (alguns autores falam de «esvaziamento semântico») e mantêm as propriedades de flexão e de concordância. O nome que se lhe segue não integra nenhum complemento do verbo, antes forma com ele um predicado complexo.

2. «com a mãe» é complemento oblíquo: é um constituinte exigido pelo verbo, realizado por um sintagma preposicional que não é substituível por lhe(s) (fa{#c|}tor que o distingue do complemento indire{#c|}to).

3. A classificação complemento circunstancial foi abandonada pela TLEBS/Dicionário Terminológico justamente porque se trata de uma classificação insuficiente: não distingue os constituintes do predicado que são obrigatórios dos que são opcionais. Acresce que a subclassificação dos complementos circunstanciais é uma classificação semântica e uma interpretação mais apressada pode induzir em erro. Note-se, a propósito, que, em «com a mãe», a preposição com pode comutar com contra, logo nunca teríamos aí um complemento circunstancial de companhia.

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