São de Sérgio Luís de Carvalho (Nas Bocas do Mundo, Lisboa, Planeta, 2010, pág. 104) os seguintes apontamentos:
«Ir tirar a mãe da forca»
A forma da expressão costuma ser «ir tirar o pai da forca», a qual «[...] se aplica a uma tarefa urgente e que se deve desempenhar com celeridade. De acordo com a hagiografia, Santo António tirou, de facto o pai da forca. Assim, Santo António estaria a pregar em Pádua, em 1227, quando sentiu que alguém o chamava, desesperado, em Lisboa; de imediato, o santo cobriu a cabeça em profunda meditação e deu por si em Lisboa, onde o seu pai tinha sido injustamente condenado por homicídio. Ressuscitado e questionado pelo santo, o homem assassinado afirmou a inocência do pai de Santo António. Desse modo foi o inocente libertado, enquanto em Pádua todos garantiram que o santo se mantivera no mesmo sítio, em silêncio e reflexão profundas durante várias horas. Fora tirar o pai da forca...
«Da cor de burro quando foge»
«[...] designa uma cor incaracterística, vagamente desagradável e insípida. Há uma tese para explicar esta expressão (que, em rigor, como tantas outras, não se sabe bem quando surgiu). Assim, a frase seria uma corrupção de um provérbio antigo que recomendava "Corra do burro quando foge", numa clara recomendação para evitar burros quando estes se enraiveciam. A corruptela do provérbio deu origem a um tipo de cor... que não existe.»
Sobre «da cor de burro quando foge» , deve observar-se que a ocorrência da palavra burro na expressão pode remeter efectivamente para uma cor. É que o sugere Vasco Botelho do Amaral, no Grande Dicionário de Dificuldades e Subtilezas do Idioma Português (pág. 686):
«O burro envolve problema de cor. Parece na verdade que o nome do animal veio da sua cor ruiva, porquanto em latim burrus significa ruivo, sendo asinus o asno.
Surgem na loquela, às vezes, picarescas expressões de colorido irónico, qual este assim — cor de burro quando foge.»
No contexto desta pista, o consulente Pedro Múrias (Lisboa, Portugal) enviou a seguinte sugestão:
«[...] não será mais plausível pensar que "cor de burro" seja expressão antiga
ligada ao facto de burrus, em latim, querer dizer "ruço" ou "avermelhado (por causa da bebida)". Isto, independentemente de burro ter ou não como étimo aquele termo latino, questão que os dicionários não dão por assente. É curioso, aliás, que "ruço" seja termo comummente aplicado a equídeos, inclusive a burros.
Ora, se se admitisse esta origem de "cor de burro", seria fácil explicar a expressão actual, "cor de burro quando foge", como variação humorística posterior à perda de consciência de que "burro", na expressão original, designava efectivamente uma cor.»
Concordo com o consulente, porque é possível que a sequência final da expressão, «quando foge», tenha sido realmente criada como aproveitamento jocoso de uma expressão mais curta, «cor de burro», acerca da qual se tinha perdido a noção de se tratar de referência a cor. A hipótese é, portanto, plausível — mas, infelizmente, não tenho acesso a dados histórico-linguísticos que a confirmem.