Sara Mourato - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sara Mourato
Sara Mourato
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Licenciada em Estudos Portugueses e Lusófonos pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre em Língua e Cultura Portuguesa – PLE/PL2 pela mesma instituição. Com pós-graduação em Edição de Texto pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, trabalha na área da revisão de texto. Exerce ainda funções como leitora no ISCTE e como revisora e editora do Ciberdúvidas.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Quero saber se «minha autobiografia» é pleonasmo vicioso, redundância viciosa.

Muita gente diz que o prefixo auto- já é bastante sugestivo, mas, se a pessoa falar em autobiografia, pode ser a de outra pessoa; e, se falar «minha biografia», pode não ser a autobiografia, pois sim a biografia sobre si escrita por outra pessoa!

Ou será que me equivoquei a respeito?

Muitíssimo obrigado e um grande abraço!

Resposta:

A expressão «minha autobiografia» não pode ser considerada um pleonasmo vicioso. Embora o prefixo auto- já indique que se trata de uma biografia escrita pela própria pessoa biografada, o uso do possessivo minha não é necessariamente redundante, podendo servir para enfatizar ou clarificar.

De facto, autobiografia já designa um texto em que o autor narra a história da sua própria vida. Isso significa que, em princípio, a palavra autobiografia já carrega a ideia de que é "minha" (do próprio autor). Porém, o uso do possessivo pode ser útil em determinados contextos para evitar ambiguidades. Por exemplo, ao dizer-se «a minha autobiografia», estamos a diferenciar a nossa autobiografia de outra autobiografia – «a autobiografia do João», ou seja, a de um terceiro. Além disso, há uma distinção importante entre «a minha biografia» e «a minha autobiografia», pois a primeira pode ser um texto biográfico escrito por outra pessoa sobre mim, enquanto a segunda implica que eu próprio sou o autor do texto.

Portanto, embora tecnicamente o possessivo minha não seja indispensável quando nos referimos a autobiografia, o seu uso não constitui um pleonasmo vicioso. Pode ser utilizado de forma legítima para reforçar, esclarecer ou evitar confusões no contexto em que a expressão é usada.

Pergunta:

Quando e por que surgiu a expressão «segurar nas costas»? E o que ela significa atualmente?

Por exemplo: «Aquele(a) ator (atriz) segurou o filme inteiro nas costas».

Muitíssimo obrigado e um grande abraço!

Resposta:

De acordo com os significados disponíveis no Dicionário Houaiss para o verbo segurar, a expressão «segurar nas costas» transmite a ideia de carregar, sustentar ou ser responsável por algo importante. Quando se diz, por exemplo, «aquele(a) ator(atriz) segurou o filme inteiro nas costas», significa que o ator ou atriz foi o principal responsável pelo sucesso do filme, carregando a "carga" de manter o enredo e atrair o público, assumindo uma função central na produção.

A origem exata de «segurar nas costas» é difícil de precisar. No entanto, pode estar ligada à ideia de carregar um peso físico nas costas, que deve ser mantido de forma estável. Assim, por extensão semântica, «segurar nas costas» pode ter evoluído para significar a responsabilidade por algo importante, com ênfase no papel de sustentar o sucesso de um projeto, sem envolver necessariamente um esforço físico constante, que traria a expressão «carregar nas costas».

<i>Brain rot</i>: o neologismo que reflete <br>os desafios da era digital
Podridão cerebral

Brain rot foi a expressão escolhida como Palavra do Ano de 2024 pela Oxford University Press e descreve o efeito negativo associado do consumo excessivo e contínuo de conteúdo digital. Em português, tem prevalecido o uso da expressão inglesa, mas será que é facilmente traduzido para português? A esta pergunta responde a consultora Sara Mourato, num texto à volta de mais um neologismo. 

Pergunta:

Os nascidos na Malásia são malaios, e não malásios...

Ou também se pode usar "malásio"?

Resposta:

Os gentílicos correspondentes aos habitantes da Malásia é, de acordo com o Portal da Língua Portuguesa, malaio e malásio. A primeira é a forma mais corrente (cf. Código de Redação Interinstitucional), mas a segunda também encontra registo nos dicionários e está correta.

Nesse sentido, ao referir-nos a um grupo de habitantes desse país, usamos: «os malaios» ou «os malásios». Por outro lado, ao  referir a um único habitante, o gentílico surge no singular: «o malaio» ou «o malásio».

Pergunta:

Diz-se «a sorte grande e determinação» ou «a sorte grande e a terminação»?

Sempre pensei que fosse a primeira, mas hoje ouvi a segunda e fiquei com esta dúvida...

Obrigada!

Resposta:

A expressão em apreço vem do vocabulário das lotarias, mais especificamente da Lotaria Clássica portuguesa. No contexto do sorteio, o prémio principal era chamado de «sorte grande», enquanto os números que compartilhavam os últimos dígitos do bilhete premiado (mas não o número completo) recebiam um prémio menor, conhecido como «a terminação».

Com o tempo, a expressão passou a ser usada de forma figurada, significando obter o melhor resultado possível numa situação, ou alcançar tudo e mais alguma coisa com enorme sorte.