Sandra Duarte Tavares - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sandra Duarte Tavares
Sandra Duarte Tavares
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É mestre em Linguística Portuguesa pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. É professora no Instituto Superior de Comunicação Empresarial. É formadora do Centro de Formação da RTP e  participante em três rubricas de língua oortuguesa: Agora, o Português (RTP 1), Jogo da Língua  e Na Ponta da Língua (Antena 1). Assegura ainda uma coluna  mensal  na edição digital da revista Visão. Autora ou coa-autora dos livros Falar bem, Escrever melhor e 500 Erros mais Comuns da Língua Portuguesa e coautora dos livros Gramática Descomplicada, Pares Difíceis da Língua Portuguesa, Pontapés na Gramática, Assim é que é Falar!SOS da Língua PortuguesaQuem Tem Medo da Língua Portuguesa? Mais Pares Difíceis da Língua Portuguesa e de um manual escolar de Português: Ás das Letras 5. Mais informação aqui.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Trabalho em modelos físicos que simulam processos naturais (geológicos) que ocorrem à superfície ou no interior da Terra. Devo dizer que esses modelos são "análogos" ou "analógicos"?

Resposta:

Os dicionários referem que ambos os adjectivos análogo e analógico significam «que tem analogia».

O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, porém, dá-nos, no âmbito da Física, o seguinte significado para análogo: «em que há analogia (diz-se de sistema físico em relação a outro)».

Por conseguinte, não sendo incorrecto o uso do segundo termo, talvez seja aconselhável a combinatória modelos análogos.

Pergunta:

Primeiro que tudo, deixem-me dar-vos os parabéns. Parece-me que o Ciberdúvidas é um espaço imprescindível para quem trabalha com a língua portuguesa. E assim, gostaria que me esclarecessem sobre a origem e o significado da palavra Tarrafal. Em Cabo Verde encontramos o Tarrafal de Santiago, o Tarrafal de Monte Trigo em Santo Antão e a vila do Tarrafal em São Nicolau — e todos eles lugares quentíssimos. Terá a origem da palavra alguma coisa a ver com calor?

Obrigado.

Resposta:

Segundo José Pedro Machado (Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa), Tarrafal é um topónimo com origem num nome colectivo, tarrafal, derivado de tarrafe, que é o mesmo que tamargueira. Tarrafal significa, pois, «campo de tarrafes».

Note-se, contudo, que o Dicionário Houaiss indica que tarrafe é termo da Guiné-Bissau, com origem na palavra árabe tarf, «tamarindeiro», e que passou ao crioulo (presume-se que o dicionário se refere ao crioulo guineense). No Brasil, a planta em apreço é conhecida como mangue-vermelho, que é (idem):

«árvore de até 5 m (Rhizophora mangle) da fam. das rizoforáceas, com grossas raízes basais, casca adstringente, tanífera e de que se extrai tintura, madeira avermelhada, de qualidade, flores amarelas, axilares e frutos obcônicos, nativa de manguezais e áreas salobras de regiões tropicais das Américas, África e ilhas do Pacífico»

Trata-se, portanto, de uma planta própria de regiões de clima quente. Não podemos é dizer se a presença de tarrafes é indício de uma zona especialmente quente no contexto do clima das ilhas cabo-verdianas.

 

N. E. (13/03/2021) – Informa o consulente Adelino Faial Fonseca (Mindelo, Cabo Verde) que o topónimo Tarrafal ocorre noutro lugar de Cabo Verde: Tarrafal da Povoação, na cidade da Ribeira Grande em

Pergunta:

Qual a conotação que se dá quando dizemos que uma ideia é peregrina? Positiva, ou negativa?

Obrigada.

Resposta:

Apesar de os dicionários referirem que, enquanto adjectivo, a palavra peregrino significa «raro; excepcional; extraordinário», a expressão «ideia peregrina» é muitas vezes usada em sentido irónico ou negativo, como equivalente a «ideia estranha, excêntrica».

Pergunta:

Sei que a pergunta já foi respondida em 1997, no entanto começa a haver cada vez mais a utilização de "transsexual" em vez de "transexual" seguindo aliás a forma como a palavra é lida normalmente.

Gostaria de ter a vossa opinião sobre o assunto.

Resposta:

A grafia "transsexual" está incorrecta, devendo-se certamente ao modo como a maior parte dos falantes pronuncia essa palavra.

O s de trans- pronuncia-se [s], quando este elemento de formação se associa a uma palavra-base iniciada também por um s: trans- + sexual.

Por conseguinte, a pronúncia correcta é [transeksual] (e não [tranxeksual]), e a grafia correcta é transexual, dado que os dois s se fundiram num só.

Disponha sempre!

Pergunta:

Ouve-se frequentemente nos meios audiovisuais falar de guetos com o som da primeira sílaba fechado: [guêtos].

Não será, foneticamente, mais correcto pronunciar [guétos] com som aberto?

Resposta:

Seria desejável que os dicionários que temos ao nosso dispor fossem unânimes na grafia e na pronúncia das palavras. Mas infelizmente não é o que acontece.

O dicionário da Academia das Ciências de Lisboa, por exemplo, apresenta duas possibilidades fonéticas para a palavra gueto: gu[è]to ou gu[ê]to.

Já o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa assume apenas gu[ê]to.

Quanto ao facto de ser mais correcto pronunciar [guèto], facilmente encontramos contra-argumentos, pois a vogal e pode representar o som aberto ou fechado, independentemente do contexto em que ocorre, por exemplo: sedes[ê]de (ex.: «Tenho sede») e sedes[è]de (ex.: «A sede dessa empresa é no Porto»).

Por conseguinte, somos levados a crer que ambas as variantes fonéticas são válidas: gu[è]to e gu[ê]to.

Disponha sempre!