De uma forma geral, e acordo com Celso Luft, ambas as regências são possíveis1. Para o demonstrar, são apresentados exemplos como:
(1) «Havia no quarto um cheiro a bafio» (Ramalho2)
(2) «Cheiro de couro» (poema de Drummond, NR, 7423).
Não obstante, o autor considera uma situação particular: não se pode usar a preposição a na expressão «cheiro de santidade». Para fundamentar esta situação, apresenta como exemplo:
(3) «justas e sofredoras, que morreram em cheiro de santidade” (Antero de Figueiredo: Fernandes4)
Pode verificar-se, no entanto, uma muito ligeira diferença de sentidos entre o uso de uma ou outra preposição. Assim, se compararmos as expressões (4) e (5), verificamos que a expressão (4) significa «o cheiro que as flores têm/emanam», enquanto a expressão (5) significa «o odor que alguém sentiu e interpretou como sendo de flores»
(4) «cheiro de flores»
(5) «cheiro a flores»
Assim, em certas condições e neste âmbito, a preposição de pode especializar-se no sentido de indicar a origem ou a fonte5.
Não obstante, refira-se também que com nomes deverbais (como é o caso de cheiro, que se forma a partir de cheirar), a nominalização do verbo associa-se frequentemente a uma construção em que o complemento nominal corresponde ao complemento direto do verbo, como acontece em (6)
(6) «a crítica ao livro» = «alguém criticou o livro»
Nestas situações, como afirmam Brito e Raposo, «existem nominalizações ativas com nomes deverbais correspondendo a verbos transitivos nas quais o complemento direto é introduzido não pela preposição canónica de, mas pela preposição a»6. Esta é a situação verificada com o nome cheiro, que, quando nominalizado, poderá ter tendência a optar preferencialmente pela preposição a para introduzir o seu complemento.
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1. Celso Luft , Dicionário Prático de Regência Nominal. Editora Ática, p. 97
2. Enio Ramalho, Dicionário estrutural, estilístico e sintático da língua portuguesa. Porto, Lello & Irmão, 1985.
3. Carlos Drummond de Andrade, Nova reunião; 19 livros de poesia. Rio de Janeiro, J. Olympio, 1983. 2 v.
4. Francisco Fernandes, Dicionário de regimes de substantivos e adjetivos. 5 ed Porto Alegre, Globo, 1955.
5. Raposo e Xavier in Raposo et. al, Gramática do Português. p. 1548.
6. Idem, ibid., p. 1055.