Há muito que dizer sobre a colocação dos pronomes. Basta lembrarmo-nos de que Cândido de Figueiredo escreveu um livro de 388 páginas, intitulado «O Problema da Colocação de Pronomes». O melhor seria enviar-nos algumas frases em que haja dúvidas para nos pronunciarmos sobre o assunto. A esta matéria pertence também a colocação da palavra (ou partícula) apassivante, ou apassivadora, se como vemos em: Aqui vendem-se livros, em que vendem-se equivale a são vendidos.
Não há regras rígidas sobre este assunto. Pôr o pronome aqui ou acolá depende não raro do estilo, em que entra o grau de beleza de tal ou tal colocação do pronome, o poder enfático do pronome e outras particularidades.
Suponhamos, então, as seguintes frases:
(1) Ele deve manter-se sem medo.
(2) Ele deve-se manter sem medo.
Ambas as frases estão certas, mas não é indiferente empregar uma ou outra.
Há, porém, quem ensine erradamente que a frase correcta é a (1) e não a (2). E argumentam, dizendo: o pronome se não pertence a deve, mas sim a manter. Por isso, devemo-lo colocar ligado a manter e não a deve.
De facto, o pronome se está ligado a manter, e continuará a pertencer-lhe, seja qual for o ponto da frase em que o coloquemos. Mas a frase por que devemos optar é a (2) e não a (1). Vejamos porquê:
a) A frase (2) é mais rítmica. Tem ritmo do princípio ao fim. Soa melhor. Por isso é mais bela. Na frase (1), quebra-se o ritmo logo que terminamos a pronúncia de manter.
b) A frase (1) tem o inconveniente da aliteração desagradável ao ouvido em «se sem».
Mais ainda: na frase (2), o pronome se recuou. Mas se introduzirmos uma palavra entre «Ele» e «deve», o pronome ainda recua mais:
(3) Ele não se deve manter sem medo.
A língua (e a linguagem) não é só para ser compreendida. É também para ser sentida. Mas há pessoas tão afastadas do correcto, que já não são capazes de a sentir na sua perfeição. Quem souber sentir a língua/linguagem sabe onde deve colocar os pronomes.
Quem seguir a tal doutrina errada referente à frase (1), certamente condena a seguinte, porque o verbo passear encontra-se o mais afastado possível da forma verbal «foi», à qual se encontra ligado:
(4) O João foi com a mulher ao jardim passear ontem à tarde.
Os nossos meios de comunicação, Rádio, TV e jornais, não raro escolhem a posição menos conveniente do se pronome e partícula apassivante. Eis algumas frases extraídas dos jornais:
a) Para a educação (...) se precisa duma senhora (...).
b) (...) é uma dúvida a que poderá-se responder (...)
c) Na capital andaluza se afirma o pacto em 1942.
d) Desta forma pode dizer-se que (...)
e) Tem-se de pôr fim a esta anomalia.