Pergunta:
A abstracção, na gramática, é, pelo que até agora dela estudei, algo frequente.
As noções de vogal e consoante são disso um exemplo. Primeiro, há a noção de fonema: os sons elementares que, combinados de determinada maneira, formam os vocábulos. E é na forma como certos fonemas são produzidos pelos órgãos humanos que se chega às noções atrás mencionadas: as vogais são produzidas expelindo o ar, sem que este encontre qualquer obstrução à sua passagem pelo aparelho fonador; as consoantes já encontram algum tipo de obstrução. É, pois, abstraindo-nos das diferenças que definem este ou aquele fonema e encontrando uma propriedade (ou, eventualmente, mais propriedades) comum a alguns deles que podemos definir novas noções, abstractas — as noções de vogal e de consoante.
Escrevo isto tudo, não para dar lições, mas para colocar uma questão e verificar se percebi bem os métodos da gramática.
A minha dúvida é — chegando ao que interessa — sobre as classes de palavras.
Se bem percebi, as dez classes de palavras são também resultado de uma abstracção. Para justificar a definição de tal noção, penso assim: na língua existe uma imensidade de palavras; os linguistas, ao percorrerem o léxico de uma língua, deram-se conta de que havia algumas delas que serviam para nomear pessoas, coisas, animais, ideias e concluíram que fazia sentido, para efeitos do conhecimento da língua e dessas palavras, apor-lhes uma mesma etiqueta: o substantivo; percorreram outras palavras e concluíram que algumas delas, para lá de aspectos que as diferenciam, convergiam na função que desempenhavam: por exemplo, o adjectivo, que serve para caracterizar o substantivo. E, no fim do caminho pelo léxico da língua, encontraram dez tipos de palavras que, no que à função a desempenhar diz respeito, convergiam.
Resposta:
Há necessariamente um certo grau de abstracção, quer no estabelecimento das classes gramaticais, quer na sua definição, pelo que a matéria se torna por vezes pouco acessível. A melhor forma de fugir à abstracção é através dos exemplos. Os dicionários podem ser uma ferramenta muito útil, pois, para além do significado das palavras, indicam as classes gramaticais e também apresentam exemplos.
Para a identificação da classe da palavra, muitas vezes o contexto é essencial. É o caso, por exemplo, da pequena palavra a, à qual correspondem três classes gramaticais: artigo, preposição e pronome. Também muitas palavras podem ser verbo ou nome, e só o contexto permite fazer essa distinção. É o que acontece com a palavra rubrica.
As classes gramaticais permitem entender melhor a forma como a língua está estruturada. São um instrumento de reflexão sobre a língua. Num nível mais elaborado, juntamente com as funções sintácticas, são uma ferramenta indispensável para explicar determinadas construções. Mas só o estudo, o treino, a reflexão permitem lidar com elas com relativo à-vontade.
Os textos relacionados que seleccionámos poderão ajudá-lo a compreender melhor esta matéria. De qualquer forma, mais importante do que dominar os conceitos gramaticais, é o domínio da leitura e da escrita, que requerem também muita prática. E, desde já, os nossos parabéns pelo seu interesse pela língua portuguesa!
Cf.: Classes de palavras