Sandra Duarte Tavares - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Sandra Duarte Tavares
Sandra Duarte Tavares
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É mestre em Linguística Portuguesa pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. É professora no Instituto Superior de Comunicação Empresarial. É formadora do Centro de Formação da RTP e  participante em três rubricas de língua oortuguesa: Agora, o Português (RTP 1), Jogo da Língua  e Na Ponta da Língua (Antena 1). Assegura ainda uma coluna  mensal  na edição digital da revista Visão. Autora ou coa-autora dos livros Falar bem, Escrever melhor e 500 Erros mais Comuns da Língua Portuguesa e coautora dos livros Gramática Descomplicada, Pares Difíceis da Língua Portuguesa, Pontapés na Gramática, Assim é que é Falar!SOS da Língua PortuguesaQuem Tem Medo da Língua Portuguesa? Mais Pares Difíceis da Língua Portuguesa e de um manual escolar de Português: Ás das Letras 5. Mais informação aqui.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Continuo com a dúvida. Uma professora deu funções sintáticas diferentes para os dois casos que citarei, e eu acho que os dois são complemento nominal.

1 — «O mapeamento da região será feito pelo Estado.»
2 — «O mapeamento do Estado não agradou ao prefeito.»

Resposta:

Todos os nomes deverbais — nomes que provêm de verbos — regem o mesmo complemento que o verbo que está na sua base. Por exemplo:

(1) «Organizar a festa» > «a organização da festa»

(2) «Limpar a casa» > «a limpeza da casa»

(3) «Desenvolver o projecto» > «o desenvolvimento do projecto»

O nome mapeamento, à semelhança dos acima mencionados, é também um nome deverbal; provém do verbo mapear. O complemento deste verbo será também o complemento do seu nome correspondente:

(4) «Mapear a região» > «o mapeamento da região»

Todavia, os nomes deverbais podem ser acompanhados de expressões que não são seus complementos, mas sim modificadores ou adjuntos, isto é, expressões que têm uma função puramente acessória. Temos como exemplo o grupo preposicional «do Estado». A expressão «mapeamento do Estado» significa «o mapeamento feito pelo Estado».

Um forte argumento a favor de não considerarmos «do Estado» um complemento nominal é o facto de não ser possível o mesmo ser complemento do verbo mapear : «mapear o Estado»?

Por conseguinte, as expressões da região e do Estado têm funções sintácticas distintas. A expressão «da região» é complemento nominal, ao passo que «do Estado» é modificador ou adjunto nominal.

Disponha sempre!

Pergunta:

Na frase «Ó Óscar, solta o leão, que ele tem fome de carninha tenra», qual a função sintáctica do segmento «tem fome de carninha tenra»?

Resposta:

A expressão «tem fome de carninha tenra» desempenha a função sintáctica de predicado da oração coordenada explicativa «que ele tem fome de carninha tenra».

Por sua vez, o grupo nominal «fome de carninha tenra» é o complemento directo do verbo ter.

Pergunta:

No período «Existem velhas parábolas chinesas sobre tudo, e as que não existem a gente inventa», classifiquei o termo «as» como artigo definido (determinante do termo elíptico «parábolas»), mas fui corrigida: «as» corresponde a pronome oblíquo (?). Tentei argumentar dizendo que o verbo existir é intransitivo (e os pronomes oblíquos não podem desempenhar papel de sujeito), mas não recebi resposta. Vocês podem, por gentileza, esclarecer essa dúvida (artigo ou pronome)?

Muito obrigada e parabéns pelo trabalho!

Resposta:

Na frase que apresenta, a palavra as é um pronome demonstrativo, pois pode ser substituído por outra palavra dessa mesma subclasse:

«Existem velhas parábolas chinesas sobre tudo, e aquelas que não existem a gente inventa».

O verbo existir é, de facto, intransitivo, mas o seu sujeito é o pronome relativo que, que tem como antecedente o demonstrativo as.

Disponha sempre!

Pergunta:

Ontem, durante um convívio com amigos, onde foram abordados vários temas, surgiu uma questão que suscitou várias dúvidas, a palavra conceito.

Depois de horas de acesa discussão argumentando as capacidades de interpretação de cada um sobre a língua portuguesa e sobre as definições dos dicionários, não foi possível chegar a um entendimento.

A minha questão é a seguinte:

Só é possível chegar-se a um conceito quando há várias pessoas a partilhar a mesma ideia, ou também é um conceito se for individual?

Resumindo, conceito = «apenas opinião geral», ou, conceito = «a opinião individual + opinião geral»?

Obrigado pela vossa atenção.

Resposta:

Os dicionários indicam que a palavra conceito pode referir quer uma opinião individualizada, quer uma opinião generalizada.

Veja-se, a título de exemplo, uma das definições dadas pelo Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora: «ponto de vista; opinião. Compreensão que uma pessoa tem de uma palavra; noção, ideia».

Concluímos então que, para além de «opinião geral», conceito pode designar também uma opinião individual.

Disponha sempre!

Pergunta:

Por favor, gostaria de saber sobre o emprego do termo "dialeticidade".

Não o encontrei registrado no vocabulário da língua portuguesa nem em dicionário algum, no entanto, trabalho em um tribunal onde o uso de tal palavra é corriqueiro e justificam como «termo consagrado pelo uso». Isso é possível, uma vez que apenas no círculo da magistratura se conhece esta palavra? Não se trata de neologismo ou outro vício de linguagem?

Obrigada.

Resposta:

Também eu não encontrei o termo dialecticidade em nenhum dicionário que consultei, mas constatei que o mesmo ocorre com bastante frequência em vários documentos disponíveis na Internet.

Neologismo ou termo técnico do direito, é minha convicção que os lexicógrafos registá-lo-ão nos dicionários a curto prazo, dado o seu uso tão frequente no círculo linguístico da magistratura.

Disponha sempre!