Maria Regina Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Gostaria de saber qual a origem da palavra albricoque (sinónimo de damasco). Eu sou algarvia e imagino que a palavra tenha origem árabe e por isso é utilizada com muita naturalidade no Algarve.
Podiam dar-me mais informações?
Muito obrigada.

Resposta:

Albricoque é a denominação do fruto do albricoqueiro, o mesmo que damasqueiro.
Segundo o Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa de José Pedro Machado, albricoque é uma palavra que provém do grego ‘praikókion’, «damasco» (moderno ‘beríkokko’ ou ‘berykokkiá’), pelo árabe “al-birqoq”. O fruto é oriundo da China e fez a sua aparição nas regiões mediterrânicas pouco antes do início da nossa era. Os Muçulmanos expandiram o termo por todo o mundo românico, e, graças a este, por quase toda a Europa. O vocábulo arábico já tinha a significação do português actual no andaluz e no magrebe do século XIII e conservava-a no seguinte; hoje significa “ameixa” na África do Norte (incluindo a Líbia), embora em algumas regiões argelinas conserve o primeiro sentido (“damasco”); no Egipto ainda mantinha este sentido no século XVII, mas hoje traduz o segundo sentido.
As mais antigas abonações do vocábulo em português remontam ao século XVI. Este termo é vulgar no Sul de Portugal, apresentando em certos pontos do Algarve a forma “alm’coque”. Existem também as seguintes variantes: abrinocoque, albaricorque, albercoque, albicoque, alcócaro, alcocre e alvaricoque.

Pergunta:

Uma amiga minha me perguntou quais as duas palavras da língua portuguesa que possuem quatro consoantes juntas.

Resposta:

Com quatro consoantes juntas existem muitas palavras na língua portuguesa.
Eis alguns exemplos: abstracção, abstracto, abstruso, construção, construir, instrução, instrumento, instrutor, monstro, monstruosidade, obstrução, obstruir, obstrutor.

Pergunta:

Tenho uma dúvida, relacionada com um recurso retórico, muito usado por advogados nas suas argumentações, cujo nome já soube, mas neste momento sou incapaz de reproduzir. Então, gostaria que me informassem sobre o recurso estilístico(?) ou figura de retórica presente em «Isto, para não falar de...». Na verdade, dizendo-se que não se vai falar de determinado assunto acabamos por estar, propositadamente, a referi-lo.

Resposta:

Trata-se de uma figura de retórica, uma figura de pensamento denominada preterição. Consiste em tratar um determinado assunto ao mesmo tempo que se afirma que ele será evitado, fingindo que não se quer falar dele. É conhecido o seguinte exemplo traduzido de Cícero:
«Não vos direi pois, senhores, quão grandes e quão afortunados foram seus feitos na paz e na guerra, por terra e por mar; não só os cidadãos consentiram sempre nos seus quereres, os aliados lhe obedeceram, os inimigos se lhe sujeitaram, como os próprios ventos e tempestades lhe foram favoráveis.»
E ainda este, de Camões, n’Os Lusíadas (I, 26), palavras de Júpiter a respeito dos Portugueses:
«Deixo, Deuses, atrás a fama antiga, / Que co a gente de Rómulo alcançaram, / Quando com Viriato, na inimiga / Guerra Romana, tanto se afamaram.»

Pergunta:

O que significa "tarudo"? Procurei nos dicionários "Aurélio" e "Houaiss" e não encontrei. O vocábulo está em um discurso de Rui Barbosa, como crítica à República brasileira do começo do século XX:
«Na República os tarados são os tarudos. Na República todos os grupos se alhearam do movimento dos partidos, da ação dos Governos, da prática das instituições. Contentamo-nos hoje com as fórmulas e aparências, porque estas mesmas vão se dissipando pouco a pouco, delas quase nada nos restando."
É sempre muito bom poder contar com o excelente trabalho que realizam.
Espero que tenham boas férias.

Resposta:

Lamento, prezado consulente, mas não encontrei registo de tal palavra em nenhum dos dicionários e enciclopédias que conheço.
Será que se trata de uma gralha, e o orador pretendeu dizer taludos, ou mesmo tarugos?
Taludo significa “grande” (a taluda é a sorte grande). Neste caso, o orador teria pretendido dizer que na República os tarados é que são grandes (importantes), ou vice-versa.
Por outro lado, segundo o Grande Dicionário da Língua Portuguesa de António de Morais Silva (10.ª ed., 1949-1958), tarugo no Brasil significa “o mesmo que magnate, animal forte.” Ora magnate (ou magnata) significa “pessoa importante, poderosa, influente ou ilustre”, “grande capitalista”. Assim, também este termo poderia ser usado neste contexto.
Muito obrigada, prezado consulente, pelas suas gentis palavras em relação ao Ciberdúvidas

N. E. – Outra hipótese possível, sugerida pelo nosso consultor A. Tavares Louro, é a seguinte:

«Sendo palavra não dicionarizada (pelo menos nas obras que pude consultar), Rui Barbosa poderá ter criado a palavra tarudo com a raiz tar(a) e o sufixo -udo, que é muito frequente na Língua Portuguesa com a ideia de abundância.
Tarudo deveria ser, portanto, aquele que tinha uma grande tara ou deficiência mental.
Enfim, é uma hipótese, sob reserva.»

Pergunta:

Ao referir-me à categoria profissional exercida por um homem indubitavelmente digo «técnico superior de informática». Como devo fazer em relação a uma senhora: «técnica superior de informática» ou «técnica superiora de informática»?
Obrigado.

Resposta:

Como já foi respondido anteriormente, a designação técnica superior é a que se usa na administração pública portuguesa e está de acordo com a norma culta..
Os adjectivos com a terminação -ior não flexionam no feminino, mas apenas no plural: superiores, inferiores, anteriores, posteriores, ulteriores. Se qualificarem um substantivo feminino, permanecem invariáveis: escola superior, passagem inferior, atitude anterior, situação posterior.
São adjectivos que têm origem no latim em formas do comparativo, formas estas que já no latim não flexionavam em género: ‘superiorem’ (‘superior, ius’, comparativo de ‘superus’); ‘inferiorem’ (‘inferior, ius’, comparativo de ‘inferus’); ‘anteriorem’ (‘anterior, ius’, adjectivo usado só no comparativo); ‘posteriorem’ (‘posterior, ius’, comparativo de ‘posterus’); ‘ulteriorem’ (‘ulterior, ius’, comparativo de ‘ulter’).
Apenas refiro uma excepção no termo madre superiora, em que este vocábulo superiora já não é sentido como um adjectivo, mas, sim, como um substantivo: a superiora, a freira que dirige um convento, a abadessa, a prioreza, a madre superiora.