Transcrevo dois extratos tirados, respectivamente, de um blogue jornalístico e de uma tese de doutorado em literatura. Os dois confirmam a origem da primeira expressão, bem como a informação que já me era familiar.
«Qualquer um com mais de 40 anos, mesmo não sendo fã do Nelson Rodrigues, já deve ter ouvido a expressão: “até aí, morreu o Neves”. A idéia é que, embora a morte do Neves seja um fato grave (alguém morreu), como ele representa apenas um ilustre desconhecido sem qualquer relação com os interlocutores, o fato não traz qualquer implicação maior e pode ser ignorado.
Ainda que a expressão em si já esteja em desuso, a atitude não poderia estar mais em voga.»
In: http://arguta.blogspot.com/2006/04/expresses-brasileiras-1-at-morreu-o.html
«Nelson não apenas se apropria de palavras e expressões corriqueiras, mas as incorpora tão insistentemente a seus diálogos, que elas passam a ser identificadas com o autor. Citem-se algumas palavras e expressões prediletas de seu repertório:
“batata”, “espeto”, “meus pára-choques”, “os colarinhos”, “chispa”, “sossega o periquito” (com variações com “sossega, leoa”), “nossa amizade”, “toca o bonde” (com a variante: “tomou o bonde errado”), “até aí morreu o Neves”, “lamba os dedos”, “desinfeta”, “algum 127 bode?”. Há ainda os estrangerismos: “big”, “cáspite”, “flirt”, “bye”, “so long”, “darling”, “merci”, “mon cherri”. O autor também cria expressões e designações neológicas: “arrancos de cachorro atropelado”, “um elenco de Cecil B. DeMille”, “lagartixa profissional”, “óbvio ululante”, “barítono de igreja”, “V-8”, “Drácula de Madureira”, “Crioula das Narinas Triunfais”, “ex-contínuo”.
À exceção dos dados que estão especificamente relacionados à trama de um drama específico, essas expressões neológicas seriam repetidas e empregadas pelo autor em seus contos e crônicas.
Algumas nasceram mesmo nas crônicas e contos e migraram posteriormente para as peças. Outras fizeram o caminho inverso. O emprego repetido de algumas dessas expressões cria um grau de previsibilidade e de redundância nos textos do escritor, o que é um fator que estabelece empatia com o leitor/ouvinte.
Certamente esse foi um dos elementos que fizeram haver uma identificação do público com os dramas desse período do autor. Pode-se dizer que um dos fatores que levaram as tragédias cariocas de Nelson Rodrigues a gozarem de enorme popularidade, o que contrastou com outros de seus trabalhos dramatúrgicos anteriores, foi o impacto e o gosto que o público nutria por sua linguagem popularesca.»
In: Nelson Rodrigues: Inventário Ilustrado e Recepção Crítica Comentada dos Escritos do Anjo Pornográfico, por Marcos Francisco Pedrosa Sá Freire de Souza, Tese de Doutorado, 2006, UFRJ, Rio de Janeiro,http://www.letras.ufrj.br/ciencialit/trabalhos/marcosfrancisco_inventario.pdf
Numa mensagem de e-mail, um colega da PUC-Rio (Roberto Werneck, natural de Curitiba) explica: «Esta do Neves ouvi várias vezes e sempre achei que tivesse origem no Nelson Rodrigues, sobre a morte de algum desconhecido.»
Quanto à segunda expressão, francamente é desconhecida, não só de mim, mas de todos os professores da área que consultei. Talvez seja de uso restrito de um grupo ou mesmo de uma família. A língua tem dessas coisas, há expressões que alguém inventa e depois todos os elementos de uma família ou grupo de amigos reproduzem-na como se de uso generalizado fosse.