Inês Gama - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Inês Gama
Inês Gama
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Licenciada em Português com Menor em Línguas Modernas – Inglês pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e mestre em Português como Língua Estrangeira e Língua Segunda (PLELS) pela mesma instituição. Fez um estágio em ensino de português como língua estrangeira na Universidade Jaguelónica em Cracóvia (Polónia). Exerce funções de apoio à edição/revisão do Ciberdúvidas e à reorganização do seu acervo.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Na frase: «O avô tinha o livro na estante», «na estante» pode ser considerado complemento oblíquo?

Ou é modificador do grupo verbal?

Obrigada.

Resposta:

Na frase indicada pelo consulente, o constituinte «na estante» desempenha a função de modificador do grupo verbal. Isto porque não é selecionado por nenhum elemento do grupo sintático de que faz parte, sendo que, por esta razão, a sua omissão não afeta a gramaticalidade da frase, como se verifica em (1):

(1) «O avô tinha o livro.»

Para que um determinado constituinte da frase seja considerado complemento oblíquo, este tem de ser selecionado pelo verbo e, por isso, a sua omissão afeta a aceitabilidade da frase. Por exemplo, na frase (2), em que ocorre o verbo colocar, caso se omita o elemento «na estante», isso torna-a pouco aceitável já que o seu sentido fica incompleto, como se observa em (3).

(2) «O avô colocou o livro na estante.»

(3) «?O avô colocou o livro.»1

Outro processo que se pode utilizar para identificar o modificador do grupo verbal é o teste da interrogação e negação, uma vez que os modificadores do grupo verbal podem ser interrogados, como mostra o exemplo (4), e negados, como indica o exemplo (5).

(4) «Era na estante que o avô tinha o livro?»

(5) «O avô tinha o livro não na estante, mas na mão.»

 

1. O ponto de interrogação assinala a estranheza da frase.

Pergunta:

As seguintes frases me causaram dúvidas:

1. «A quem você quer impressionar?»

2. «A quem estimamos?»

Minhas dúvidas consistem no seguinte: conforme consultei no dicionário de regência verbal de Celso Luft, ambos verbos regem o acusativo, sendo vulgar a utilização do objeto indireto. Portanto, surgiu a questão: estão erradas as duas frases, já que utilizam a preposição a antes do pronome quem? Sei que, especialmente quando o objeto direto se refere a uma pessoa (e o pronome quem, salvo engano, sempre se refere a pessoa), pode (ou deve?) ele ter a si anteposta uma preposição (= objeto direto preposicionado). Contudo, não sei se seria o caso…

Caso me pudessem esclarecer a questão, ficaria grato!

Resposta:

Ambas as frases estão corretas.

Nas frases apresentadas pelo consulente, quem ocorre na forma de um pronome interrogativo, e a ausência ou presença da preposição deve-se à função sintática que este desempenha. Por conseguinte, nas frases apresentadas, «a quem» tem a função sintática de complemento direto. Em geral, quando desempenha esta função, o constituinte quem não é introduzido por uma preposição, sendo mais comum o uso de estruturas como: «Quem você quer impressionar?» ou «Quem estimamos?». No entanto, em algumas situações, quando o complemento direto é selecionado por verbos que exprimem sentimentos, como impressionar e estimar pode ser preposicionado, como se pode observar nos exemplos (1) e (2):

(1)    «Você quer impressionar a todos os professores.»

(2)    «Estimamos a todos os benfeitores.»

Note-se que, nestes exemplos, «a todos os professores» e «a todos os benfeitores» são constituintes com a função de complemento direto, selecionados pelos verbos impressionar e estimar, e que têm a particularidade de s...

Pergunta:

Estou com algumas dúvidas na identificação de classe de palavras na expressão: «milhares de turistas»– nesta expressão, «milhares» é um quantificador ou um nome?

Agradeço a vossa atenção.

Resposta:

Segundo a atual terminologia linguística usada no ensino básico e secundário em Portugal (Dicionário Terminológico), a palavra milhar pertence à classe dos nomes comuns.

Não obstante, tradicionalmente algumas gramáticas tendem a incluir o termo milhar na classe dos numerais coletivos, contemplada apenas pela terminologia linguística de 67. É o caso das edições mais antigas da Nova Gramática do Português Contemporâneo, de Celso Cunha e Lindley Cintra, que assinala «Assim se denomina certos numerais que, como os substantivos coletivos, designam um conjunto de pessoas ou coisas. Caracterizam-se, no entanto, por denotar o número de seres rigorosamente exato. É o caso de novena, dezena, década, dúzia, centena, cento, lustro, milhar, milheiro, par». Numa nota na edição mais recente (2015), é referido que as palavras incluídas nos numerais coletivos pertencem atualmente à classe dos nomes comuns (cf. pág. 461).

Recorda-se também que João PeresTelmo Móia em

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*Ver "O que pensam os falantes de português da sua língua?" (09/02/2024).