Maria Regina Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Por que razão quando alguém deixa a porta aberta se diz "És mesmo de Braga."?

Resposta:

Usa-se a expressão interrogativa “És de Braga?” quando se pretende recriminar alguém porque deixou a porta aberta.

Diz-se em Braga que essa expressão se deverá à existência nessa cidade, numa das artérias mais famosas, do Arco da Porta Nova, que, como é usual nos tempos de hoje, não tem porta. Por aquele arco passam os bispos e arcebispos em direcção ao paço episcopal. Braga seria, pois, uma cidade de portas abertas à passagem de figuras gradas, ilustres, que aí vivem. Assim, se alguém deixa a porta aberta, é recriminado porque esse gesto parece revelar que se julga muito importante.

Outra explicação remonta ao século XIV e faz evocar uma figura ilustre da história da cidade. “És de Braga?” será uma forma simplificada da expressão “És de Braga e chamas-te Lourenço?”, ainda usada no início do século XX para ridicularizar alguém que se considera importante sem o ser ou que se julga mais esperto do que os outros.

Importante, ilustre, famoso fora D. Lourenço, arcebispo de Braga no século XIV. Este arcebispo ficou famoso por vários motivos. Homem muito culto, que frequentara as universidades de Toulouse, Paris e Borgonha, foi eleito arcebispo de Braga no reinado de D. Fernando. Aí, teve uma actuação enérgica contra os abusos que os nobres praticavam nas igrejas, a pretexto de serem seus padroeiros, o que os levou a queixarem-se ao rei, que pediu a sua destituição ao papa. O papa Gregório XI nomeou visitadores, que se pronunciaram desfavoravelmente em relação ao arcebispo, tendo-os este excomungado. Como foi destituído do governo do arcebispado, partiu para Roma – onde fora eleito o novo papa, Urbano VI – a pleitear a sua causa. A argumentação foi bem sucedida, a sentença dos visitadores anulada, e o rei D. Fernando restituiu-lhe a jurisdição da cidade de Braga. Mais tarde, acompanhou o Mestre de Avis na guerra contra Castela,...

Pergunta:

Gostaria de saber qual a diferença entre o discurso académico e o jornalístico.
E como eu posso encontrar a estrutura argumentativa do discurso?
Agradeço pela atenção.

 

Resposta:

A denominação "discurso académico" é muito genérica. Não sei se pretende referir-se ao discurso utilizado em sala de aula por um professor quando lecciona uma disciplina, se o dos estudiosos e especialistas de uma área do saber, se o utilizado em actos formais de natureza académica. Está já a ver que posso referir, neste âmbito, pelo menos a exposição, o texto explicativo, o informativo, o argumentativo. A denominação "discurso jornalístico" também não é muito precisa, pois há textos jornalísticos de natureza diversa, exigindo diversas utilizações da língua. A notícia, a entrevista, a crónica, o editorial, a crítica, por exemplo, ilustram formas diferentes de utilizar a língua, avultando ora os processos informativos, ora os persuasivos, ora os expressivos, etc. Se a concisão, a clareza e a capacidade de conquistar o leitor podem ser apontadas como as qualidades básicas do discurso jornalístico, elas também são exigidas no discurso pedagógico. Assim, se quiser delimitar mais o âmbito da sua pergunta, talvez eu possa ser mais esclarecedora. Quanto à estrutura argumentativa do discurso, refiro-lhe alguns títulos de obras onde poderá colher essa informação: Anthony Weston (1996). A Arte de Argumentar (trad. de Desidério Murcho). Lisboa: Gradiva. Chaïm Perelman (1993). O Império Retórico: retórica e argumentação (trad. de Fernando Trindade e Rui Alexandre Grácio). Porto: Asa. Lionel Bellenguer (1996). L'argumentation: des techniques pour convaincre. Paris: ESF. Michel Meyer (1992). Lógica, Linguagem e Argumentação (trad. de Maria Lúcia Novais). Lisboa: Teorema. Renée Simonet et Jean Simonet (1990). L'argumentation: stratégie et tactiques. Paris: Les Éditions d'Organisation. Cf. o verbete Oratória (3/05/01).

Pergunta:

Qual a diferença entre vontade e desejo?

Resposta:

Na generalidade dos contextos, estas duas palavras são sinónimas, podendo permutar entre si. No entanto, determinadas acepções são mais próprias de uma ou de outra, sendo "vontade" um termo mais abrangente, mais rico. Desejo é a vontade de possuir algo, a vontade de gozar, o anseio, a aspiração, a cobiça, a ambição, o apetite, o apetite sexual. Vontade utiliza-se também para referir capricho, fantasia, veleidade, desejo, mas ainda e sobretudo capacidade de escolha, de decisão; aspiração, anseio, deliberação, decisão ou arbítrio de alguém que tem poder, ânimo, firmeza, coragem, decisão ou determinação expressa, empenho, interesse, zelo, disposição de espírito. É comummente aceite que, na generalidade, a vontade é mais forte, mais racionalizada, do que o desejo. A vontade associa-se ao intelecto, o desejo aos sentidos.

Pergunta:

Porque as frases abaixo estão erradas:
1 – As críticas que ele está sujeito são muitas.
2 – Haviam vários mandados a serem cumpridos.

Resposta:

A primeira frase está incorrecta porque a expressão "estar sujeito" pede a preposição "a": estar sujeito a; sujeitar-se a. A frase correcta seria: "As críticas a que ele está sujeito são muitas." A incorrecção da segunda frase reside no emprego do verbo haver no plural. O verbo haver na acepção de "existir", como é o caso, não tem sujeito e é utilizado apenas na 3.ª pessoa do singular:. havia, há, houve, haverá, haja, houvesse.

Pergunta:

Eu não entendi como nós podemos classificar a frase "acertando" a frase ou a palavra de cada "função".
Ex.:
Comparativo de igualdade:
Maria é tão bonita quanto José.
Cadê o comparativo de igualdade? Eu não acho nenhum deles.
Existem outros tipos de comparativos?
Se houver me mande, que estou com curiosidade, e muito obrigado mesmo!

Resposta:

O comparativo é um dos graus em que um adjectivo pode ser utilizado. Na frase que apresenta, o adjectivo é "bonito". Faz-se aí uma comparação entre a beleza de Maria e a beleza de José, considerando-se que um é tão bonito como o outro, que a beleza de um é semelhante, é igual à beleza do outro. Temos, pois, o adjectivo "bonito" no feminino (concordando com Maria), utilizado no grau comparativo de igualdade. Existem três tipos de comparativo: o comparativo de superioridade, o comparativo de igualdade e o comparativo de inferioridade. 1 – O comparativo de superioridade forma-se com o advérbio "mais" antes do adjectivo e a conjunção "que" ou "do que" depois. Ex.: O filho já é mais forte do que o pai. (adjectivo: forte) A Júlia é mais observadora que a irmã. (adjectivo: observadora) 2 – O comparativo de igualdade forma-se com o advérbio "tão" antes do adjectivo e a conjunção "como" ou "quanto" depois. Ex.: O filho já é tão forte como o pai. A Júlia é tão observadora quanto inteligente. 3 – O comparativo de inferioridade forma-se com o advérbio "menos" antes do adjectivo e a conjunção "que" ou "do que" depois. Ex.: O jovem é menos compreensivo do que a mãe. Ela é menos faladora que a amiga.