José Mário Costa - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
José Mário Costa
José Mário Costa
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Jornalista português, cofundador (com João Carreira Bom) e responsável editorial do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa. Autor do programa televisivo Cuidado com a Língua!, cuja primeira série se encontra recolhida em livro, em colaboração com a professora Maria Regina Rocha. Ver mais aquiaqui e aqui.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Gostaria de saber qual a origem da expressão «deus-dará».
Obrigado.

Resposta:

A origem da expressão «ao deus-dará»1 (ao abandono, ao acaso, à toa, à aventura; estar entregue à própria sorte) é controversa. Ou melhor: tem duas explicações, conforme o lado de cá ou de lá do Atlântico.
Para Guilherme Augusto Simões2 (in Dicionário de Expressões Populares Portuguesas, ed. Perspectivas & Realidades, Lisboa) a frase tem a seguinte explicação:
«(...) ao pedido de esmola que os mendigos antigamente faziam – "Uma esmolinha, por amor de Deus" –, obtinham a resposta, daqueles que nada queriam dar, "Deus dará", e assim quem andava a mendigar andava ao "Deus dará"».
Para Reinaldo Pimenta (in A Casa da Maria Joana (curiosidades nas origens das palavras, frases e marcas), 1.º vol., Editora Campus, Rio de Janeiro), «ao deus-dará» terá tido origem no Brasil, no século XVII, no Recife mais propriamente, ainda sob o domínio da coroa portuguesa:
«Vivia [aí] um comerciante chamado Manuel Álvares, que ajudava os soldados que a Fazenda Real deixava abastecer. Quando ele não dispunha das mercadorias necessárias, dizia sempre "Deus dará!". De tanto repetir a frase, ficou conhecido como Manuel Álvares Deus Dará. E os soldados, quando precisavam de recorrer a ele, diziam: "Vamos ao Deus Dará." O "sobrenome" acabou até passando para os descendentes do comerciante: um dos filhos, provedor-mor da Fazenda, Simão Álvares Deus Dará.»

 

1 Com hífen, como parece ser o correcto, ou sem hífen é o registo indiferenciado nas obras consultadas.
2 Cit. de Cândido de Figueiredo, Novo Dicionário de Língua Portuguesa (1922) + O que não se deve dizer (1953).

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Pergunta:

Podiam-me dizer o que possa significar a palavra «charrar»?

O contexto era um documentário sobre a guerra em Moçambique, e estavam a falar de unidades militares que estavam isoladas no mato e se drogavam, bebiam e «charravam».

Muito obrigado pela resposta.

Resposta:

Charrar é o verbo formado da palavra charro, termo da gíria portuguesa equivalente a ganza (que é o cigarro feito de droga, haxixe ou liamba). Não confundir com o vocábulo derivado do castelhano "charro", com o significado de pouco digno; baixo, desprezível, indigno, banal.

Em português, e com a mesma origem, charro é também o nome de um peixe, espécie de carapau que abunda no Sul de Portugal.

 

Cf. Três pequenas notas sobre charro, insumo e sótão

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Será assim tão difícil entender que o vocábulo natal – seja na acepção de substantivo (o Natal) ou de adjectivo (terra natal) – flexiona-se sempre em número ( os Natais, terras natais)? Não obstante o óbvio e o que aqui (há anos!...) se regista, lá voltámos a ouvir nas televisões portuguesas o abstruso Pais “Natal”. A época bem convida à tolerância, mas francamente!...