A arte cinematográfica neste final de ano tem sido marcada por discussões em torno de dois filmes que se situam na cidade de Roma: Conclave e Gladiador 2. O primeiro retrata a Roma católica e que resiste, em certa medida, até aos dias de hoje. Já o segundo aborda a época da Roma imperial, cuja influência se estendia por uma grande parte do mundo conhecido. Embora ambas as produções tenham sofrido críticas por parte de alguns historiadores e classicistas, a verdade é que a grande adesão por parte do público demonstra, tal como assinalou o professor universitário Frederico Lourenço nas suas redes socais há uns dias, que «Roma – seja a dos imperadores, seja a dos papas – continua a fascinar o mundo».
Não obstante, a chamada «Cidade Eterna» não tem deixado só marcas na arte e produção artística, pois também está presente na língua e nas parábolas que usamos para nos exprimirmos. Um exemplo disso é o número considerável de provérbios que existem hoje em português com referência à cidade de Roma, o que confirma a relevância e influência que esta teve em tempos no território que é hoje Portugal.
No fundo, podemos dizer que, embora os tempos mudem, «todos os caminhos vão dar a Roma». Este provérbio remonta ao Império Romano, época em que a cidade de Roma era considerada o centro do mundo. Devido à extensão que o império alcançou, os romanos decidiram construir mais de oitenta mil quilómetros de estrada de modo a ligar todos os territórios que estavam sob a sua administração, sendo o ponto de convergência destes caminhos a cidade de Roma. Nos dias de hoje, «todos os caminhos vão dar a Roma» é utilizado com o sentido de que todas as alternativas e soluções levam sempre ao mesmo lugar.
Outro provérbio que também apresenta uma referência à cidade eterna é usado pelos falantes quando se pretende transmitir a ideia de que algo grandioso demora tempo a ser construído ou alcançado, pois «Roma e Pavia não se fizeram num dia». Esta expressão, cuja sintaxe já foi objeto de análise pelo Ciberdúvidas (veja aqui), terá sido registada pela primeira vez em francês, numa obra do século XII, designada por Li Proverbe au Vilain. Curioso facto é que a cidade de Pavia não é mencionada no provérbio original francês, «Rome ne fut pas faite toute en un jour». Há quem considere que tal referência, em português, se deve apenas a efeitos de rima.
Já agora, quando pretendemos referir que alguém, independentemente da sua origem, deve respeitar a cultura, as tradições, valores e normas sociais dos locais que visita, é comum dizermos «Em Roma, sê romano». Esta expressão provém do provérbio latino «si Romæ fueris, romano vivito more» e pode também ser traduzida para português como: «se estiveres em Roma, vive à moda romana», «onde viveres, farás como vires» (Infopédia) ou ainda «onde fores ter, faz como vires fazer».
Por outro lado, quando tencionamos mencionar que quem não tem medo de perguntar consegue facilmente chegar ao seu destino, afirmamos comummente que «quem tem boca vai a Roma». A origem deste provérbio está, uma vez mais, relacionada com a rede de estradas que unia todos os territórios do império e que estava tão bem construída que para saber a direção de determinado lugar bastava perguntar.
No entanto, há quem considere que a expressão correta é «quem tem boca vaia Roma», mas, tal como o Ciberdúvidas esclarece nesta resposta, esta última perece ser uma deturpação da primeira, uma vez que os registos escritos mais antigos da língua registam «quem tem boca vai a Roma». Para além disso, segundo o Dicionário da Língua Portuguesa da Academia das Ciências de Lisboa, noutras línguas românicas, como o espanhol e o francês, existe uma expressão equivalente: «Preguntando se llega a Roma» (espanhol); «Qui langue a, à Rome va» (francês). Sugere-se, assim, que o correto será vai e não vaia.
Portanto, milénios depois de, no Monte Palatino, Rómulo ter assassinado o seu irmão gémeo Remo com golpes de espada, realizando o sacrifício sangrento necessário para a criação de uma nova cidade, que levaria o nome da sua vítima, esta, à semelhança do seu mito fundador, continua a ser objeto de fascínio, tendo deixado as suas marcas nos sistemas profundos como as línguas. Tudo isto prova que Roma será sempre, como Tíbulo a designou um dia, «a Cidade Eterna».