DÚVIDAS

A supressão de para (orações adverbiais finais)

Tenho percebido que, ao menos no português brasileiro, as orações subordinadas adverbiais finais introduzidas pela preposição para permitem a supressão dessa preposição quando o verbo ir é o verbo principal (não auxiliar) da oração principal ao mesmo tempo que ambas as orações compartilham o mesmo sujeito. Portanto:

«Eu vou para casa para dormir.»/«Eu vou para casa dormir.»

«Ele vai cantar para deixá-la feliz.»/*«Ele vai cantar deixá-la feliz.»

«João vai ao Rio para ver Maria.»/«João vai ao Rio ver Maria.»

«João vai ao Rio para Maria vê-lo.»/*«João vai ao Rio Maria vê-lo.»

Minha dúvida é se tal fenômeno ocorre no português europeu e se essa é uma construção da norma culta.

Resposta

É uma construção que ocorre nas normas cultas dos dois lados do Atlântico. O gramático brasileiro Evanildo Bechara refere-se a este caso nos seguintes termos:

O infinitivo das orações finais pode aparecer sem preposição: "Diz-se que ele era um dos doze que foram à Inglaterra pelejar (= para pelejar) em desagravo das damas inglesas, fato assaz curioso... [...]

Construções deste tipo, aproximando-se o infinitivo do verbo principal anterior (foram pelejar), permitiriam um início de loução verbal, onde o 1.º verbo passaria a ser sentido como auxiliar modal denotador de movimento para realizar um intendo futuro. Este histórico importa para a explicação do emprego antigo da preposição a, no termo adverbial de lugar. Em O rio Amazonas vai desaguar ao Atlântico, temos ainda vestígio da fase em que o sentimento linguístico levava em consideração o verbo de movimento, vai desaguar (= para desaguar). Perdida esta noção de movimento, vai ao Atlântico desaguar passou a ser interpretado como um todo, prevalecendo a regência que competia ao verbo desaguar: vai desaguar no Atlântico.

Ambas as construções são corretas, tendo sido esta última, sem razão, recriminada por certos gramáticos [...].

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