Susana Ramos - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Susana Ramos
Susana Ramos
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Licenciada em Estudos Clássicos pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e pós-graduada em Ensino do PLE/L2 pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Foi docente de Português L2/LE no Instituto Camões em Paris entre 2009 e 2010 e professora estagiária de PLE/L2 na Faculdade de Letras da Universidade do Porto entre 2010 e 2011.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Gostaria que me ajudassem no seguinte: na frase «vou fazê-lo», escrevo com ou sem acento circunflexo?

Obrigado.

Resposta:

A frase «vou fazê-lo» está correta.

Quando a forma verbal termina em -r, -s ou -z, os pronomes pessoais o, a, os, as ligados ao verbo por hífen tomam a forma -lo, -la, -los, -las, fazendo com que aquelas consoantes desapareçam: «quero fazer o bolo» → «quero fazê-lo; «fazias a sopa» → «fazia-la»; «faz o pão» → «fá-lo». Se tais formas verbais forem agudas, ou seja, se se tratar de infinitivos (geralmente só os da 1.ª e 2.ª conjugações, como provar e fazer, respetivamente) ou formas monossilábicas (faz, traz, fez), a ortografia determina que a vogal da sílaba tónica (a sílaba final) tenha acento gráfico, se for a ou e: prová-lo, fá-lo, trá-lo, fazê-lo, fê-lo.

Deste modo, os infinitivos da 1.ª conjugação (p. ex.: lavar), quando seguidos das formas pronominais já indicadas, têm sempre acento agudo no a da sílaba final (como acontece coma as formas monissilábicas: fá-lo).

Pergunta:

Como se chamam os sumários que, nalguns livros, antecedem as narrativas dos vários capítulos? Uns são bastante curtos («Em que a donzela vai prosseguindo sua história», Menina e Moça, cap. II), outros mais esclarecedores («De como o autor (...) se resolveu a viajar na sua terra (...). Parte para Santarém. Chega ao Terreiro do Paço, embarca no vapor de Vila Nova (...). A Dedução Cronológica e a Baixa de Lisboa. Lord Byron e um bom charuto. Travam-se de razões os Ílhavos e os Bordas-de-água (...)», Viagens na Minha Terra, cap. I). Isto implica designações diferentes?

Obrigado.

Resposta:

Não encontramos registo ou atestação do termo que designa os sumários referidos pelo consulente. Deste modo, parece legítimo o uso da própria palavra sumário com esse significado.

Note-se que estes sumários não devem ser confundidos com as epígrafes. Estas são as citações, fragmentos de frase, sentenças, máximas ou divisas antepostas no início de um livro ou capítulo. O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa define epígrafe como o «título ou frase que, colocados no início de um livro, um capítulo, um poema etc., servem de tema ao assunto ou para resumir o sentido ou situar a motivação da obra; se for uma citação, também é considerado epígrafe».

Nota: Segundo a definição dada por Carlos Reis e Ana Cristina M. Lopes, no Dicionário de Narratologia, pp. 124 e 125 (Edições Almedina, 2007), a epígrafe (do gr. epi-, «sobre», «por cima de»; graphein, «escrever») «é um texto, normalmente de curta extensão, inscrito antes de se iniciar a narrativa propriamente dita, uma das suas partes ou um dos seus capítulos». Tanto pode ser de autoria de outrem como do autor do relato que ela antecede.

Não constituindo uma prática exclusiva do modo narrativo, temos dois tipos de epígrafes:

– a alógrafa, que recorre habitualmente a textos ou fragmentos de textos de reconhecida autoridade; exemplo:

«Pois que fez Santo António? Mudou somente

o púlpito ...

Pergunta:

Uma das minhas maiores dificuldades, fruto de uma aprendizagem fora de Portugal, é saber quando devo utilizar o em ou am anexados às palavras. Por exemplo: "Despach(am/em)-se"; "Com(am/em)"; "Respond(am/em)".

Há múltiplos casos em que fico na dúvida; outros consigo perceber pelo senso comum.

Há alguma forma/regra para saber quando é que devo (ou não devo) utilizar determinada forma?

Obrigado.

Resposta:

No presente do indicativo, os verbos de tema em a (ou seja, os acabados em -ar, no infinitivo; p. ex., cantar) ficam com a desinência -am- na 3.ª pessoa do plural:

(1) «Eles gostam do filme.»

Ainda em relação ao presente do indicativo, os verbos de tema em -e- e -i- (isto é, os que, no infinitivo, acabam em -er e -ir; p. ex., comer, partir) apresentam -em:

(2) «Os filhos comem tudo.»

(3) «Eles partem agora.»

No presente do conjuntivo, os verbos de tema em -a- passam a ter a vogal temática -e-, acrescentando-se a desinência -em- à 3.ª pessoa do plural:

(4) «Espero que gostem do filme.»

Nos verbos de tema em -e- e -i-, estas vogais temáticas passam a -a-, acrescentando-se -am- à 3.ª pessoa do plural:

(5) «A mãe quer que os filhos comam tudo.»

Celso Cunha e Lindley Cintra, na Nova Gramática do Português Contemporâneo (Lisboa, Edições João Sá da Costa, 1984, pp. 4...

Pergunta:

Gostaria de saber todos os contextos em que a preposição não contrai com o artigo, pronome, determinantes, infinitivo.

Resposta:

As preposições são palavras invariáveis que relacionam dois termos de uma frase e que podem contrair-se com artigos definidos e demonstrativos. Não se faz a contração das preposições de, em e por com o, a, os, as, ou com qualquer forma de pronomes ou advérbios começados por vogal, quando se trata de uma construção de infinitivo, flexionado ou não. Exemplos:

«O problema resultou de a secção de contabilidade ter enviado o NIB errado.»

«Preocupa-me o facto de ele não estar preocupado.»

«O cão pôs-se a rosnar pouco antes de uma rapariga ter aparecido.»

«O problema está em o homem não querer pagar impostos.»

«Esperou por o João chegar.»

Note-se que, noutras circunstâncias, as preposições que se contraem são a, por, em e de com:

1. artigos definidos ou pronome demonstrativo feminino;

Exemplo: «No domingo vou à missa.»

2. pronome demonstrativo;

Exemplo: «Gosto deste livro.»

3. artigo definido masculino e feminino;

Exemplo: «Nos dias de hoje é imprescindível o acesso à Internet.»

4. artigo indefinido;

Exemplo: «Consegui perder 15 kg num ano.»

Pergunta:

Nos noticiários da rádio e da televisão ouço com frequência a expresão «com o agravar». Exemplo: «Com o agravar da situação política em Moçambique, o Governo de Maputo anunciou...» É correcto utilizar esta fórmula? Ou a forma correcta de o dizer seria: «Com o agravamento da situação política em Moçambique, o Governo de Maputo anunciou...»? Ou são ambas correctas? Ou uma mais correcta do que a outra?

Agradeço a vossa ajuda.

Resposta:

Ambas as ocorrências são válidas.

O infinitivo impessoal, quando seguido do artigo definido masculino singular o, confere um valor nominal (substantivação) ao verbo.

1. «Com o agravar da situação política em Moçambique, o Governo de Maputo anunciou...» – o verbo agravar tem um valor nominal.

Quanto a agravamento, trata-se de um nome comum derivado do tema do verbo agravar (agrava-).

2. «Com o agravamento da situação política em Moçambique, o Governo de Maputo anunciou...»

O uso de verbos substantivados é, portanto, tão correto como o dos próprios substantivos. A diferença semântica é mínima: aos substantivos resultantes da conversão de verbos atribui-se caráter mais dinâmico.